Sou fã da música de Madeleine Peyroux. Gosto de seu estilo à la Billie Hoilday. Tenho todos os seus discos.
Li ontem (11/9/2007) uma entrevista dela a um órgão de imprensa brasileiro (acho que foi a Playboy que tem a Barbara Paz na capa — que, é bom que se registre, li no engraxate). (Há uma outra boa entrevista dela no site da Globo, em http://jg.globo.com/JGlobo/0,19125,VBH0-2927-62-123711,00.html, mas não é esta a entrevista a que me refiro).
Na entrevista que me interessa uma das perguntas foi:
"Você se acha bonita?"
A resposta dela:
"Me sinto bem no meu corpo. Mas não foi sempre assim".
(Cito de cór — as palavras podem não ser exatamente essas, mas, se não é isso, é quase isso).
Li também ontem, numa das revistas semanais que li, Veja ou Época, que um número significativo de adolescentes brasileiros (mais de 50%) simplesmente não está contente com seu corpo.
Será que somos todos cartesianos? Nós somos uma mente, um self, uma coisa pensante (res cogitans), e o corpo, que é uma res extensa, é algo que nós simplesmente temos (mas que não é parte necessária de nosso ser essencial)?
A resposta de Madeleine Peyroux mostra que ela acredita ser algo diferente de seu corpo. Ela diz que se sente bem nele — mas ao dizer isso reconhece que apenas está no seu corpo, não é o seu corpo…
Os adolescentes, também, afirmam não estar contentes com seu corpo — não dizem que não estão contentes consigo mesmos… O corpo deles é uma coisa, eles próprios, outra.
O pressuposto é de que no corpo eventualmente se pode dar um jeito (malhação, plástica) — ou, mesmo que não se dê um jeito nele, é possível aprender a viver bem nele.
Em Francês há uma expressão interessante: "Je me sens bien (mal) dans ma peau" — Sinto-me bem (mal) na minha pele. Na verdade, essa expressão é eufemística: o que ela quer dizer é "eu me sinto bem (mal) é no meu corpo".
Por que é que temos essa convicção, aparentemente tão enraizada, inarredável mesmo, de que não somos o nosso corpo — apenas o habitamos. e que aquilo que essencialmente somos é algo imaterial, incorpóreo e, portanto, intangível?
Não é preciso ser religioso e acreditar na imortalidade da alma para achar razoável a tese de que nós somos algo diferente de nosso corpo. É possível acreditar que, apesar não sermos o nosso corpo, estamos inseparavelmente ligados a ele, de tal modo que, quando ele morre, nós também cessamos de existir.
Em São Paulo, 12 de Setembro de 2007
Não seria porque a grande maioria das pessoas acredita que, além do corpo, possui espírito e alma, sendo este último o seu "eu" de fato?
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