[Transcrevo aqui, esclarecendo que respondo a um artigo indicado como sendo de Rita Lee, que foi colocado hoje, dia 23/10/2005, dia do referendo, na lista dos professores da Faculdade de Educação da UNICAMP, pela Profa. Ana Lúcia Goulart de Faria. Sugiro que os leitores leiam o artigo de Rita Lee primeiro, que, para conveniência, é transcrito abaixo].
[Nota acrescentada em 25/10/2005: Fui informado hoje de que o texto em questão não seria de autoria de Rita Lee, mas, sim, faria parte de um artigo de Heloneida Studard, publicado originalmente no Jornal do Brasil de 6/2/2001 (! bem antes do Estatuto do Desarmamento e do referendo do dia 23, portanto). Fui verificar e eis que, no site, há um artigo que contém todo o artigo atribuído a Rita Lee (com pequeníssimas mudanças). Para permitir o cotejo, transcrevo a seguir o texto reivindicado por Heloneida Studard, tendo-o retirado do site dela: http://www.heloneidastudart.jor.br/artigos/poderdesarmado.htm. Os meus comentários não são afetados pela autoria do texto, a não ser onde me refiro às drogas. Interpelei a Profa. Ana Lúcia, na lista dos professores da Faculdade de Educação da UNICAMP, sobre a autoria do texto que ela compartilhou.]
Desarmados nascemos todos, mulheres e homens. Essa lenga-lenga de que mulher nasce desarmada, porque não tem pinto, enquanto homem nasceria armado, porque tem, é conversa pra boi dormir. Nem Rousseau, com todo o seu naturalismo simplista, compraria essa enrolação.
Olhando o meu netinho de seis meses, que dormiu aqui em casa de ontem pra hoje, o que se vê é um serzinho totalmente desarmado, frágil. A última coisa que ocorre, ao contemplar o pintinho dele durante a troca de fraldas ou do banho, mesmo (acredito) para mulheres desarmadas de espírito, é que ali esteja uma arma, o símbolo de uma pistola ou de uma espada, o poder (em potencial) de estuprar, de forçar uma penetração indesejada. As drogas que a Rita Lee tomou devem ter afetado o cérebro dela.
Está Rita Lee a sugerir que a violência é um fenômeno tipicamente masculino, biologicamente determinado pelo fato de que a natureza deu aos homens um penduricalho que as mulheres não têm? E se estiver, estão nossas professoras de educação concordando com ela? Para acabar com a violência, basta liqüidar com os homens, ou então castrá-los, ou simplesmente ocupar o poder no lugar deles? Marta Suplicy é menos inclinada à agressividade do que o Eduardo Suplicy simplesmente porque ela não tem um pinto e ele tem? É a isso que se reduz o referendo de hoje???
Se somos escravos da biologia, qual o significado social do fato biológico de que mulheres têm peitos (peitões, quero dizer) e homens não os têm? Os peitos são símbolos do quê? Espero que a Ana Lúcia esclareça — já que da Rita Lee duvido que venha qualquer esclarecimento.
Se formos invocar a biologia, vamos provavelmente descobrir que as fêmeas, especialmente depois de parir e quando acompanhadas de sua prole, são muito mais violentas do que os machos… É verdade que são violentas na defesa da prole, na defesa daquilo que elas produziram, daquilo que é seu — enfim, ousaria eu dizer na defesa de sua propriedade???
Não vivemos no Jardim do Éden. Vivemos num mundo em que homens e mulheres aprendem a ser violentos. Se as mulheres alcançarem hegemonicamente o poder, essa realidade não vão mudar nem um tico.
Não gosto de violência, não gosto de guerra, não gosto de sangue. Mas não sou pacifista. Acredito, com toda a convicção possível, de que não devo ser o primeiro a usar a força contra o meu próximo. Mas acredito, com igual convicção, que se alguém usar a força contra mim, tenho todo direito de reagir — com qualquer arma a que puder ter acesso.
O referendo de hoje se situa neste contexto: pode o governo, cuja função primeira é garantir o exercício de meus direitos, atribuir-se o direito de me privar do direito de me defender contra a violência e a agressão alheia — especialmente quando ele, aqui no Brasil, nada faz para me proteger dessa violência?
Mulheres, a quem a natureza deu, em média, menor tamanho e menor força física do que aos homens, deveriam ser capazes de apreciar o fato de que uma arma pode, no devido momento, ajudá-las a impedir um estupro, uma penetração forçada, uma violação daquilo a que só por consentimento se deveria ter acesso.
Em 23 de outubro de 2005
—–Original Message—–
From: docentesfe-bounces@listas.unicamp.br
On Behalf Of Ana Lucia Goulart de Faria
Sent: Sunday, October 23, 2005 11:32 AM
To: docentesfe@listas.unicamp.br
Subject: [Docentesfe] ENC: Rita Lee
Importance: High
On Behalf Of Ana Lucia Goulart de Faria
Sent: Sunday, October 23, 2005 11:32 AM
To: docentesfe@listas.unicamp.br
Subject: [Docentesfe] ENC: Rita Lee
Importance: High
Eis a opinião da Rita Lee. Abraço, voto sim, Ana Lúcia (Goulart de Faria)
Mulheres na Visão da Rita Lee
Por mim, acho que só as mulheres podem desarmar a sociedade, até porque elas são desarmadas pela própria natureza: Nascem sem pênis, sem o poder fálico da penetração e do estupro, tão bem representado por pistolas, revólveres, flechas, espadas. Ninguém lhe dá, na primeira infância, um fuzil de plástico, como fazem os meninos, para fortalecer sua virilidade e violência.
As mulheres detestam o sangue, até mesmo porque têm que derramá-lo na menstruação ou no parto.
Odeiam as guerras, os exércitos regulares ou as gangues urbanas, porque lhes tiram os filhos de sua convivência e os colocam na marginalidade, na insegurança e na violência.
É preciso voltar os olhos para a população feminina como a grande articuladora da paz. E para começar, queremos pregar o respeito ao corpo da mulher. Respeito às suas pernas que têm varizes porque carregam latas d’água e trouxas de roupa. Respeito aos seus seios que perderam a firmeza porque amamentaram seus filhos ao longo dos anos. Respeito ao seu dorso que engrossou, porque elas carregam o país nas costas.
São as mulheres que irão impor um adeus às armas, quando forem ouvidas e valorizadas e puderem fazer prevalecer a ternura de suas mentes e a doçura de seus corações.