A Idiotice do Protecionismo (especialmente no caso dos vinhos)

A temporada parece estar aberta para a indústria brasileira pedir proteção ao governo e para o governo tomar medidas protecionistas.

Isso é um desastre total e absoluto para os consumidores, como nós, e para aqueles cujos empregos estão vinculados à importação.

Para os consumidores, essa temporada representa produtos estrangeiros mais caros — ou desaparecimento deles, em virtude da proteção do governo brasileiro aos produtos nacionais.

Será que não aprendemos nada com a reserva de mercado de informática? Será que ninguém se lembra de quando tínhamos de comprar computadores vindos no mercado negro do Paraguai porque ninguém conseguia comprar os produtos nacionais, pelo seu preço exorbitante?

O que as vinícolas nacionais querem, para dar apenas um exemplo, é poder cobrar mais pelos seus vinhos ruins do que nós pagamos pelos vinhos bons dos chilenos e dos argentinos de Mendoza.

Como consumidor regular dos vinhos chilenos, argentinos e portugueses, EU PROTESTO.

Se as vinícolas brasileiras não conseguem produzir vinhos tão bons quanto os estrangeiros por preços comparáveis aos destes no mercado nacional (com Imposto de Importação, frete, e tudo), que fechem as portas.

Lembro-me dos seguintes exemplos.

Um vinho chileno razoável como Casillero del Diablo custa aqui no Brasil cerca de 30 reais a garrafa. Já é um preço caríssimo. Em Londres (muito mais longe do Chile do que o Brasil) paguei por ele 4,50 libras. Os produtores nacionais querem que esse vinho fique ainda mais caro no mercado nacional para que a gente se veja forçado a comprar os vinhos que eles produzem, piores, por esse preço…

O Periquita padrão de Portugal custa aqui também cerca de 30 reais. Em Portugal, local em que é feito, custa também 4,50 — agora euros, não libras.

O preço mais caro desses vinhos estrangeiros no mercado nacional, em relação ao preço que têm em outros países, já é caro por causa principalmente dos impostos brasileiros.

As vinícolas brasileiras, sabedoras de que governo gosta de cobrar mais imposto, pede que o governo aumente os impostos sobre os vinhos estrangeiros.

Os únicos que ganham com esse tipo de protecionismo (impostos mais altos para os importados, ou mesmo as absurdas cotas de importação) são o governo e os produtores nacionais de vinho. Por isso a Miolo e a Casa Valduga tão tentando descolar esse beneficiozinho (que não passa de prejuizão para nós).

Os consumidores brasileiros só se ferram. Terão de pagar mais caro pelo produto que normalmente consomem — ou pagar o mesmo preço por um produto nacional inferior.

BASTA. Vamos nos unir nessa campanha. Boicote aos vinhos da Miolo e da Casa Valduga — e aos de qualquer produtor nacional de vinho que estejam apoiando restrições aos importados.

Em São Paulo, 4 de Abril de 2012

Outono

O Outono começa hoje, pelo que consta. É minha estação favorita.

Talvez porque, por não gostar de calor, sinto um grande alívio ao constatar que a temperatura começa a esfriar: entramos na reta em direção ao Inverno.

Talvez também porque, depois de viver vários anos no Hemisfério Norte, me acostumei a identificar o Outono com a combinação das lindas cores das folhas das árvores: amarelo, vermelho, roxo, marrom quase.

Ou, talvez, porque o Outono represente, depois da irresponsabilidade da Primavera e da exuberância do Verão, o tempo da culminância do amadurecimento — da idade mais que adulta…

A Primavera seria a adolescência, o Verão a idade adulta, o Outono a idade madura, mais que simplesmente adulta, o Inverno a velhice que chega fria e inexorável, prenunciando o fim.

Bom Outono a todos — inclusive, e especialmente, aos adolescentes.

Em São Paulo, 20 de Março de 2012

“Criança, não verás nenhum país como este!”

Consta que De Gaulle teria dito que o Brasil não é um país sério. Estava certo ele. Vejam só o que descobri hoje (19/3/2012).

Para ligar para um telefone celular a partir de um telefone fixo Net Fone brasileiro (da Net, via Embratel), no Plano “Fale do Seu Jeito” (sem assinatura e franquia, pagando apenas pelo tempo que se fala em cada tipo de ligação), custa, POR MINUTO:

* Se o celular chamado estiver nos Estados Unidos, R$ 0,69220 (menos de 70 centavos de real por minuto).

* Se o celular chamado estiver em qualquer outro país do mundo, R$ 1,15608 (um pouco mais de um real e 15 centavos por minuto).

* Se o celular chamado estiver no Brasil, em DDD diferente daquele de onde a chamada se origina, R$ 1,76831 (quase dois reais por minuto).

Ou seja, nessas circunstâncias, falar de um Net Fone em São Paulo com um celular em São José dos Campos, Santos, Sorocaba ou Campinas custa 2,55 vezes o preço que custa falar com um celular nos Estados Unidos e 1,53 vezes o preço que custa falar com um celular em qualquer outro país do mundo.

“Criança, não verás nenhum país como este!” (Olavo Bilac).

Em São Paulo, 19 de Março de 2012

O Português dos Jornalistas

Ouvido na CBN nos últimos dias:

“Havia duas milhões e quatrocentas mil pessoas…”.

“A ocorrência foi registrada no Quarenta Distrito Policial”.

Será que ela diria que, no ano passado, houve duas milhões de ocorrências registradas no Um Distrito Policial?

Em São Paulo, 5 de Março de 2012

Censura

Muitas pessoas criticam meios de comunicação privados por defenderem determinados pontos de vista e não darem espaço, ou pelo menos espaço considerado pelos críticos suficiente ou comparável, para pontos de vista opostos, conflitantes, ou divergentes. Dizem, quando isso acontece, que os referidos meios de comunicação estão praticando a censura.

