[Trabalho meu, por mim apresentado no Seminário Internacional sobre Educação e Desenvolvimento: Integrando Políticasrealizado em Brasília, de 3 a 5 de Maio de 2011. A Coordenação do Seminário foi da Representação da UNESCO no Brasil, em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com o Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (IPC-IG), com a Fundação Carlos Chagas (FCC) e com a Cátedra UNESCO em Educação e Desenvolvimento Humano no Instituto Ayrton Senna (IAS), que eu coordenava na época — e cuja criação, em 2003, resultou de projeto que apresentei ao IAS. Coordenei a Cátedra de 2003 a 2006 e de 2011 a 2013. É sempre bom frisar que os pontos de vista defendidos neste artigo expressam exclusivamente a minha opinião e não representam, necessariamente, pontos de vista da UNESCO, do Instituto Ayrton Senna, ou de qualquer outra instituição envolvida no evento ou com a qual o autor possa estar associado. O texto foi revisado pela última vez em 15/5/2011, exatamente três anos atrás, hoje.]
Educação ao Longo da Vida e Desenvolvimento Humano
Conteúdo
1. Introdução: O Problema Básico
2. Contraponto: A Educação Focada nas Necessidades da Sociedade
3. Transição: Educação, Sonhos e Competências
4. A Educação Focada nas Necessidades da Pessoa
5. É Possível Compatibilizar Essas Visões?
1. Introdução: O Problema Básico
Que a educação escolar do Brasil vai mal ninguém duvida. Se duvidasse, bastaria olhar a posição do país em testes internacionais, como PISA, para se convencer.
Todo mundo, dentro e fora do país, lamenta esse fato e deseja que a educação escolar brasileira melhore e alcance nível de qualidade aceitável.
Esse aparente consenso se dissolve rapidamente, entretanto, quando se pergunta o que estaria errado com a educação escolar brasileira e qual seria forma de coloca-la no caminho da melhoria constante da qualidade.
Projetos, programas, e políticas são propostos para melhorar a educação brasileira, sem que tenhamos alcançado precisão, para não falar em consenso, sobre qual é o problema – ou, mais provavelmente, quais são os problemas.
A educação escolar é um sistema altamente complexo. Embora haja consenso de que ele não está a funcionar como esperado, não há consenso sobre o que se espera dele e sobre quais os principais problemas que ele enfrenta.
Vejamos, ilustrativamente, a questão fundamental do conceito da educação e do objetivo basilar da educação escolar.
Uns defendem o ponto de vista de que o objetivo basilar da educação escolar é transmitir a herança cultural (do mundo, do continente, do país, da região, do grupo) de uma geração para a outra, assim permitindo que as novas gerações se insiram numa tradição cultural e a mantenham viva. O foco aqui está, basicamente, em perpetuar a herança cultural.
Outros defendem o ponto de vista de que o objetivo basilar da educação escolar é formar o cidadão que participará da criação de uma sociedade democrática mais justa. O foco aqui está, basicamente, em melhorar a qualidade da vida social.
Outros defendem o ponto de vista de que o objetivo basilar da educação escolar é formar pessoas que possam contribuir para o desenvolvimento econômico do grupo, da região, do país, do continente, do mundo. O foco aqui está, basicamente, em gerar crescimento econômico.
Outros defendem (hoje) o ponto de vista de que o objetivo basilar da educação escolar é prover o mercado com “mente de obra” capacitada para atender às necessidades da sociedade da informação, da cultura digital, da economia do conhecimento. (Anteriormente defendiam o ponto de vista de que esse objetivo era prover o mercado com “mão de obra” para atender às necessidades da sociedade industrial e de suas instituições sociais e culturais). O foco aqui está, basicamente, em alimentar a realidade social, cultural e principalmente econômica.
Aqui neste trabalho defenderei o ponto de vista de que a educação é o termo que usamos para designar o processo de desenvolvimento humano – desenvolvimento, no caso, das pessoas, dos indivíduos (não, em um primeiro plano, da sociedade, da cultura, da economia). Seu objetivo basilar, portanto, é duplo: de um lado, criar oportunidades para que as pessoas possam se desenvolver no máximo de suas potencialidades; de outro, ajuda-las a desenvolver, num quadro de autonomia e protagonismo, as competências necessárias para elaborar um projeto de vida responsável e transformá-lo em realidade, assim valendo-se das oportunidades existentes para viver uma vida que as satisfaça e realize.
O desenvolvimento social, cultural e econômico é um resultado, não um objetivo basilar desse processo.
A escola, e sua relação com as demais instituições que se ocupam da educação, deve ter sua função definida no bojo de uma concepção abrangente de educação como esta.
Se não as inserirmos em uma visão abrangente e estruturante da educação, como a aqui proposta, a maior parte das “soluções” propostas para a educação escolar brasileira acaba se tornando parcial e segmentada. Mesmo que elas contribuam para a solução de algum problema específico da educação escolar brasileira, não representam uma melhoria substantiva e significativa na qualidade total dessa educação.
