O Papa Francisco conhece, talvez como ninguém, a importância dos símbolos. Sabe que as pessoas olham para ele como exemplo e não desperdiça uma ocasião sequer para mostrar, através de suas ações, o que importa e o que não é importa, o que é essencial e o que é acessório.
Na vestimenta, a dispensa do luxo, da beleza e das cores em exagero, do excesso… Na cabeça um simples solideo branco. Nada de chapéu alto de não sei quantas pontas. Nada de mantos de veludo bordados a ouro. Nada de brilhantes e vistosas sapatilhas vermelhas. O anel é simples e não precisa ser de ouro. Também não o crucifixo que usa.
Nas locomoções, a sobriedade. Não tem um AeroPapa. Veio para o Brasil num avião fretado da Alitalia. Recusou a oferta da companhia de instalar uma cama para ele poder dormir com mais conforto. Aqui, dispensou longas limousines pretas. Usou um Fiatzinho popular, que nem vidro elétrico tinha. Abaixou o vidro para ter contato com os fieis rodando a manivela. Indo e vindo para o avião, carregou sua própria malinha. Em Roma, depois de eleito, burlava a segurança e saía do Vaticano de taxi para visitar amigos.
Nas acomodações, também sobriedade e simplicidade. Em Roma dispensou o rico apartamento papal e continuou a viver em dependências idênticas às dos cardeais. No Rio ficou na casa da arquidiocese. Quarto monástico quase. (Nada da suíte real que faz o gosto da presidente do Brasil).
Mostrou que não teme o povo. Recebeu o povo sempre com um sorriso e a mão estendida. Nenhuma fez fechou o vidro do carro porque o povo poderia toca-lo. E fez questão de, em relação aos políticos, só cumprir o mínimo do protocolo. Não deu “carona” a eles, não deixou que eles usufruíssem do carinho e da afeição que o povo lhe dedicou.
Na comunicação com o povo, pregou sempre de forma simples, em linguagem fácil de entender, usou o humor, cativou, mostrou conhecer os gostos, os hábitos e até mesmo os ditados do povo.
Consta que, ao sair um dia de seus aposentos, viu um guarda suíço que havia passado a noite ali à porta, de pé, e lhe perguntou se havia passado toda a noite inteira de pé, ali. O guarda respondeu que sim. Foi de volta para os aposentos e trouxe uma cadeira. “Sente-se”, sugeriu. O guarda disse que não podia. Perguntou por quê. “Por ordem de meus superiores”, teria respondido o guarda. “Você está trabalhando para mim agora e eu lhe digo que você pode ficar sentado”. Voltou aos seus aposentos e retornou com um pedaço de pão e presunto para o guarda — que deveria estar não só cansado, mas com fome…
Apesar de Papa, Francisco mostrou que é povo, é gente que ri, que se diverte, que tem prazer na vida, que tem preferências esportivas e torce no futebol… Sente prazer em estar com as pessoas — e, segundo tudo indica, também sente prazer em estar sozinho, consigo mesmo. Certamente não é dos que preferem o cheiro de cavalos ao cheiro de gente, mesmo que a gente esteja há várias horas nos elementos, tomando sol e chuva, esperando para ve-lo e, se possível, toca-lo, falar com ele… Um repórter da Globo não resistiu e falou meio de longe com ele, gritando, que estava no papamóvel… Ele olhou, sorriu, e respondeu…
Todo esse jeito de ser é recheado de simbologia. As menores ações têm significado e podem mudar a vida de outras pessoas.
Consta que Desmond Tutu uma vez relatou que, na África do Sul, um dia, quando criança, andava com seu pai na rua, e, como era lei e costume, eles, negros, tinham de descer da calçada quando encontravam um branco vindo em sua direção, para dar passagem. Até que um senhor branco, já de certa idade, veio em sua direção e fez questão de, antes que eles descessem da calçada, descer ele próprio, para dar passagem ao pai e ao filho. Tutu ficou tão impressionado com o gesto que buscou saber quem era aquele senhor. Quando soube que se tratava de um padre anglicano, decidiu, naquela mesma hora, que era isso que ele queria ser na vida. E foi. E é. E até ganhou o Nobel da Paz por ser o que é como é.
Símbolos fazem isso. Mostram as coisas como elas deveriam ser. E mostram quão pequenos, no que importa, no que é essencial, são aqueles que, quando chegam ao poder, apesar de suas origens humildes, escolhem se esbaldar. Compram, com o dinheiro que é dos outros, helicópteros para levar seus cachorros passear. Ou toalhas de banho e lençóis dos mais caros tecidos egípcios para colocar no Palácio do Planalto. Que não sabem mais carregar a sua pasta. Que não enxergam a situação muitas vezes ridícula daqueles que os servem e cuidam de sua segurança. Que usam os aviões do estado para ir a festas e casamentos, ou para ir assistir aos jogos da seleção…
Em São Paulo, 29 de Julho de 2013.
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