Transcrevo na íntegra o artigo sobre o ENEM do Elio Gaspari na Folha de S. Paulo de hoje (10/11/2010), porque é exatamente o que eu penso.
Gostei não só da crítica, perfeita, às tentativas vergonhosamente fracassadas de colocar o ENEM como um tipo de vestibular nacional único e unificado, ficando o governo federal / estado brasileiro como gestor do ingresso da população brasileira ao Ensino Superior. Em decorrência do vexame do ano passado, USP e UNICAMP, que haviam sido pressionadas a aderir, encontraram o motivo procurado para sair do esquema. Os resultados completos do vexame deste ano ainda estão por vir.
Também gostei das cutucadas, merecidas, aos “educatecas”… “O educateca pernóstico é o sujeito que inventa um teste de ‘linguagem, códigos e suas tecnologias’ para designar aquilo que se chamava prova de português”. Em termos de inovação terminológica, há que se admitir que os milicos inventaram melhor, quando chamaram isso de “Comunicação e Expressão”. Essa frescura terminológica, é verdade, começou na gestão do Paulo Renato no MEC. Os Parâmetros Curriculares Nacionais já usam a expressão “Linguagem, Códigos e suas Tecnologias”.
Já disse no Facebook que em qualquer país sério a cúpula do MEC/INEP teria rolado com o segundo vexame seguido do ENEM. O Elio Gaspari diz a mesma coisa. O Lulla, em vez de demitir os responsáveis pelo vexame, os elogia e minimiza o problema. Isso é Brasil.
Desse jeito, poderemos até ser a quinta economia do mundo, por causa do tamanho de nossa população. Mas continuaremos a ser subdesenvolvidos.
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Folha de S. Paulo
10 de Novembro de 2010
ELIO GASPARI
Os educatecas do Enem levaram bomba
Haddad acreditou no que disse, foi de Waterloo para Stalingrado, e a conta do fracasso foi para a garotada
O PRESIDENTE do Inep, Joaquim José Soares Neto, titular da lambança ocorrida com a prova do Enem, deveria ter pedido demissão no sábado, desculpando-se aos 3 milhões de jovens cuja vida atrapalhou. Não tendo-o feito, o ministro da Educação, Fernando Haddad, deveria tê-lo demitido na segunda-feira. Não tendo-o feito, Haddad deveria ter pedido demissão ontem.
Os educatecas do Inep e Haddad mostraram que um raio cai duas vezes no mesmo lugar. No ano passado, uma sucessão de prepotências e inépcias transformaram o projeto do Enem como substituto do vestibular num dos maiores fracassos do governo Lula. O ministro culpou a lei das licitações. Livrou-se dela e foi de Waterloo para Stalingrado.
O educateca pernóstico é o sujeito que inventa um teste de “linguagem, códigos e suas tecnologias” para designar aquilo que se chamava prova de português. É um chato, mas não faz mal a ninguém. Maligno é o educateca com alma de bedel. O doutor Soares Neto, por exemplo.
O Inep proibiu que os estudantes levassem lápis para a prova. Com isso tirou o direito da garotada de rabiscar cálculos e anotações à margem da prova. Na hora de aporrinhar, o educateca pode tudo. Na hora de fazer o seu serviço, pode nada.
O dia do Enem é uma jornada de tensão na vida de milhões de jovens e de suas famílias. A nota do teste habilita os estudantes para as bolsas do ProUni e em muitos casos determina-lhes o futuro. Nessa hora, em vez de o poder público aparecer com uma face benevolente, vem com os dentes de fora.
Em 2009 furtaram-se as provas; em 2010, inverteram-se os gabaritos e distribuíram-se exames com questões repetidas ou inexistentes. Segundo o MEC, a responsabilidade é da gráfica. Segundo a gráfica, a lambança atingiu apenas 0,33% dos 10 milhões de cadernos. Conclusão: 100% da culpa é das vítimas.
Descobertos os erros, não ocorreu aos doutores tirar dos portais do Inep e do MEC uma autoglorificação do doutor Soares José Neto Joaquim: “O primeiro dia de provas do Enem transcorreu em normalidade”. Segundo ele, a lambança “de forma alguma prejudica a credibilidade do Enem”. Empulhação.
No dia seguinte, ameaçaram chamar a Polícia Federal para xeretar tuiteiros. (A propósito, inversões são um estorvo. O nome do educateca é Joaquim José Soares Neto.)
O ministro Fernando Haddad foi de Waterloo para Stalingrado porque acreditou nas próprias promessas. Quis fazer uma coisa, fez outra, deu errado em 2009 e voltou a dar errado em 2010. Quando o Enem/ Vestibular foi lançado, a garotada poderia fazer a prova duas vezes por ano, talvez três. Desistiram, preservando a máquina de moer carne, obrigando o jovem a jogar seu futuro num só fim de semana.
Haddad e o Inep sabem que um similar americano do Enem, o SAT, é oferecido à garotada em sete ocasiões ao longo do ano. O teste é feito on-line e as questões são praticamente individuais, complicando-se conforme o desempenho do estudante. Os educatecas não gostam desse exame, porque os obrigaria a trabalhar muito mais, expandindo seu acervo de questões e obrigando-os a conviver com uma cultura de provas eletrônicas, abandonando o método medieval do papel e caneta (lápis é proibido).
Burocrata gosta é de assinar contrato, de preferência sem licitação. Deu no que deu.
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Em São Paulo, 10 de Novembro de 2010
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