Ilustro com algumas dessas “soluções”, expressas na forma de propostas de políticas públicas:
* Propostas voltadas para trazer para a escola a criança em idade escolar que está fora da escola
* Propostas voltadas para viabilizar a permanência na escola da criança que chega lá durante pelo menos x (4, 8, 9, 12, 16…) anos
* Propostas voltadas para aumentar o tempo de permanência da criança na escola, sejam elas dirigidas para:
- aumentar o número de anos de escolaridade obrigatória (4, 8, 9, anos, quiçá 12 ou 16)
- aumentar o número mínimo de dias letivos (160, 180, 200 dias)
- implantar o tempo integral
- aumentar a duração dos turnos
- reduzir o “desperdício” existente no uso do tempo escolar para atividades pedagógicas
* Propostas voltadas para reduzir a repetência e a evasão
* Propostas voltadas para corrigir defasagens idade / série
* Propostas voltadas para melhorar o salário do professor ou para introduzir mecanismos de remuneração que privilegiem desempenho e mérito
* Propostas voltadas para estender e melhorar a formação do professor
* Propostas voltadas para introduzir a tecnologia na escola e para implantar programas de educação a distância (inclusive para a formação de professores)
Os profissionais da educação, por sua vez, especialmente os que trabalham diretamente na prática pedagógica, como é o caso dos professores, além de reivindicar, com justeza, melhores salários e condições de trabalho, em geral focam, na área pedagógica, questões como estas:
* A melhoria do currículo (o que os alunos devem aprender?): inclusão nele de novas matérias obrigatórias, flexibilização, etc.
* A adoção de novas metodologias (como os alunos devem aprender?): pedagogia de projetos, objetos de aprendizagem, etc.
* A introdução de novas formas de avaliação: progressão continuada, exames nacionais, etc.
Ao se proporem políticas nessas áreas e ao se promoverem essas discussões, raramente, se levantam algumas questões básicas como, por exemplo, as seguintes:
* A natureza da educação –> O que é educar?
* A razão de ser da educação –> Por que educar?
* O objetivo da educação –> Para que educar?
No entanto, é a resposta a essas questões sobre a natureza, a razão de ser e o objetivo da educação que vai nortear, de forma tácita ou consciente, as decisões acerca do acesso à escola e da permanência na escola, acerca da formação do professor, acerca do que os alunos devem aprender (currículo), de como eles devem aprender (metodologia), e de como se deve aferir se realmente aprenderam (avaliação).
Ou vejamos.
Políticas voltadas para trazer a criança para a escola, mantê-la lá, e aumentar seu tempo de permanência lá só fazem sentido se a experiência escolar for uma genuína experiência de aprendizagem. Embora alguns afirmem que a escola básica tem também uma função de guardiã de crianças e adolescentes, só essa função dificilmente justifica a existência dessa gigantesca e cara instituição. A escola existe, primariamente, como ambiente de aprendizagem. Mas há evidência incontestável, hoje, de que a mera permanência dos alunos na escola, ainda que por cada vez mais tempo e em período integral, não produz, necessariamente, aprendizagem genuína. Para boa parte dos alunos de nossas escolas a experiência escolar é vista, a maior parte do tempo, como basicamente inútil para a sua vida, para o que eles querem fazer dela, para os projetos de vida e sonhos que possuem. A experiência escolar típica é percebida por boa parte dos alunos como não servindo para grande coisa ou até mesmo como desagradável (chata é o principal termo que se aplica à aula, que ainda hoje é a experiência pedagógica central no ambiente escolar). O resultado comprovado são crianças / adolescentes que passam oito anos na escola e não alcançam níveis adequados de alfabetização funcional na língua materna (para não falar em letramento e em línguas estrangeiras) – embora possam até aprender a ler e escrever – isto é, a decodificar a língua escrita.
Como ressaltei em minha fala no congresso realizado pelo Instituto Ayrton Senna, em 2003, intitulado “Educação e Tecnologia para o Desenvolvimento Humano”, não é qualquer escola que serve… e erra quem afirma que “qualquer escola é melhor do que nenhuma escola”: a escola ruim, além de não fazer bem, causa muitos males, como, por exemplo:
* Desperdício de recursos de quem cria e mantém e perda de tempo de quem freqüenta
* Diminuição da curiosidade e da vontade natural de aprender por parte dos alunos, que passam a ver a aprendizagem, a educação e a escola como coisas chatas, não desafiadoras, que nada têm que ver com as coisas boas e interessantes da vida
* Fracasso escolar de muitos alunos que poderiam aprender muito e com prazer em uma escola diferente mas que, em decorrência da experiência escolar, concluem que a causa do fracasso está em si mesmos e não na inadequação da escola
É por isso que políticas voltadas para solucionar problemas específicos, parciais, segmentados, não resolvem o desafio da qualidade na educação.
Precisamos, como já disse, de uma abordagem sistêmica, holística e integral, que olhe para a educação como um todo, abrangendo aspectos formais e não-formais, que não diferencie arbitrariamente entre diferentes níveis, como educação de nível básico (educação infantil, educação fundamental, educação média), educação técnica, tecnológica e profissional, educação de jovens e adultos, educação de nível superior, educação de adultos, que reconheça que o desenvolvimento humano através da aprendizagem é a essência da educação e duram, tanto a aprendizagem como o desenvolvimento que ela proporciona, a vida toda, e que sua promoção é tarefa que cabe não apenas à escola, pública, comunitária ou particular, mas à família, à comunidade, aos meios de comunicação, às diversas redes sociais, às organizações não governamentais, às empresas, ao governo – enfim, à sociedade como um todo, através de seus múltiplos e diversificados mecanismos e instituições.