Como liberal laissez-faire que sou, defendo a tese de que o dono (singular ou coletivo) de um meio de comunicação privado tem o direito — quiçá até mesmo a obrigação — de ser partidário (partisan), isto é, de tomar partido nas questões por ele consideradas importantes, e de defender seus pontos de vista, sempre de maneira justa, mas nem por isso pouco ardorosa. Afinal de contas, o empreendimento é dele, é ele que o mantém, é ele que corre o risco de oportunamente perder dinheiro e até mesmo quebrar… Logo, o meio de comunicação pode e deve ser usado para promover seus interesses — e não o dos defensores de pontos de vista opostos, conflitantes ou divergentes. Ao fazer isso, ele não está censurando ninguém — e por uma razão muito simples: ele não tem como calar a voz de quem discorda ou difere de seus pontos de vista, pois basta que eles criem seus próprios meios de comunicação para fazer sua voz ouvida. Ninguém, em última instância, tem (ou mesmo pode ter) a obrigação de usar seu próprio dinheiro para promover pontos de vista de que discorda. Isso não é censura. É exercício do direito inerente a uma propriedade privada.

Dentro dessa visão liberal clássica, aquilo que se pode legitimamente chamar de censura é algo que inevitavelmente é feito, e só pode ser feito, pelo governo. Se o governo proíbe a disseminação de algum ponto de vista, disseminar esse ponto de vista se torna crime (o delito de opinião). Neste caso, não há como alguém possa ter acesso a essa opinião sem que alguém cometa o crime de desobedecer o ditame governamental.

Instituições privadas não têm esse poder. Um jornal como a Folha de S. Paulo, pode, por política editorial, se recusar a dar divulgação, ou pelo menos destaque, a alguns pontos de vista de que o jornal discorda. Isso não é censura, porque outros órgãos de imprensa podem (isto é, não estão proibidos por lei de) adotar outras políticas editoriais que permitam a divulgação dos pontos de vista que a um outro meio de comunicação se refusa a divulgar.

Assim, ninguém sai perdendo. Na verdade, todo mundo ganha com a transparência de um meio de comunicação que diz claramente o que seu dono (individual ou coletivo) pensa. Pode ser, por exemplo, favorável ou contra o aborto, ou o homossexualismo, ou um determinado partido ou candidato político. É seu direito. Mais do que isso: é seu dever. E isso não apenas nos editoriais.

A maior parte dos meios de comunicação no nosso país felizmente são (devo dizer ainda?) privados e relativamente livres. No entanto, temos no Brasil essa excrescência que são meios de comunicação oficiais: a Voz do Brasil e as emissoras de rádio e TV estatais, como a TV Brasil. Só país autoritário tem isso.

Se alguém não gosta da linha editorial da Folha de S. Paulo (por exemplo), ou se acha que a Folha é incoerente com o que manda o seu próprio Manual de Redação, que leia outro jornal. Ou que crie o seu próprio jornal, ainda que na Internet, e desça o porrete na Folha de S. Paulo. É seu direito.

Na minha opinião, nossa energia deveria estar sendo dirigida contra os meios de comunicação oficiais. Enquanto tivermos uma imprensa livre (pelo menos relativamente falando), os meios de comunicação do governo não causam dano maior: as pessoas simplesmente não os sintonizam, porque preferem a novela das 21 à doutrinação petista. O pior é quando a gente ficar parecido com a Venezuela, ou, Deus nos livre e guarde, com Cuba…

Em São Paulo, 2 de Março de 2012

Resultados do Oscar 2012

(*** indicam o ganhador)

Melhor Fotografia

Emmanuel Lubezki
de “A Árvore da Vida”

Guillaume Schiffman
de “O Artista”

Janusz Kaminski
de “Cavalo de Guerra”

Jeff Cronenweth
de “Millennium – Os Homens que Não Amavam as Mulheres”

Robert Richardson
de “A Invenção de Hugo Cabret”  ***

Melhor Direção de Arte

Anne Seibel e Hélène Dubreuil
de “Meia-Noite em Paris”

Dante Ferretti e Francesca Lo Schiavo
de “A Invenção de Hugo Cabret”  ***

Laurence Bennett e Robert Gould
de “O Artista”

Rick Carter e Lee Seales
de “Cavalo de Guerra”

Stuart Craig e Stephenie McMillan
de “Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 2”

Melhor Figurino

Arianne Phillips
de “W.E.”

Lisy Christl
de “Anonymous”

Mark Bridges
de “O Artista”  ***

Michael O’Connor
de “Jane Eyre”

Sey Powell
de “A Invenção de Hugo Cabret”

Melhor Maquiagem

Edouard F. Henriques, Gregory Funk e Yolea Toussieng
de “Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 2”

Mark Coulier e J. Roy Helle
de “A Dama de Ferro” ***

Martial Corneville, Lynn Johnston e Matthew W. Mungle
de “Albert Nobbs”

Melhor Filme Estrangeiro

“A Separação”
de Asghar Farhadi (Irã)  ***

“Bullhead”
de Michael R. Roskam (Bélgica)

“Footnote”
de Joseph Cedar (Israel)

“In Darkness”
de Agnieszka Holland (Polônia)

“Monsieur Lazhar”
de Philippe Falardeau (Canadá)

Melhor Atriz Coadjuvante

Bérénice Bejo
por “O Artista”

Janet Mcteer
por “Albert Nobbs”

Jessica Chastain
por “Histórias Cruzadas”

Melissa McCarthy
por “Missão Madrinha de Casamento”

Octavia Spencer
por “Histórias Cruzadas” ***

Melhor Edição

Anne-Sophie Bion e Michel Hazanavicius
de “O Artista”

Christopher Tellefsen
de “O Homem que Mudou o Jogo”

Kevin Tent
de “Os Descendentes”

Kirk Baxter e Angus Wall
de “Millennium – Os Homens que Não Amavam as Mulheres” [The Girl with            the Golden Tatoo]***

