Meus dois autores favoritos de ficção são Ayn Rand e Graham Greene.
Dificilmente poderia haver dois indivíduos mais diferentes em quase todos os aspectos. Só menciono um. De um lado, uma atéia, do outro um católico fervoroso (embora tenha sido um dos grandes pecadores da história que se penitenciou narrando seus pecados, não a um confessor, mas a seus leitores).
Rand descreve seres humanos, como eles deveriam ser, interagindo com seres humanos, como efetivamente o são os da pior espécie — isto, dentro da sociedade que temos, mas na qual, ainda que pelas margens, vai sendo construída uma nova sociedade (Atlantis), agora como ela deveria ser, que, aos poucos, consegue fazer com que aquela se dobre à sua superioridade.
Greene descreve seres humanos vivendo vidas reais, agoniadas por conflitos pessoais, alguns de natureza amorosa, outros de natureza ética e religiosa, às vezes política, mas que se misturam uns com os outros e transforman a vida dos que os exibem muitas vezes num inferno.
Talvez, de todos os heróis de Rand, Hank Rearden, um dos principais personagens de Atlas Shrugged (A Rebelião de Atlas), é o que mais se parece com os anti-heróis de Greene. Dilacerado pela lealdade que ele sentia que devia ter para com uma mulher que ele não amava e a paixão que ele sentia por uma mulher que ele acreditava que não poderia ser sua, ele sofre tanto quanto os mais sofridos personagens de Greene. Mas Rearden, no decorrer do romance, vê a luz, descobre a verdade, e transcende, ou “overcomes”, o seu conflito. Os personagens de Greene em geral não têm igual sorte. Maurice Bendrix, em The End of the Affair, sofre o tempo todo, por se apaixonar por Sarah Miles, mulher de seu amigo, e, depois, por achar que ela o está traindo com um personagem misterioso, e, ainda depois, por perde-la, em uma sequência de fatos que absolutamente não parecem fazer sentido. Quando descobre o segredo que explica os fatos, esse segredo é pior do que a presumida traição, porque ele vai rouba-la dele — e do mundo — para sempre. Ninguém ganha quando luta contra Deus, é o que aparentemente conclui o romance, que termina com um Bendrix emocionalmente destruído vivendo com o amigo, agora viúvo, que ele traía. Parece um dramalhão, mas Greene sabe descrever a história com maestria e incomparável suspense de modo a prender o leitor. E o filme, na versão de 1999 (não tanto na versão de 1955) transfere a beleza da história, o sofrimento dos personagens, e o suspense da narrativa, que mantém a atenção, de forma inigualável na cinematografia recente.
Em São Paulo, 25 de Maio de 2013.