Essa abordagem sistêmica, holística e integral precisa ser corajosa e ousada, buscando uma transformação radical, ampla e profunda e não pequenas mudanças parciais, segmentadas, evolutivas, gradualistas, incrementais, que podem melhorar a educação um pouquinho aqui e ali, que podem reformar um ou outro aspecto mais grave ou urgente, mas que não transformam o todo. Esse tipo de transformação radical, ampla e profunda precisa buscar real inovação, o claramente novo. Não basta reformar e melhorar o que já existe. Precisamos de real transformação, que verdadeiramente represente uma inovação.
Todo mundo na área a educação tem falado sobre a necessidade de mudanças na educação escolar e vai além: afirma que não bastam mudanças parciais, incrementais, graduais, reformadoras, evolutivas – as mudanças precisam totais, sistêmicas, em paralelo, transformadoras, revolucionárias. E todo mundo afirma que essas reformas, que mudam o paradigma, e vão levar a educação escolar para além do modelo industrial, são urgentes… No entanto, as propostas de mudança que aparecem são tímidas, parciais, segmentadas, setoriais: elas podem reformar e melhorar uma área da educação, mas não transformam o todo.
Não se trata, de modo algum, de desmerecer o que tem sido feito com tanto esforço e, muitas vezes, sofrimento. Mas é preciso reconhecer que esse tipo de mudança reformadora e melhorista não vai nos permitir dar o salto de qualidade de que precisamos na área da educação.
No fundo, todos nós sabemos que é verdade o que diz Jay Allard:
“Para mudar o mundo, precisamos imaginá-lo diferente do que é hoje. Se, nessa visão, usarmos muito do conhecimento e da experiência que nos trouxeram até aqui, terminaremos exatamente onde começamos… Para ter um resultado diferente, temos de olhar as coisas de uma perspectiva radicalmente diferente.” [1]
Por que a gente não ousa?
Cito um exemplo, agora de fora da área da educação, envolvendo o mercado livreiro. O exemplo de certa forma privilegia o fator tecnologia como agente de mudanças, mas esse fator depende da utilização que nos dispomos a fazer dele, podendo ser usado de forma conservadora, reformadora ou transformadora.
* Os livros impressos, como os conhecemos, existem há cerca de 550 anos num mercado que era, até há pouco tempo, bastante estável.
* Livrarias físicas eram a principal forma de distribuição dos livros aos usuários finais, e, por muito tempo, funcionavam com pouca ou mesmo nenhuma tecnologia (usando cadernos e fichas para controle de estoque, cadernos ou simples máquinas de calcular ou caixas registradoras para registro de vendas e fluxo de caixa, folhas de cálculo para contabilidade e, se fosse o caso, folha de pagamento.
* A chegada de tecnologia básica (computadores com planilhas eletrônicas ou programas comerciais integrados) permitiu que o livreiro continuasse a fazer a mesma coisa que já fazia, só que, agora, com pequenos ganhos de eficiência – esse é um uso conservador da tecnologia.
* A chegada de tecnologia ainda básica, mas com acesso à Internet, permitiu que o livreiro criasse um site para a livraria e que anunciasse os livros no site, assim aumentando o alcance de sua comunicação e propaganda – esse é um uso levemente reformador da tecnologia.
* A chegada de tecnologia um pouco mais avançada permitiu que o livreiro passasse a vender livros também online, acrescentando um subsite de venda ao site da livraria – uso bem mais reformador da tecnologia, que estende o escopo do negócio, posto que qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, pode comprar um livro no site. (A Educação a Distância normalmente se situa nesse nível, no caso da educação).
* Entra Jeff Bezos em cena e cria uma livraria online, a Amazon, que não tem estoque, só tem catálogo, e que, na realidade, intermedeia a venda de livros para o comprador-leitor. (Todo mundo conhecia a tecnologia que viabilizava essa solução, mas só ele pensou nisso e agiu conforme a sua visão).
* O desenvolvimento de tecnologia relativamente sofisticada permitiu que a Amazon passasse a criar perfis altamente sofisticados dos seus clientes – uso de tecnologia (banco de dados com ferramentas analíticas sofisticadas) que leva o uso reformador da tecnologia no ambiente livreiro ao seu limite. (Novamente, a tecnologia que permite fazer isso não era desconhecida de outros empreendedores. Mas Bezos foi o primeiro a pensar em usá-la assim).
* Tecnologias mais sofisticadas ainda permitem a criação e comercialização de livros eletrônicos (e-books) e de leitores de livros eletrônicos (e-book readers) – uso agora criativo, inovador e transformador da tecnologia, que radicalmente revoluciona o mercado livreiro e deixa editores e livreiros tradicionais, para não falar em fabricantes de computadores e até consumidores, em polvorosa.
Por que não conseguimos fazer uma transformação desse tipo na educação? Por que não conseguimos reiventar a escola? Será que a escola é uma instituição tão sui generis que desenvolvimentos que se aplicam a outras instituições não podem ter paralelo nela?
Eu sugiro que, para transformar a escola atual em um ambiente de aprendizagem digno do nome, é preciso repensar, de forma drástica e radical, o que entendemos por educação e dar respostas verdadeiramente inovadoras a questões como “Por que educar?” e “Para que educar?”