Thelma Schoonmaker
de “A Invenção de Hugo Cabret”

Melhor Edição de Som

Ethan Van der Ryn e Erik Aadahl
de “Transformers: O Lado Oculto da Lua”

Lon Bender e Victor Ray Ennis
de “Drive”

Philip Stockton e Eugene Gearty
de “A Invenção de Hugo Cabret” ***

Ren Klyce
de “Millennium – Os Homens que Não Amavam as Mulheres”

Richard Hymns e Gary Rydstrom
de “Cavalo de Guerra”

Melhor Mixagem de Som

David Parker, Michael Semanick, Ren Klyce e Bo Persson
de “Millennium – Os Homens que Não Amavam as Mulheres”

Deb Adair, Ron Bochar, Dave Giammarco e Ed Novick
de “O Homem que Mudou o Jogo”

Gary Rydstrom, Andy Nelson, Tom Johnson e Stuart Wilson
de “Cavalo de Guerra”

Greg P. Russell, Gary Summers, Jeffrey J. Haboush e Peter J. Devlin
de “Transformers: O Lado Oculto da Lua”

Tom Fleischman e John Midgley
de “A Invenção de Hugo Cabret” ***

Melhor Documentário

“Hell and Back Again”
de Danfung Dennis e Mike Lerner

“If a Tree Falls: A Story of the Earth Liberation Front”
de Marshall Curry e Sam Cullman

“Paradise Lost 3: Purgatory”
de Charles Ferguson e Audrey Marrs

“Pina”
de Wim Wenders e Gian-Piero Ringel

“Undefeated”   ***
de TJ Martin, Dan Lindsay e Richard Middlemas

Melhor Animação

“Rango” ***
de Gore Verbinski

“Gato de Botas” [Puss in Boots]
de Chris Miller

“Kung Fu Panda 2”
de Jennifer Yuh

“Chico e Rita”
de Tono Errando, Javier Mariscal e Fernando Trueba

“Um Gato em Paris”
de Alain Gagnol e Jean-Loup Felicioli

Melhores Efeitos Visuais

Erik Nash, John Rosengrant, Dan Taylor e Swen Gillberg
de “Gigantes de Aço”

Joe Letteri, Dan Lemmon, R. Christopher White e Daniel Barrett
de “Planeta dos Macacos: A Origem”

Rob Legato, Joss Williams, Ben Grossman e Alex Hennemg
de “A Invenção de Hugo Cabret”  ***

Scott Farrar, Scott Benza, Matthew Butler e John Frazier
de “Transformers: O Lado Oculto da Lua”

Tim Burke, David Vickery, Greg Butler e John Richardson
de “Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 2”

Melhor Ator Coadjuvante

Christopher Plummer  ***
por “Toda Forma de Amor”

Jonah Hill
por “O Homem que Mudou o Jogo”

Kenneth Branagh
por “Sete Dias com Marilyn”

Max Von Sydow
por “Tão Forte e Tão Perto”

Nick Nolte
por “Guerreiro”

Melhor Trilha Sonora Original

Alberto Iglesias
por “O Espião que Sabia Demais”

Howard Shore
por “A Invenção de Hugo Cabret”

John Williams
por “As Aventuras de Tintim”

John Williams
por “Cavalo de Guerra”

Ludovic Bource  ***
por “O Artista”

Melhor Canção Original

“Man or Muppet”  ***
de “Os Muppets”

“Real in Rio”
de “Rio”

Melhor Roteiro Adaptado

Alexander Payne, Nat Faxon e Jim Rash
por “Os Descendentes”  ***

Bridget O’Connor e Peter Straughan
por “O Espião que Sabia Demais”

George Clooney, Grant Heslov, Beau Willimon
por “Tudo pelo Poder”

John Logan
por “A Invenção de Hugo Cabret”

Steven Zaillian e Aaron Sorkin
por “O Homem que Mudou o Jogo”

Melhor Roteiro Original

Annie Mumolo e Kristen Wiig
por “Missão Madrinha de Casamento”

Asghar Farhadi
por “A Separação”

J.C. Chandor
por “Margin Call – O Dia Antes do Fim”

Michel Hazavanicius
por “O Artista”

Woody Allen   ***
por “Meia-Noite em Paris”

Melhor Curta Metragem

“Pentecost”
de Peter McDonald e Eimear O’Kane

“Raju”
de Max Zähle e Stefan Gieren

“The Shore”  ***
de Terry George e Oorlagh George

“Time Freak”
de Andrew Bowler e Gigi Causey

“Tuba Atlantic”
de Hallvar Witzø

Melhor Documentário Curta Metragem

“God Is the Bigger Elvis”
de Rebecca Cammisa e Julie Anderson

“Incident in New Baghdad”
de James Spione

“Saving Face”  ***
de Daniel Junge e Sharmeen Obaid-Chemoy

“The Barber of Birmingham: Foot Soldier of the Civil Rights Movement”
de Robem Fryday e Gail Dolgin

“The Tsunami and the Cherry Blossom”
de Lucy Walker e Kira Carstensen

Melhor Curta de Animação

“Dimanche/Sunday”
de Patrick Doyon

“The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore”  ***
de William Joyce e Breon Oldenburg

“La Luna”
de Enrico Casarosa

“A Morning Stroll”
de Grant Orchard e Sue Goffe

“Wild Life”
de Amanda Forbis e Wendy Tilde

Melhor Diretor

Alexander Payne por
“Os Descendentes”

Martin Scorsese por
“A Invenção de Hugo Cabret”

Michel Hazanavicius por
“O Artista” ***

Terrence Malick por
“A Árvore da Vida”

Woody Allen por
“Meia-Noite em Paris”

Melhor Ator

Brad Pitt
por “O Homem que Mudou o Jogo”

Demian Bichir
por “A Better Life”

Gary Oldman
por “O Espião que Sabia Demais”

