Os socialistas sempre tiveram uma utopia: um mundo igualitário. É verdade que nunca dizem exatamente o que entendem por “igualdade”: se, além da igualdade de direitos, que é a igualdade política, é preciso alcançar também igualdade social e igualdade econômica. Eles em geral tergiversam aqui. O mais das vezes dizem apenas que a igualdade de direitos, ou igualdade política, preconizada pelos liberais, é uma igualdade apenas “formal” (no que estão certos) – que eles chamam, pejorativamente, de “igualdade burguesa”.
Alguns socialistas, apesar de se referirem pejorativamente à igualdade preconizada pelos liberais, reconhecem que ela é importante, mas afirmam que é preciso ir além dela. Outros, porém, não raro estão dispostos a abrir mão dela, ao propor “tratamentos diferenciais e preferenciais” com o objetivo de chegar mais rapidamente à igualdade que, para eles, realmente importa: a igualdade social e, quem sabe, a econômica.
Na verdade, se a gente colocar um socialista contra a parede, ele provavelmente vai admitir que está disposto a abrir mão da igualdade “formal”, da igualdade de direitos, na busca da igualdade “substantiva”, que envolve aspectos sociais e econômicos.
Os liberais não têm, no estrito senso da palavra, uma utopia. Eles se contentam com algo que é bem mais modesto e, por causa disso, perfeitamente alcançável: um mundo em que todos sejam igualmente livres (no sentido de não serem coagidos por terceiros) e tenham iguais direitos fundamentais (à integridade pessoal, ou seja, à vida e à segurança; ao exercício de sua liberdade, ou seja, à expressão, à locomoção, à associação, ao estabelecimento de contratos, à busca da felicidade; e à propriedade daquilo que obtêm com o seu trabalho ou por meio de troca ou compra).
Os liberais reconhecem que um mundo como esse será, dado o fato inegável de que seres humanos são diferentes em seus talentos naturais, em sua capacidade de aprender, em sua motivação, em sua capacidade de perceber e aproveitar oportunidades, em sua capacidade de trabalho, e, naturalmente, em sua sorte, haverá desigualdades – especialmente desigualdades econômicas, mas, provavelmente, também desigualdades sociais. Mas essas desigualdades são, para ele, perfeitamente compatíveis com a igualdade de direitos.
Os liberais estão convencidos de que a igualdade sócio-econômica defendida pelos socialistas são pode ser alcançada, em teoria, de duas maneiras:
* enriquecendo os mais pobres, de modo que todos fiquem igualmente ricos (ou remediados);
* empobrecendo os mais ricos, de modo que todos fiquem igualmente pobres.
Embora os socialistas professem buscar a igualdade enriquecendo os mais pobres (dando-lhes dinheiro na forma de bolsas ou serviços públicos pelos quais não pagam), nunca conseguiram chegar à igualdade dessa forma — porque os ricos (ou, digamos, os que não dependem da caridade governamental) sempre conseguem ganhar mais dinheiro mais rapidamente.
Os socialistas só conseguiram alguma medida de igualdade sócio-econômica, pela força, tentaram empobrecer os ricos. Tomemos Cuba, por exemplo. Os socialistas conseguiram prender e matar alguns ricos. Mas a maioria teve como fugir. A maior parte dos ricos cubanos foi, no início da revolução comunista na ilha, Miami ou outros lugares. Continuam ricos até hoje, embora tenham deixado suas propriedades (fazendas, fábricas, negócios, casas, bens em geral) em Cuba.
Os socialistas que ficaram em Cuba, que não sabem gerar riqueza, não souberam o que fazer com os bens que o governo de Fidel Castro roubou (nacionalizando) dos ricos. Todo mundo que ficou em Cuba se tornou pobre — menos El Comandante, porque quem parte e reparte (distribuir riqueza não é isso?) e não fica com a maior parte…
Qual o segredo da eliminação da pobreza em Calcutá e em Shangai, por exemplo? É deixar os ricos ficarem ricos, porque eles, ao ficarem ricos, tiram uma multidão de pobres da pobreza.
Os socialistas, porque têm essa fixação pela desigualdade, não conseguem resolver o problema da pobreza: quem resolve o problema da pobreza é, ironicamente, os liberais capitalistas, que o fazem por meios privados, não através da ação governamental (políticas públicas).
Na verdade, os socialistas parecem ter um enorme desinteresse pela solução do problema da pobreza. Sempre argumentam que é preciso resolver o problema da desigualdade sócio-econômica – e que o problema da pobreza seria resolvido resolvendo-se o problema da desigualdade sócio-econômica.
Como vimos, não se resolve o problema da pobreza assim. As tentativas de resolver o problema da desigualdade sócio-econômica que o socialismo tem patrocinado só conseguiram aumentar o número de pbores, porque só conseguem alcançar alguma medida de igualdade empobrecendo os ricos e fazendo, de todos, pobres..