Somente dessa forma iremos ser capazes de “integrar políticas” voltadas para a educação, agora entendida como desenvolvimento humano, e apresentar soluções sistêmicas que, aplicadas, melhorem substitantivamente a experiência de aprendizagem de nossos alunos.
Mas, como veremos a seguir, não é qualquer resposta a essas questões que nos levarão à melhoria da qualidade da educação no contexto histórico, social, cultural e econômico em que vivemos.
2. Contraponto: A Educação Focada nas Necessidades da Sociedade
Se a natureza da educação se revela, como imaginava Émile Durkheim (1858 – 1917), no processo através do qual as gerações mais velhas “procuram suscitar e desenvolver, nas crianças, . . .[os] estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política no seu conjunto e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine”, vamos ter um tipo de resposta para as questões “Por que educar?” e “Para que educar?”. Consequentemente, vamos ter currículos, metodologias e formas de avaliação coerentes com esse entendimento da educação – e vamos especificar a função da escola, e, dentro da escola, o papel dos professores, de uma forma determinada, coerente com esse entendimento.
A educação, neste caso, é um processo que adultos realizam sobre crianças. Os adultos (as gerações mais velhas) são o sujeito do processo, as crianças (as gerações mais novas), o seu objeto. As crianças não participam do processo, no sentido ativo da expressão: elas o sofrem. Os adultos as educam. As crianças são educadas. Em relação à criança, o processo todo lhes é imposto – de cima para baixo, por assim dizer.
Além disso, e, em grande medida, por causa disso, o processo acontece, em relação à criança, também de fora para dentro. Ele não envolve algo que se constrói a partir da curiosidade da criança, de seus interesses, de seus desejos, combinados com seus talentos, suas aptidões, seus potenciais. Embora Durkheim use termos – “suscitar” e “desenvolver” – que podem sugerir que seja isso, na realidade o processo é de introjeção. Introjetar é fazer com que algumas pessoas (no caso, as crianças) incorporem, isto é, passem a consider seus, os ideais, as crenças e os valores de outras pessoas (no caso, dos adultos). É isso que Durkheim quer dizer quando fala em “suscitar e desenvolver, nas crianças, . . . estados físicos, intelectuais e morais”.
Por que educar, dentro dessa visão? Qual a razão de ser do esforço?
Educa-se, basicamente, por um reclamo da sociedade e dos grupos sociais, não por uma necessidade intrínseca da criança. É preciso introjetar nas crianças aqueles ideais, crenças e valores “reclamados pela sociedade política no seu conjunto e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine”.
E por que a sociedade e os grupos sociais exigem que esses “conteúdos” sejam introjetados por uma geração na outra, ou, em versão mais amena, transmitidos, repassados, entregues por uma geração para a outra? Porque se acredita que é pela educação que a sociedade e os grupos sociais se mantêm, preservam sua identidade, se reproduzem. Nessa visão, a educação é uma exigência criada pela necessidade de sobrevivência, ao longo do tempo, da sociedade e dos grupos sociais – o processo mediante o qual essas estruturas se perpetuam, através das gerações.
Mas, e do lado da criança, para que ela é educada, dentro dessa visão? Qual o objetivo de sua educação?
A criança é educada para cumprir, na sociedade e no meio social “a que se destine”, o papel que dela se espera. Esse papel lhe é definido a priori: aquilo que ela vai ser e fazer na sociedade e no grupo social está predeterminado e fixado – não pela natureza da criança, pelos seus talentos naturais, pelos seus interesses e desejos, mas pela vontade da sociedade e do grupo social.
Nessa visão da educação, a mente da criança ao nascer é vista como uma tabula rasa, uma folha de papel totalmente em branco, na qual é preciso escrever o roteiro daquilo que a criança vai ser e fazer na sociedade e no grupo social. Para usar outra metáfora, a mente da criança ao nascer é vista como uma entidade sem forma (uma espécie de massinha de modelar) à qual é preciso dar a forma que ela deve ter – a qual é preciso “formar”…
Uma vez escrito esse roteiro, ou dada essa forma, está completada a tarefa educativa.
Essas metáforas, que são usadas com frequência no discurso educacional, são pesadas, e carregadas de implicações.
A metáfora da mente da criança ao nascer como uma tabula rasa na qual é preciso escrever um roteiro deixa claro que a criança não participa do processo, nada tem a dizer sobre seu projeto de vida e a forma de realizá-lo. Tudo isso é definido para ela e por ela, sem levar em conta seus sonhos e seus talentos naturais…
A metáfora da mente da criança ao nascer como uma entidade informe à qual é preciso dar forma deixa claro que a sociedade e os grupos sociais possuem algumas fôrmas (sim, com o “o” fechado) nas quais pretendem encaixar as novas gerações, mesmo que o material a ser formado não se ajuste naturalmente à fôrma que lhe cabe…
Quanto padre que queria ser advogado, quanto engenheiro que queria ser poeta, quando médico que queria ser artista esse paradigma produziu!