George Clooney
por “Os Descendentes”

Jean Dujardin
por “O Artista” ***

Melhor Atriz

Glenn Cose
por “Albert Nobbs”

Meryl Streep  ***
por “A Dama de Ferro”

Michelle Williams
por “Sete Dias com Marilyn”

Rooney Mara
por “Millennium – Os Homens que Não Amavam as Mulheres”

Viola Davis
por “Histórias Cruzadas”

Melhor Filme

“O Artista” [The Artist] ***
Dirigido por Michel Hazanavicius

“A Árvore da Vida” [The Tree of Life]
Dirigido por Terrence Malick

“Cavalo de Guerra” [War Horse]
Dirigido por Steven Spielberg

“Os Descendentes” [The Descendants]
Dirigido por Alexander Payne

“Histórias Cruzadas” [The Help]
Dirigido por Tate Taylor

“O Homem que Mudou o Jogo” [Moneyball]
Dirigido por Bennett Miller

“A Invenção de Hugo Cabret” [Hugo]
Dirigido por Martin Scorsese

“Meia-Noite em Paris” [Midnight in Paris]
Dirigido por Woody Allen

“Tão Forte e Tão Perto” [Extremely Loud and Incredibly Close]
Dirigido por Stephen Daldry

IN ENGLISH:

Best Motion Picture of the Year

Winner: The Artist (2011) – Thomas Langmann

Best Performance by an Actress in a Leading Role

Winner: Meryl Streep for The Iron Lady (2011)

Best Performance by an Actor in a Leading Role

Winner: Jean Dujardin for The Artist (2011)

Best Achievement in Directing

Winner: Michel Hazanavicius for The Artist (2011)

Best Short Film, Animated

Winner: The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore (2011) – William Joyce,Brandon Oldenburg

Best Documentary, Short Subjects

Winner: Saving Face (2012) – Daniel Junge, Sharmeen Obaid-Chinoy

Best Short Film, Live Action

Winner: The Shore (2011) – Terry George, Oorlagh George

Best Writing, Screenplay Written Directly for the Screen

Winner: Midnight in Paris (2011) – Woody Allen

Best Writing, Screenplay Based on Material Previously Produced or Published

Winner: The Descendants (2011) – Alexander Payne, Nat Faxon, Jim Rash

Best Achievement in Music Written for Motion Pictures, Original Song

Winner: The Muppets (2011) – Bret McKenzie(“Man or Muppet”)

Best Achievement in Music Written for Motion Pictures, Original Score

Winner: The Artist (2011) – Ludovic Bource

Best Performance by an Actor in a Supporting Role

Winner: Christopher Plummer for Beginners (2010)

Best Achievement in Visual Effects

Winner: Hugo (2011/II) – Robert Legato, Joss Williams, Ben Grossmann, Alex Henning

Best Animated Feature Film of the Year

Winner: Rango (2011) – Gore Verbinski

Best Documentary, Features

Winner: Undefeated (2011) – Daniel Lindsay, T.J. Martin, Rich Middlemas

Best Achievement in Sound Mixing

Winner: Hugo (2011/II) – Tom Fleischman, John Midgley

Best Achievement in Sound Editing

Winner: Hugo (2011/II) – Philip Stockton, Eugene Gearty

Best Achievement in Editing

Winner: The Girl with the Dragon Tattoo (2011) – Angus Wall, Kirk Baxter

Best Performance by an Actress in a Supporting Role

Winner: Octavia Spencer for The Help (2011)

Best Foreign Language Film of the Year

Winner: A Separation (2011) – Asghar Farhadi(Iran)

Best Achievement in Makeup

Winner: The Iron Lady (2011) – Mark Coulier, J. Roy Helland

Best Achievement in Costume Design

Winner: The Artist (2011) – Mark Bridges

Best Achievement in Art Direction

Winner: Hugo (2011/II) – Dante Ferretti, Francesca Lo Schiavo

Best Achievement in Cinematography

Winner: Hugo (2011/II) – Robert Richardson

Eduardo Chaves

26-27 de Fevereiro de 2012

Relativismo Cultural e Moral

Achei em meus alfarrábios digitais uma série de mensagens trocadas ao longo de Agosto de 2005 nas listas Quatro Pilares e LivreMente, das quais era (ainda sou, imagino…) coordenador, sobre a questão do relativismo cultural e moral.

O que deflagrou a troca de mensagem foi um artigo sobre Violência Doméstica de autoria de Sharon Lafraniere, do New York Times, escrito em Lagos, Nigéria, e traduzido para o Português por Clara Allain e publicado na Folha de S. Paulo de 20 de Agosto de 2005.

Vou transcrever o artigo aqui e, em seguida, a troca de mensagens a que me referi, na qual estou inevitavelmente envolvido. Prefaciei a transcrição do artigo com a seguinte mensagem, admitidamente provocadora:

“Espancar mulher é norma na Africa… E os relativistas de plantão ainda continuam a afirmar que nenhuma cultura é superior — ou inferior — às outras”.

Eis o artigo:

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Folha de S. Paulo
20 de agosto de 2005

Violência Doméstica

Na região subsaariana, onde surra pode ser “pena” por desobedecer ao marido, luta por direitos engatinha: espancar mulher é norma tácita na África

Sharon Lafraniere, 
do New York Times, em Lagos (Nigéria)

Foi uma discussão típica entre marido e mulher. Ela queria visitar seus pais, ele queria que ela ficasse em casa.

Eles resolveram a disputa de uma maneira típica — para algumas pessoas que vivem neste país, típica demais. Rosalynn Isimeto-Osibuamhe recorda o incidente, que aconteceu em dezembro de 2001. Seu marido, Emmanuel, a seguiu até a rua. Ele a espancou até ela desmaiar e então a deixou jogada na rua, perto do apartamento deles. A senhora Isimeto-Osibuamhe, que tinha 31 anos e estava casada havia cinco anos, havia ousado desobedecer a uma regra não escrita vigente nessa região do mundo: havia desafiado seu marido.