É possível até especular que o desinteresse dos socialistas pela solução do problema da pobreza – que é um problema perfeitamente solucionável por caminhos liberais capitalistas – tem uma causa ulterior: insistir na solução do problema insolucionável da desigualdade, porque, com esse problema, sempre terão um campo de reivindicações enorme para suas ações.
A redução da pobreza pode se dar enquanto AUMENTA desigualdade. Aliás, em locais como Shangai e Calcutá, em que tem havido significativa redução da pobreza, essa redução se deu com o aumento da desigualdade. Todo mundo era pobre. Todo mundo melhorou de vida. Uns saíram da pobreza e ficaram remediados. Outros saíram da pobreza e ficaram milionários. Outros saíram da pobreza e ficaram multimilionários, bilionários. Uns poucos ficaram biliardários. Claramente aumentou a desigualdade — mas também reduziu-se a pobreza, chegando a ser eliminada a pobreza extrema. Quem viu Calcutá em 1984 e vê agora não tem a menor dúvida disso.
O liberalismo capitalista é o sistema mais eficaz para combater a pobreza – enquanto, admitidamente, promove a desigualdade. Isso só não vê quem não quer.
Os socialistas de vez em quando afirmam que o liberalismo não tem um sistema de distribuição de riquezas. Eu diria que o liberalismo tem, fundamentalmente, um sistema de geração de riquezas, mas esse sistema claramente envolve uma forma – absolutamente justa, diga-se de passagem – de distribuição de riquezas: quem é mais competente, é mais motivado, se esforça mais, trabalha mais ou melhor, tem mais sorte, acaba ganhando mais. Esse sistema, como eu disse, é justo: faz com que cada um receba o que lhe é devido (a cada um aquilo a que ele fez jus pelo seu trabalho). Esse é o sentido tradicional de justiça: a cada um o que é seu, a cada um aquilo a que ele fez jus. A chamada justiça social é um travesti de justiça: é um método sistemático de produzir injustiças exatamente contra os mais capazes.
Logo, é evidente que o liberalismo tem um sistema de riquezas: tanto que, no capitalismo, a riqueza é distribuída – e o é de forma justa. O capitalismo só não distribui riquezas de forma igual, porque nunca tentou nem tenta nem nunca vai tentar buscar a igualdade sócio-econômica. E, naturalmente, o capitalismo combate a forma injusta de distribuição de riquezas patrocinada pelos socialistas, que envolve tirar de quem tem, isto é, de quem tem competência para gerar riquezas, para dar aos que não têm, isto é, aos que não têm competência para gerar riquezas. Não é de admirar que em toda região em que o socialismo procura implantar seu sistema igualitário, o processo de geração de riqueza acaba sendo penalizado e, por fim, entra em crise, levando à escassez de bens. Basta olhar ao que acontece em Cuba há muito tempo e ao que aconteceu na antiga União Soviética e nos países da antiga Cortina de Ferro.
O capitalismo nem procura reduzir a desigualdade — certamente não através de ação governamental, política públicas, etc. Uma das poucas coisas mais ou menos certas que os socialistas afirmam acerca do liberalismo é que o aumento da desigualdade econômica é um problema ESTRUTURAL do capitalismo – faz parte de sua lógica. O liberalismo, entretanto, não busca a desigualdade: ele busca a geração livre e desimpedida de riquezas. Mas reconhece que a desigualdade econômica é, dadas as diferenças de capacidade, motivação, esforço e sorte existentes entre os seres humanos, inevitável, sempre que o processo de geração de riquezas é livre
Os socialistas afirmam, erroneamente, que para cada pessoa que fica milionária no liberalismo capitalista, são “produzidos” milhões de pobres. Isso não é verdade. Na realidade, é uma besteira de primeira linha. Ninguém “produz” pobres, a não ser o socialismo, que, além de não conseguir enriquecer os pobres, torna os ricos pobres através dos impedimentos que impõe ao processo produtivo livre e através do confisco que faz, mediante impostos e taxas, da renda dos que mais ganham, porque produzem mais ou melhor.
Bill Gates, por exemplo, ficou biliardário — e, no processo, fez milhares de milionários. A Microsoft tem sido a maior fábrica de milionários que o mundo já viu. E ninguém consegue provar que haja uma pessoa só que tenha ficado pobre (que não era pobre antes e ficou pobre) por causa de toda a riqueza gerada nesse processo.
Os socialistas não são capazes de dar o nome e os dados econômicos de UM PAÍS — basta UM — que tenha conseguido alcançar desenvolvimento econômico (geração de riquezas) e igualdade sócio-econômica (distribuição igualitária da riqueza gerada) ao mesmo tempo — ou seja, em que todo mundo ficou igualmente rico (ou, pelo menos, remediado) e não igualmente pobre — em decorrência de políticas socialistas, socializantes, estatistas, intervencionistas, etc. Não estou nem mesmo exigindo que isso tenha sido feito preservando-se as liberdades e os direitos individuais — porque sei que até mesmo a igualdade na pobreza alcançada em Cuba violou essas liberdades e esses direitos.
Em Londres, 10 de dezembro de 2006
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