B. F. Skinner, que adotava uma versão mais psicológica e menos sociológica dessa visão, costumava dizer que, se lhe dessem dois gêmeos idênticos, na hora do nascimento, ele poderia, controlando os roteiros que seriam escritos na tabula rasa de cada um, ou os processos formativos a que seriam submetidos, fazer de um um criminoso odiado, de outro um santo venerado…
Como se pode facilmente depreender do sucinto apanhado aqui apresentado, a prevalecer esse entendimento da natureza da educação não faz sentido falar em educação ao longo da vida toda, tema hoje importante para a UNESCO. Ou em educação de adultos, tema hoje em grande parte incorporado ao anterior. Escreve-se o roteiro, ou dá-se à criança a forma que a sociedade e o grupo social desejam que ela tenha, e ela está pronta para a vida social – para exercer seu papel “no meio especial a que, particularmente, se destine”…
3. Transição: Educação, Sonhos e Competências
Na contra-mão dessa concepção, temos uma outra visão da educação que enfatiza processos totalmente diferentes. Se a natureza da educação está em ser o que Antonio Carlos Rodrigues de Moraes, professor de educação básica na rede pública de Campinas, poeticamente descreve como o processo mediante o qual nos tornamos (a) capazes de sonhar os próprios sonhos e (b) competentes para transformá-los em realidade, vamos ter um tipo de resposta diferente para as questões “Por que educar?” e “Para que educar?” – e essas respostas vão nos levar a tomar decisões muito diferentes nas áreas de currículo, metodologia e avaliação, pois essas decisões deverão ser coerentes com essas respostas e com o entendimento da educação que elas incorporam. E vamos especificar a função da escola, e, dentro dela, o papel do professor, de maneira diferente.
Entre outras coisas, a prevalecer esse entendimento da educação que nos fornece o professor campineiro, a educação é um processo que, em relação aos indivíduos, age, por assim dizer, de dentro para fora: é algo que pode ser descrito (para usar as palavras de Jacques Delors, no Prefácio do Relatório que leva seu nome) como “uma via privilegiada de construção da própria pessoa”, da realização de um potencial que, em grande medida, já está dentro da pessoa. Como esclarece Jacques Delors, “cada pessoa … [tem] vocação para escolher o seu destino e realizar todas as suas potencialidades” [2]. Assim, cada pessoa pode se tornar aquilo que ela quer ser. As únicas limitações estariam nos talentos naturais de cada uma e nas oportunidades de desenvolvimento que cada uma encontre.
Nessa visão, a educação é um processo que pode ser descrito como de baixo para cima: ele começa no nascimento e termina apenas quando não somos mais capazes de sonhar… Dura a vida toda. E, nesse caso, a escola será apenas uma das muitas instituições que nos ajudam a nos educar, vale dizer, a nos desenvolver, vale dizer ainda, a adquirir autonomia para sonhar os próprios sonhos e competência para transformá-los em realidade.
Esse processo, embora certamente envolva as crianças, pois começa com elas, não se limita a elas, nem envolverá a escola o tempo todo, tendo lugar na “sociedade educativa”, através dos meios digitais de comunicação e acesso à informação, da vida profissional, e das atividades culturais e de lazer, viabilizadas pela tecnologia ou realizadas no âmbito da comunidade e da família (como bem o coloca Jacques Delors, no Prefácio a Educação: Um Tesouro a Descobrir [3]).
As questões acerca do que as pessoas devem aprender ao longo de suas vidas, de como devem aprendê-las, de como se deve aferir se as aprenderam adequadamente, adquirem aqui contornos e coloridos bastante diversos e diversificados.
Certamente essa visão da educação é muito mais compatível com os diversos programas educacionais da UNESCO – em especial com a proposta da educação ao longo da vida toda.
4. A Educação Focada nas Necessidades da Pessoa
O Instituto Ayrton Senna, parceiro da UNESCO há vários anos, em especial, ultimamente, através de sua Cátedra UNESCO de Educação e Desenvolvimento Humano, tem uma visão da natureza da educação muito próxima dessa poeticamente expressa pelo professor Antonio Carlos Rodrigues de Moraes, de Campinas. Concebida e desenvolvida por outro professor Antonio Carlos, este recentemente falecido, Antonio Carlos Gomes da Costa, de Belo Horizonte, a visão da educação do Instituto Ayrton Senna é como processo de desenvolvimento humano. É essa visão que dá nome à Cátedra.
Inspirado nas idéias de desenvolvimento humano propostas, defendidas e praticadas por órgãos da Organização das Nações Unidades, especialmente o UNDP/PNUD e a UNESCO, e nas ideias seminais de Mahbub ul Haq [4] e Amartya Sen [5], Antonio Carlos Gomes da Costa ajudou Viviane Senna a conceber o ideário do Instituto Ayrton Senna de modo a dar forma à noção de educação como processo de desenvolvimento humano. Para tanto usou principalmente o Paradigma do Desenvolvimento Humano, de Mahbub ul Haq, os Relatórios de Desenvolvimento Humano – RDH [6], publicados anualmente, desde 1990, que incluem e fundamentam o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH [7], ambos do UNDP/PNUD [8], o livro mencionado de Amartya Sen, e os Quatro Pilares da Educação do Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, publicado no Brasil sob o título Educação: Um Tesouro a Descobrir [9].
O ideário do Instituto pode ser resumido nestes postulados básicos:
- Se comparado com os bebês de algumas outras espécies animais, o bebê humano, ao nascer, parece totalmente despreparado para a vida, pois não nasce com capacidades que lhe permitam, desassistido, sobreviver.
