O "Liberalismo" e a "Justiça" de John Rawls

John Rawls é considerado por muitos o grande expoente do liberalismo atual e um grande defensor da justiça. Na verdade, tem dois livros famosos, um sobre justiça e outro sobre liberalismo.  

Mas a verdade é que nem Rawls é liberal (no sentido clássico), nem a justiça que ele propõe é justiça (no sentido clássico). Ele inova, propondo sentidos novos para os conceitos de liberdade e de justiça. Em suma: Rawls é, na minha opinião, uma fraude (do ponto de vista do Liberalismo Clássico e da Teoria Clássica da Justiça).

Rawls só pode ser chamado de liberal no sentido que os americanos dão ao termo, sentido esse que é oposto ao sentido original do termo “liberal”. Liberal, no sentido americano, é quem é social-democrata, na fala comum. Esse “liberal americano”, ou social-democrata, chegando perto de socialista, reinterpreta o conceito básico doo Liberalismo, que é o conceito de Liberdade. Para ele, a Liberdade não deve ser interpretada apenas em um sentido negativo, como ausência de coação para fazer ou deixar de fazer algo: ela deve incluir, também, um sentido positivo, que envolve dar condições de toda ordem ao indivíduo para que ele possa efetivamente vir a exercer e desfrutar sua liberdade. 

Quanto à suposta justiça que Rawls defende, basta dizer que, para expressar o que ele pensa é suficiente enunciar uma tese dele, a saber, que as únicas desigualdades que podem ser consideradas justas e justificadas são aquelas das quais podemos esperar que operem em benefício daqueles que estão em situação pior. As desigualdades que beneficiam os que estão em situação melhor são, segundo ele, injustas e injustificadas – ainda que elas sejam decorrentes do mérito (capacidade + esforço) dessas pessoas.

“A pessoa talentosa”, diz Rawls, “não fez por merecer (‘earned’) nada, seja lá quem ela for: ela só pode se beneficiar de sua sorte (‘fortune’) se vier também a beneficiar aqueles que saíram perdendo”.

Que uns nasçam com talentos e outros não, ou que uns nasçam com muitos talentos, e outros com poucos, parece ser, para Rawls, uma “injustiça natural”, que teria de ser compensada por uma “justiça social“, que inverte os benefícios naturalmente concedidos. Segundo essa justiça social, quem é talentoso (tem habilidades) e competente (além da posse das habilidades, é motivado e se esforça) não tem direito aos frutos de seu talento e de sua competência: só os sem talento e incompetentes é que têm direito aos frutos dos talentos dos competentes. Os sem talento e incompetentes devem se beneficiar daquilo que não conseguem alcançar, mas os talentosos e competentes são privados dos benefícios até mesmo daquilo que conseguem realizar.

Rawls nega à pessoa talentosa e competente o direito de se beneficiar de seus talentos e competências: dela vêm as habilidades e o esforço, mas os frutos dessa habilidade irão para os outros, em atendimento às suas necessidades…  

Isso não é justiça: é travesti de justiça.

Para se ter idéia das deturpações que uma tese como essa gera, basta lembrar dois fatos:

a) Na década de 70 um ganhador do Prêmio Nobel em Economia, Jan Tinbergen, da Holanda, propôs, numa conferência internacional em Nova York, que se criasse “um imposto sobre a capacidade pessoal dos indivíduos“;

b) Em artigo publicado no New York Times de 20/1/73, sob o título de “A Nova Desigualdade”, Peregrine Worsthorne declara que, da mesma forma que considerávamos injusto que alguém recebesse um maior quinhão de riquezas apenas porque era filho de um nobre, devemos também considerar injusto que alguém, hoje, receba um maior quinhão de riquezas por ter nascido com maior capacidade, ou ter desenvolvido melhor suas capacidades, ou por ter mais motivação ou ter nascido em ambiente propício.

É isso.

O conceito clássico (e verdadeiramente liberal) de justiça é aquele, segundo o qual justo é cada um poder receber e manter aquilo a que ele fez jus, aquilo que lhe é de direito (de jure) — e, portanto, aquilo que lhe é devido. 

Qualquer coisa diferente é “newspeak“, é tentativa de usar o próprio conceito de justiça para tentar justificar o injusto — no fundo, a expropriação e o roubo (ainda que por meios legais).

Em Campinas, 15 de maio de 2005

2 responses

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