Pesquisas conduzidas em toda a África subsaariana indicam que muitos homens — e também muitas mulheres — vêem uma desobediência desse tipo como algo que justifica plenamente um espancamento.

Mas Rosalynn Isimeto-Osibuamhe, que possui diploma universitário e é fundadora de uma escola de ensino de francês, não concordava com esse padrão de violência doméstica tacitamente aceito na região.

Assim que voltou do hospital, ela fez as malas e deixou sua casa. Embora sua determinação nem sempre se mantenha firme e ela ainda não tenha se decidido pelo divórcio, ela ainda não retornou.

Em entrevista concedida diante de sua sala de aula de francês, Isimeto-Osibuamhe explicou: “Ele acha que não tenho direitos próprios. Se eu digo “não”, ele me bate. Eu falo: “Não é isso o que eu quero da vida'”.

A violência é algo que atinge as mulheres de todas as sociedades. Mas existem poucas regiões em que os abusos são mais comuns e mais largamente aceitos como tais do que a África subsaariana.

De acordo com o estudo mais recente, conduzido em 1993, uma em cada três mulheres nigerianas relatou ter sido fisicamente agredida por um parceiro homem. A mulher do vice-governador de uma Província do norte da Nigéria disse a jornalistas no ano passado que seu marido bate nela constantemente, em parte porque ela assiste a filmes na televisão.

Uma das indicadas do presidente Olusegun Obasanjo — que dirige o país desde 1999 — para integrar uma comissão nacional de combate à corrupção teria sido morta por seu marido em 2000, apenas dois dias depois de ter pedido proteção ao comissário estatal de polícia.

Obong Rita Akpan, que até o mês passado foi a ministra nigeriana dos Assuntos Femininos, declarou, em entrevista, que na Nigéria “é comum as mulheres serem tratadas por seus maridos como sacos de pancada”.

“O homem nigeriano acredita que a mulher é inferior a ele. Desde a primeira infância, os meninos têm preferência sobre as meninas. Mesmo quando os homens se casam por amor, eles ainda pensam que a mulher está abaixo deles e ainda fazem o que bem entendem”, completou Obong Akpan.

Numa pesquisa conduzida em Zâmbia em 2004 — e financiada com recursos dos EUA — quase metade das mulheres que foram entrevistadas disse ter sido espancada por seu marido ou parceiro. Trata-se da mais alta porcentagem entre nove países em desenvolvimento, em três continentes, abarcados na pesquisa.

Na África do Sul, pesquisadores do Conselho de Pesquisas Médicas estimaram no ano passado que, em média, uma namorada ou mulher é assassinada por seu parceiro a cada seis horas. Seria o maior índice de mortalidade resultante de violência doméstica jamais constatado. Um relatório das Nações Unidas concluiu no ano passado que na capital do Zimbábue, Harare, a violência doméstica é responsável por mais de seis em cada dez casos de homicídio julgados nos tribunais.

Apesar disso, segundo as organizações de defesa dos direitos das mulheres, a maioria das mulheres mantém silêncio sobre os abusos que sofre.

Um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) constatou que mais de um terço das mulheres da Namíbia relata sofrer ou ter sofrido abusos sexuais ou físicos de um parceiro homem, uma violência que muitas vezes resulta em ferimentos físicos. No entanto, seis em cada sete vítimas ou mantêm silêncio sobre os maus-tratos ou revela o que aconteceu apenas a uma amiga ou a um parente.

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Ela teve pais progressistas pelos padrões nigerianos: seu pai batia em sua mãe de vez em quando, mas também incentivou sua filha a concluir seus estudos e a trabalhar

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O motorista Kenny Adebayo não tem dúvida: “Você fala para sua mulher que ela põe muito sal na comida; todo dia a comida está salgada, todo dia; um dia você fica sentido e bate nela”

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Conta que, desde que saiu de casa, seu marido já lhe bateu uma dúzia de vezes; em uma dessas vezes, a derrubou no chão da igreja; ela se angustia, pois não sabe se ele pode mudar

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Normalmente não é fácil encontrar ajuda. Na Nigéria, o maior país africano — cuja população já se aproxima dos 130 milhões de habitantes –, existem apenas dois abrigos para mulheres que são vítimas de maus-tratos. Os dois foram abertos nos últimos quatro anos. Nos Estados Unidos, em contraste, existem cerca de 1.200 abrigos desse tipo. Além disso, muitas mulheres concordam que as transgressões de uma mulher casada justificam que o marido a espanque.

Cerca de metade das mulheres entrevistadas em Zâmbia em 2001 e 2002 disse que o marido tem o direito de bater em uma mulher que discute com ele, que queima a comida, sai sem a autorização do marido, não cuida bem dos filhos ou simplesmente se nega a fazer sexo com o marido.

Para o motorista Kenny Adebayo, 30, em Lagos, não há dúvidas. “Você fala para sua mulher que ela põe sal demais na comida. Todo dia a comida está salgada demais, todo dia, todo dia. Um dia você fica sentido e bate nela. Nós, homens africanos, odiamos ser desrespeitados.”

O código penal nigeriano que está em vigor no norte do país — onde a maioria dos habitantes professa a religião muçulmana — permite especificamente aos maridos disciplinar suas mulheres, como também autoriza que pais e professores disciplinem as crianças, desde que não lhes causem danos físicos graves.

As leis relativas à agressão física poderiam ser aplicadas, mas a polícia normalmente vê o espancamento de mulheres como exceção. Leis para punir a violência doméstica foram propostas em seis das 36 Províncias nigerianas, mas foram adotadas em apenas duas delas — o equivalente a 5% de todas as regiões administrativas do país.