- O bebê humano nasce, entretanto, com uma incrível capacidade de aprender e com um conjunto de potenciais que constitui o verdadeiro “tesouro a descobrir”, e, uma vez descoberto, a desenvolver através da capacidade de aprender que ele tem.
- Conquanto a quantidade e a mistura de potenciais a serem desenvolvidos pela aprendizagem e transformados em talentos naturais e competências adquiridas sejam únicos em cada um, é possível organizá-los em categorias que correspondem aos Pilares da Educação da UNESCO, a saber:
- Competências voltadas para o desenvolvimento de cada um enquanto pessoa, isto é, enquanto ser humano individual e único: Aprender a Ser
- Competências voltadas para o desenvolvimento de cada um enquanto cidadão, isto é, enquanto pessoa que precisa conviver com outras pessoas: Aprender a Conviver, Aprender a Viver Junto
- Competências voltadas para o desenvolvimento de cada um enquanto trabalhador, profissional, empreendedor, isto é, enquanto pessoa que precisa, agir, realizar, trabalhar: Aprender a Fazer
- Competências voltadas para o desenvolvimento de formas de expandir e aperfeiçoar as maneiras de aprender a ser, aprender a conviver e aprender a fazer: Aprender a Conhecer / Saber / Aprender
- As competências envolvidas nesses diversos aprenderes abrangem não apenas os aspectos geralmente designados como cognitivos da existência e da atividade humana mas também os aspectos relacionados com as emoções, a afetividade, a sensibilidade, a tomada de decisão, a força de vontade, a persistência, a resiliência, a paciência, a capacidade de postergar gratificações, etc., que, em geral, não se consideram cognitivos e que, frequentemente são mais responsáveis pelo sucesso e pela realização na vida pessoal, social e profissional.
- As competências precisam encontrar oportunidades e condições para se desenvolver adequada e plenamente, sendo educativa aquela sociedade que provê oportunidades e condições, se não iguais, equivalentes de desenvolvimento para todos os seus membros.
- Embora a escola continue a representar uma via importante para o desenvolvimento humano, uma sociedade verdadeiramente educativa no Século XXI se valerá também de outras vias para esse desenvolvimento, que em determinadas situações e circunstâncias podem ser tão eficazes quanto a escola, como, por exemplo, o esporte, a arte, os meios de comunicação, a tecnologia [10].
- No trabalho com a educação escolar e com as outras vias de desenvolvimento humano mencionadas, é preciso buscar uma educação personalizada, procurando encontrar, para cada criança, aquele ponto de confluência entre, de um lado, seus talentos naturais e seus dons (aquilo que de certa maneira lhe é dado), e, de outro lado, o seu sonho, a sua paixão, o seu projeto de vida, pois somente quando esses dois compoenentes de encontram o ser humano encontrará realização pessoal, social e profissional [11].
5. É Possível Compatibilizar Essas Visões?
É possível compatibilizar essas duas visões da educação? Ou é viável trabalhar numa visão de educação como desenvolvimento humano enquanto a maioria das instituições educacionais da sociedade trabalha com um paradigma diferente?
É difícil compatibilizá-las – mas é possível desenvolver pontos de contato.
Em primeiro lugar, apesar de a maior parte de escolas de fato adotar uma prática pedagógica bem próxima do modelo durkheimiano, o discurso pedagógico vem se alterando na direção de um um discurso bem próximo do ideário do IAS.
Em segundo lugar, a Constituição Federal [12] e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional [13] enfatizam uma educação que abrange não só o cidadão e o profissional, mas também a pessoa, concepção que se aproxima de três dos elementos básicos dos Quatro Pilares [14].
Em terceiro lugar, popularizam-se discursos que enfatizam, de um lado, a Educação para a Cidadania e, de outro, a Educação para a Economia Digital do Conhecimento, tornando esses dois os pilares mais bem aceitos (embora não pelos mesmos grupos).
Em quarto lugar, o movimento em favor do foco no desenvolvimento, através da escola, das chamadas Competências do Século XXI acabou por popularizar o discurso das competências já introduzido nos Parâmetros Curriculares Nacionais (embora a popularização do discurso tenha sido alcançada em cima de uma certa vagueza e ambiguidade no conceito).
Em quinto lugar, há uma quase unanimidade a favor da metodologia de projetos de aprendizagem (embora a unidade esconda uma enorme diversidade no entendimento do que essa metodologia implica).
As ideias a seguir descritas são inovadoras. Sua aceitação por parte da escola implica, em muitos casos, mudanças significativas na prática pedagógica até aqui adotada:
a) A ideia de que mesmo na educação escolar é preciso focar a educação plena e integral, não privilegiando apenas os aspectos cognitivos;
b) A ideia de que a educação deve levar seriamente o projeto de vida de cada um, assim personalizando o seu foco;
c) A ideia de que competências, ou seja, capacidades e saber-fazeres, são mais importantes do que meros saberes, e que o currículo, por conseguinte, deve ser organizado em termos de uma matriz multidimensional de competências voltadas para a vida, e direcionado mais para a aprendizagem do que para o ensino do professor;
d) A ideia de que a metodologia de projetos de aprendizagem deve partir de escolhas dos alunos e ser ativa, ancorada na pesquisa e na investigação, orientada para a solução de problemas, e claramente focada no desenvolvimento de competências;
e) A ideia de que a avaliação é um processo constante que se baseia na observação, na interação e no diálogo de vários agentes, entre os quais os próprios alunos.