As ativistas que militam na defesa dos direitos das mulheres dizem que a onipresença dos maus-tratos é um sintoma do baixo status da mulher na África subsaariana. Nessa região, as mulheres costumam ter nível de instrução inferior ao dos homens, trabalham mais horas por dia. Além disso, carregam três vezes mais peso do que os homens, transportando lenha, água e sacos de milho sobre a cabeça.

Rosalynn Isimeto-Osibuamhe não se enquadra nesse perfil padronizado. Bem falante, ostentando um corte de cabelo moderno e carregando um livro de sociologia na bolsa, ela fala em tom de voz confiante. Sua agenda é cheia de planos para os diversos projetos que ela quer empreender. “Sou uma organizadora”, afirma ela, em uma série de entrevistas. “Sou uma líder.”

Mas esse aspecto peculiar de sua formação em relação à média das mulheres de seu país não a poupou de ser espancada interminavelmente durante os oito anos que durou, de fato, seu casamento com seu marido, Emmanuel. Isimeto-Osibuamhe teve pais progressistas pelos padrões nigerianos. Seu pai batia em sua mãe de vez em quando, mas também incentivou sua filha, a mais velha dos sete filhos do casal, a concluir seus estudos e, mais tarde, a trabalhar como executiva de marketing, professora de francês e apresentadora de um programa de TV educativo em francês.

Ela tinha apenas 16 anos quando conheceu Emmanuel. Como ela, ele se formou na universidade, tornando-se contador. Esbelto e bonito, ele a estapeou apenas uma vez durante os anos de namoro deles. Isimeto-Osibuamhe achou que tinha sido um deslize, uma aberração.

Mas não foi. Hoje com 35 anos, Isimeto-Osibuamhe afirma que, desde que eles se casaram, em 1997, Emmanuel a espancou mais de 60 vezes. Ele a espancou quando ela estava grávida do filho deles, que hoje tem 6 anos. Ele atirou uma lanterna nela. Em outra ocasião, ela contou, ele segurou uma faca contra sua cabeça, enquanto um amigo implorava para que não a matasse.

Emmanuel Osibuamhe, 36, hoje afirma ter errado ao bater em sua mulher. Entretanto, durante as duas horas de entrevista que concedeu, em seu escritório, ele insistiu que Rosalynn o conduziu a isso ao provocá-lo propositadamente. Caminhando de um lado a outro da sala, ele foi ficando cada vez mais agitado, recordando como sua mulher, nas suas palavras, desafiava a sua autoridade.

“Você não pode se imaginar batendo em sua mulher?”, perguntou. “Não pode se imaginar sendo levado a esse ponto? Mas há pessoas que empurram a gente para além do que a gente é capaz de suportar. Aí você se vê fazendo coisas que não devia. Pelo amor de Deus! Você é o homem, é o chefe da casa. Você precisa ter uma família que lhe obedeça.”

Para Emmanuel Osibuamhe, isso significa aceitar que ele é o chefe da família e é quem toma as decisões finais. Também significa que todos os bens devem estar em seu nome e, afirmou, que sua mulher tem de pedir a sua autorização para poder visitar a família dela.

Quando Isimeto-Osibuamhe finalmente procurou ajuda, as pessoas que ela procurou pareciam concordar com a visão de seu marido. Ela foi à polícia. “Me disseram que não sou menininha”, ela lembrou. “Se eu não quisesse continuar casada, deveria me divorciar”, foi outro argumento que afirma ter ouvido.

Ela contou a seu sogro, que lhe respondeu que “espancar a mulher é normal”. Ela contou ao pastor da igreja, que a aconselhou a não deixar seu marido tão irritado. “Ele me disse que, seja o que fosse que meu marido dissesse, deveria aceitar.”

Isimeto-Osibuamhe finalmente encontrou apoio no Projeto Alerta para a Violência contra as Mulheres, a organização sem fins lucrativos que mantém um dos dois abrigos nigerianos. Ela passou semanas no abrigo. Escreveu um relato detalhando a violência que sofreu e o intitulou “Um grito de socorro”.

Briget Osekwe, responsável pelo programa da organização, disse que os arquivos do grupo contêm 200 casos como os de Isimeto-Osibuamhe. Mesmo algumas mulheres que são economicamente independentes, como Isimeto-Osibuamhe, disse ela, hesitam em divorciar-se de seus maridos, por temerem ser alvos de repúdio social.

“Nesta sociedade uma mulher precisa fazer tudo o que pode para fazer seu casamento dar certo”, disse Josephine Effah-Chukwuma, que criou o Projeto Alerta em 1999. “Se o casamento fracassa, a culpa cai sobre a mulher.”

Isimeto-Osibuamhe conta que, desde que saiu de casa, seu marido já lhe bateu uma dúzia de vezes. Em uma dessas vezes, a derrubou no chão da igreja. Ela se angustia porque não sabe dizer se é possível que ele mude. Ela se preocupa em saber como vai criar seu filho, que hoje vive com os avós, no caso de se divorciar. “Será que eu deveria ficar em casa por causa do menino, correndo o risco de ser morta?”, indagou. Em outro momento, porém, ela pediu à repórter que não deixasse de colocar seu sobrenome ligado ao do marido.

Isimeto-Osibuamhe encontrou uma nova maneira de extravasar seus sentimentos, criando e apresentando um programa justamente sobre violência doméstica na televisão local.

Ela conta que, depois do primeiro dia em que o programa foi ao ar, recebeu uma enxurrada de telefonemas de mulheres em situação semelhante à dela. Ela espera defender a causa dessas mulheres através de uma fundação que criou, chamada Família Feliz.

“O homem africano acha que sua mulher é um bem que lhe pertence, como um carro, um sapato — algo que ele pode pisotear”, disse Isimeto-Osibuamhe.

“Nossos homens precisam ser educados. Nossos pais, nossas mães e nossos filhos, também. Toda a nossa sociedade precisa passar por uma reforma.”

(Tradução de Clara Allain)

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O meu comentário provocador recebeu a seguinte resposta de alguém chamada Darlana, de algo chamado PET Educação, da UnB:

“O homem nigeriano acredita que a mulher é inferior a ele. Desde a primeira infância, os meninos têm preferência sobre as meninas. Mesmo quando os homens se casam por amor, eles ainda pensam que a mulher está abaixo deles e ainda fazem o que bem entendem”, completou Obong Akpan.

Considerar inferior o que é diferente é o que causa este tipo de relação….

Darlana
PET Educação UnB”

Respondi assim:

“Darlana:

(Presumo que esse nome seja de uma mulher)

O indivíduo não bate na mulher porque ele acha que ela é inferior a ele: bate porque acha que é dono dela.

Se você for para a África, se casar com um africano desses, e ele lhe descer o sarrafo diariamente, por motivos como o que a comida que você fez ficou um pouco salgada, espero que continue ainda achando as culturas todas iguais. E boa sorte. Espero que sobreviva. Vai precisar da sorte que lhe desejo.

–Eduardo”

Darlana retorquiu:

“Quem disse que ele batia na mulher por considera-la inferior foi o entrevistado da materia que você enviou…não fui eu…

E ainda acredito que essa postura de rotular as pessoas como superior e inferior é muito prejudicial a bons relacionamentos. Minha bisavó apanhou muito de meu bisavô por causa da comida mal feita… Meu marido lava, passa cozinha e limpa casa… Os tempos mudam… As pessoas mudam… Mas não me considero superior a minha bisavó… Apenas diferente.

Darlana”

Eu respondi:

“Darlana,

Se você olhar lá embaixo nesta série de mensagens, o que eu falei foi:

“E os relativistas de plantão continuam a afirmar que nenhuma cultura superior — ou inferior — às outras”.

Em nenhum momento falei que pessoas são superiores umas as outras.

Mas já que você mencionou, há um aspecto básico em que todos os seres humanos são iguais: em sua humanidade e na dignidade de que ela é merecedora — até que o ser humano se animalize.

Feita essa marcação de posição em favor de uma igualdade em dignidade, em tudo o mais os seres humanos diferem um dos outros e são superiores e inferiores uns aos outros. O Robinho é superior a mim quando se trata de jogar futebol. Eu sou superior a ele no que diz respeito a conhecimento filosófico. O Marcelo Anthony é superior a mim em aparência física (seja lá como ela for definida), o Cafu em resistência física (seja lá como ela for definida), o Gustavo Borges em altura e em capacidade natativa (se posso usar essa expressão). Negar essas coisas é afrontar a realidade.

Lastimo que sua bisavó tenha apanhado de seu bisavô por comida mal-feita. Provavelmente muitas mulheres apanhavam assim naquele tempo. E você tem sorte de viver em uma cultura em que os maridos se dispõem a lavar, passar, cozinhar e limpar a casa. Minha pergunta era: você prefere viver numa cultura como aquela em que sua bisavó vivia (ou em que as mulheres africanas vivem) ou em uma cultura como a nossa (apesar de também ter vários defeitos). Se você fizer a opção que eu imagino que você fará, você a fará porque nossa cultura, em que maridos (alguns, pelo menos) ajudam suas mulheres nos afazeres domésticos em vez de bater nelas por não realizarem esses afazeres de forma bem-feita, é superior à cultura em que vivia sua bisavó (e em que vivem as mulheres africanas).

Foi só isso que eu disse. Cuide bem de seu marido. Ele merece.

–Eduardo”

Um outro membro da lista, chamado Roberto, da Universidade Federal da Bahia, interveio na discussão:

“Eduardo, Darlana,

Os absolutistas de plantão costumam afirmar que há culturas superiores e inferiores. Esse é o primeiro passo que permite julgar culturas, estabelecer um etnocentrismo que posterioremente justifica a intervenção em cultura de outros e, historicamente chegar até geonocídio. Foi o que aconteceu com os nazistas e pode acontecer conosco, vide mais abaixo o livro de leitura sugerido.

Eduardo: Robinho não é superior a você ao jogar futebol. Robinho tem uma habilidade superior a sua em algumas maneiras (pode ser quase todas) de jogar futebol. Você é muito mais que alguém que joga futebol. É importante não confundir as coisas.

Se pegarmos isoladamente, a nossa cultura permite o espancamento de crianças, ou chantagens emocionais para educação. Parte dos nossos índios brasileiros têm uma paciência extraordinária e nunca espancam crinaças. Logo eles tem uma cultura superior a nossa. Pegar traços isolados de uma cultura e querer com outra é falacioso.

Por fim leiam o livro “Cobaias Humanas – A História Secreta do Sofrimento Provocado em Nome da Ciência” de Andrew Golistzek, Ediouro, 2004, 534p.

Trata de inúmeros experiências efetuadas por cientistas e agentes oficiais dos governos (inclusive americano) sobre seres humanos. A quantidade de casos documentados é enorme. Apesar do título ser a história SECRETA, pode ser considerada como aberta, vez que, muitas das experiências dos cientistas foram publicadas em periódicos internacionais e lidos por seus pares. O autor é professor da Universidade Estadual A&T da Carolina do Norte, EE.UU.

Depois de ler esse livro acho muito difícil alguém ainda pensar em superioridade cultural.

Abraços,

Roberto”

A esse e-mail eu respondi com as seguintes considerações (esclarecendo que Axel era ainda um outro membro da lista que também interveio na discussão, concordando comigo).

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“Roberto e Darlana:

Minha mensagem é longa e, por vezes pode parecer pedante e condescendente. Como dizia Groucho Marx, não se enganem: ela É isso… Quem ler daqui em diante saiba disso. Se se irritar, lembre-se de que foi advertido antes…

A mensagem discutirá três grandes questões: a questão do relativismo vs absolutismo na discussão de culturas, a questão da natureza e da forma da discussão racional, e a questão da natureza da cultura e o problema dos valores. E terminará com duas conclusões.