6. Conclusão
É por isso que defendo o ponto de vista de que educação é sinônimo de desenvolvimento humano – desenvolvimento, no caso, das pessoas, dos indivíduos (não, em um primeiro plano, da sociedade, da cultura, da economia).
Seu objetivo basilar, como disse no início, é duplo:
- de um lado, criar oportunidades para que as pessoas possam desenvolver ao máximo as suas potencialidades;
- de outro, ajuda-las a desenvolver as competências necessárias para elaborar um projeto de vida responsável e transformá-lo em realidade, assim valendo-se das oportunidades existentes para viver uma vida que as satisfaça e realize.
O desenvolvimento social, cultural e econômico é um resultado, não um objetivo basilar desse processo.
A escola, e sua relação com as demais instituições que se ocupam da educação, deve ter sua função definida no bojo de uma concepção abrangente de educação como esta.
Focar apenas da escola, num contexto que privilegia outros canais ou outras vias de desenvolvimento humano (como os meios de comunicação e as redes sociais mediadas pela tecnologia), é, mais uma vez, adotar uma perspectiva parcial, segmentada, destinada ao fracasso. A escola é importante, mas precisa ser inserida no contexto mais amplo dos diversos e variados ambientes de aprendizagem que hoje podem ser forças poderosas na direção de uma educação que contribui para o desenvolvimento humano pleno ou integral e para a aprendizagem ao longo da vida, vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana, cinquenta e duas semanas por ano.
Como este trabalho foi originalmente apresentado em um encontro organizado pela UNESCO, concluo chamando a atenção para algumas questões relacionadas à evolução da postura da UNESCO na área da educação.
Valho-me, para isso, de um artigo importante de Rosa María Torres, educadora equatoriana, diretora do Instituto Fronesis. O artigo tem o título de (traduzindo do correspondente em Inglês) “Aprendizagem ao Longo da Vida: indo além de Educação para Todos” e foi apresentado primeiro como conferência principal no Fórum Internacional sobre Aprendizagem ao Longo da Vida que se realizou em Shanghai, na China, entre 19 e 21 de maio de 2010.
O texto discute sutis diferenças de ênfase entre dois movimentos iniciados pela UNESCO nos últimos anos, Educação para Todos e Aprendizagem ao Longo da Vida. Ao propor a discussão do tema Aprendizagem ao Longo da Vida, afirma a autora, a UNESCO mudou o foco da discussão na área da educação nos seguintes aspectos.
Em primeiro lugar, fala-se agora em aprendizagem, não em educação. Com isso parece que a importância da distinção entre aprendizagem formal (escolar) e aprendizagem não-formal (não-escolar) é reduzida, pois se trata, em ambos os casos, igualmente de aprendizagem. Assim, a escola deixa de ser o foco exclusivo de atenção, pois se reconhece o papel, na aprendizagem, também da família, da comunidade, dos meios de comunicação e acesso à informação, da vida profissional, e das atividades culturais e de lazer, viabilizadas ou não pela tecnologia – como bem já o colocava Jacques Delors, no prefácio de 1996 ao relatório publicado no Brasil como Educação: Um Tesouro a Descobrir.
(A propósito, um parêntese. É curioso que, em sua edição original em inglês, o relatório da Comissão de Jacques Delors tem o título de Learning: The Treasure Within. Por que os tradutores brasileiros substituíram “Learning”, que deve ser traduzido como “Aprendizagem”, por “Educação” é algo sobre que só se pode especular – especialmente porque “Aprendizagem” é uma palavra acima de qualquer suspeita. Outra mudança sutil é a tradução de “Within”, “Dentro”, por “A Descobrir”. Um tesouro a descobrir sugere algo que está fora da pessoa e que ela pode encontrar, como numa caça ao tesouro. Um tesouro dentro sugere que o tesouro está dentro da pessoa e precisa ser buscado ali… Por fim, os tradutores traduziram “The Treasure”, “O Tesouro”, por “Um Tesouro”…).
Em segundo lugar, na argumentação de Rosa María Torres, enfatiza-se agora o fato de que a aprendizagem tem lugar ao longo da vida toda, desde o nascimento da pessoa até a sua morte. Com isso parece que a importância da aprendizagem que acontece na educação básica escolar é relativizada, passando a receber ênfase comparável à que é dada à educação de jovens e adultos, à educação técnica, tecnológica e profissional, ao que se chamava anteriormente de educação de adultos, às diversas formas de aprendizagem decorrentes de programas de educação continuada (mesmo os que têm lugar no contexto do trabalho), ao e-learning corporativo, e, por que não, até mesmo ao ensino superior (graduação e pós-graduação). Tudo isso está incluído em Aprendizagem ao Longo da Vida – e tudo isso está fora da educação básica oferecida pela escola.
Pessoalmente, considero essas mudanças sutis destacadas por Rosa María Torres um grande e bem-vindo avanço – mas esse avanço só torna as metas que a UNESCO se propõe alcançar ainda mais difíceis. (Tudo aquilo que, não sendo natural, como o ar que respiramos, é para todos, não resta dúvida que é difícil – em especial aprendizagem de qualidade para todos ao longo de toda a sua vida).
Termino com uma frase de Ivan Illich, em seu livro Sociedade sem Escolas (Deschooling Society), de 1971 (quarenta anos atrás este ano): “A educação para todos”, afirma ele ao chegar próximo do final do primeiro capítulo, “é, necessariamente, a educação por todos”.
São Paulo, 20 de Maio de 2011
NOTAS
[1] Business Week, 4 de Dezembro de 2006, p.64.
[2] Jacques Delors, Prefácio a Educação: Um Tesouro a Descobrir (UNESCO, MEC, Cortez Editora, São Paulo, 1997, 2ª edição 1999), p.12. Esse livro é a tradução brasileira de Learning: The Treasure Within (UNESCO, Paris, 1996), feita por José Carlos Eufrázio, que é a publicação em livro do Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, coordenada por Jacques Delors, 1991.
[3] Cf. op.cit., pp. 11,18.
[4] Mahbub ul Haq é, sem sombra de dúvida, o pai da noção de desenvolvimento humano que veio a ser adotada pelo PNUD. Ele conta, em seu livro Reflections on Human Development (Oxford University Press, New York, 1995), nos Capítulos 1 e 2, a história do surgimento do Paradigma do Desenvolvimento Humano (pp. 1-12 [“The Missing People in Development Planning”] e 13-23 [“The Human Development Paradigm”], e, no Capítulo 3 (pp. 24-45 [“The Advent of the Human Development Report”]), a história do surgimento dos Relatórios de Desenvolvimento Humano.
[5] Nesse contexto a obra mais importante de Amartya Sen é Desenvolvimento como Liberdade, tradução de Development as Freedom (Random House, New York, 1999 [encadernada], 2000 [brochura]) feita por Laura Teixeira Motta, revisão técnica de Ricardo Doninelli Mendes (Companhia das Letras e Instituto Ayrton Senna, São Paulo, 2000, 2002).
[6] Em Inglês, Human Development Reports– HDR.
[7] Em Inglês, Human Development Index – HDI. Vide os sites do PNUD, respectivamente, em Inglês, em Português, e sobre o Brasil nos seguintes endereços: http://www.undp.org/, http://www.br.undp.org, http://www.undp.org.br/. Vide, porém, especialmente, o site, em Inglês, dos Relatórios de Desenvolvimento Humano, no endereço http://hdr.undp.org/reports/default.cfm, em que se pode encontrar o texto completo dos vários Relatórios, em formato pdf. Os Relatórios são, na verdade, encomendados pelo PNUD a uma equipe independente de especialistas. Cada um dos Relatórios tem um tema principal.
[8] Em Inglês, United Nations Development Programme – UNDP.
[9] Op.cit.. No livro em Português, a discussão dos “Quatro Pilares” ocupa todo o quarto capítulo, pp. 89-102. É interessante notar que o título do relatório publicado em Inglês fala em “Learning” (Aprendizagem), enquanto a tradução portuguesa fala em “Educação”. Talvez de forma não-intencional, a mudança do título na tradução portuguesa dá a entender (corretamente) que a educação tem mais que ver com a aprendizagem do que com o ensino.
[10] Cp. a referência a Jacques Delors citada atrás.
[11] Sir Ken Robinson, educador britânico atualmente residindo nos Estados Unidos, publicou, em 2009, um livro com o título de The Element: How Finding your Passion Changes Everything (O Elemento: Como sua Vida Pode Mudar se Você Encontrar sua Paixão). O termo “paixão”, no título, não se refere, naturalmente, a amor romântico, mas, sim, àquilo que uma pessoa realmente gosta de fazer, aquilo que a faz vibrar, aquilo que lhe dá prazer sustentável – aquilo que ela faria por puro prazer, mesmo que ninguém lhe pagasse nada para fazê-lo. O que Sir Ken Robinson chama de “elemento” é o ponto em que nossos talentos naturais ou dons e nossa paixão convergem e finalmente se misturam. Quando o encontramos, estamos naquilo que ele chama de nosso elemento.
[12] Eis o que diz o artigo 205 da Constituição Brasileira de 1988: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa [Aprender a Ser], seu preparo para o exercício da cidadania [Aprender a Conviver] e sua qualificação para o trabalho [Aprender a Fazer]” (ênfases acrescentadas).
[13] O artigo segundo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394 de 20 de Dezembro de 1996) diz quase a mesma coisa: “A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando [Aprender a Ser], seu preparo para o exercício da cidadania [Aprender a Conviver] e sua qualificação para o trabalho [Aprender a Fazer]” (ênfases novamente acrescentadas). A redação da Constituição certamente é preferível, ao fazer referência ao desenvolvimento da pessoa (e não do “educando”).
[14] É importante registrar que o “desenvolvimento da pessoa” [Aprender a Ser] tem sido esquecido em muito do que vem se escrevendo sobre a educação a partir da formulação dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Nessa literatura, a educação é vista basicamente como um processo de, como se verá, formação do cidadão, ou, na melhor das hipóteses, de formação da pessoa para a cidadania, ou, então, de formação do profissional que irá atuar na Economia Digital do Conhecimento.
Transcrito aqui em 15 de Maio de 2014