Vamos, portanto, por partes.

I) A Questão do Relativismo vs Absolutismo na Discussão de Culturas

Acho gozado…

O Roberto parece ser contra o que se poderia chamar de absolutismo — pelo menos é o que se depreende de sua referência, em tom pejorativo, aos “absolutistas de plantão” na discussão da prática cultural que deu início à discussão, a saber, o espancamento de mulheres, que, segundo matéria jornalística transcrita, é a norma na África.

No entanto, se eu sou absolutista, o Roberto também o é, e com maior razão, como procurarei argumentar nesta seção.

Vejamos.

Eu afirmo (e o Axel endossa) o seguinte enunciado: “Há culturas que são superiores a outras”.

Esse enunciado não é universal: ele é claramente particular (e afirmativo). Analisado logicamente ele é do tipo “Algum x é y” e quer dizer, simplesmente, aquilo que de fato diz, que “há culturas que são superiores a outras”.

Pode ser que essa afirmação seja absolutista. Eu não acho que seja e estou disposto a mostrá-lo, eventualmente, em outra mensagem, mas não vou fazê-lo aqui, para não complicar desnecessariamente uma discussão em si já complicada.

Advirto neste ponto que há em lógica algo chamado de “quadrado das contradições”, que vou pressupor nos parágrafos que seguem.

A negação lógica (por contrariedade) do enunciado particular afirmativo expresso por mim e pelo Axel (“Há culturas que são superiores a outras”) é feita por um enunciado particular negativo do tipo “Algum x não é y”: “Há culturas que não são superiores a outras”. A negação (por contrariedade) daquilo que eu afirmei se contém, portanto, na afirmação de que há culturas que são iguais a outras — afirmação a meu ver incontroversa e, de resto, totalmente chocha. Estou convicto de que, como o meu enunciado original, esse enunciado particular negativo que o nega (por contrariedade) também não é absolutista, mas não vou brigar por isso agora.

Uma coisa porém é evidente. Para contestar o que eu afirmei, não basta ao Roberto negar (por contrariedade) o que eu disse: ele precisa contradizer o que eu afirmei.

A contradição lógica de um enunciado do tipo “Algum x é y”, particular afirmativo, como o que eu fiz, se expressa em um enunciado universal negativo, do tipo “Nenhum x é y”.

Há uma diferença ENORME entre a condição de negação (por contrariedade) e a condição de contraditoriedade. Por exemplo: Os enunciados dos tipos “Algum x é y” e “Algum x não é y” podem ser ambos verdadeiros com uma substituição coerente de x e y. No entanto, os enunciados dos tipos “Algum x é y” e “Nenhum x é y” são podem ser ambos verdadeiros com uma substituição coerente de x e y: se um é verdadeiro, o outro é necessariamente falso (e vice-versa).

É por isso que, para me contradizer, o Roberto é forçado a fazer uma afirmação claramente universal e negativa: “Nenhuma cultura é superior a outra”.

Eu afirmo: “Há culturas que são superiores a outras”. O Roberto afirma: “Nenhuma cultura é superior a outra”. Qual desses dois enunciados, pergunto, é absolutista? Não tenho a menor dúvida de que é o segundo.

Ainda que se conceda, “ad argumentandum”, que o meu enunciado, particular e afirmativo, também seja absolutista, o do Roberto, universal e negativo, é claramente mais absolutista (por abranger todas as culturas). (Pessoalmente, e em coerência com minha tese, não defendida aqui, de que o primeiro desses dois enunciados não é absolutista, acredito que o “absolutismo” seja parecido com a gravidez: ou se está grávida ou não se está grávida, não há gradações — embora, no dia-a-dia, digamos que fulana está mais grávida do que sicrana se estiver grávida há mais tempo, ou se sua barriga estiver maior, coisas assim.)

E aqui está o que acho gozado nessa discussão: a afirmação que o Roberto se vê obrigado a fazer, nessa disputa, é universal e absoluta, enquanto a afirmação que me é suficiente não precisa sê-lo, bastando ser particular. (Como disse, se o Roberto pretender sustentar que minha afirmação original é absolutista, concedo, apenas “ad argumentandum”, mas daí sou forçado a recorrer à tese de que há gradações no absolutismo, e que a afirmação do Roberto é mais absolutista do que a minha. Em suma: neste caso, estaríamos os dois brigando como se fôssemos irmãos, apenas para determinar quem é mais absolutista do que o outro! O Axel certamente conhece a brincadeira do “qui pisse le plus loin”).

Não estou entre os que sustentam a tese de que na Bahia tudo é possível. Logo, não acredito que a Universidade Federal da Bahia tenha abolido a lógica sem que eu houvesse ficado sabendo. Se isso é verdade, no entanto, o Roberto é absolutista, “malgré soi”.

II) A Questão da Natureza e da Forma da Discussão Racional

Passo a discutir uma outra questão, relacionada a esta que venho discutindo, e relevante para ela.

O Axel é meio implicado contra o Popper, mas a grande contribuição de Popper é que ele deixou claro que o método de discussão racional é hipotético-dedutivo. Esse método inclui, como um caso particular, o chamado método científico.

Os enunciados gerais da ciência (teorias e leis) são tipicamente universais, do tipo “Todo x é y” e “Nenhum x é y”. Esses dois tipos de enunciados implicam, lógica e necessariamente, estes dois tipos de enunciados, respectivamente: “Algum x é y” e “Algum x não é y”.

(Parêntese. Saiamos da abstração e caiamos na concretude. O enunciado universal afirmativo “Todo brasileiro é cordial” implica o enunciado particular afirmativo “Algum brasileiro é cordial”. Se o primeiro é verdadeiro, o segundo necessariamente também é — embora a recíproca claramente não se aplique — e se o segundo é falso, o primeiro necessariamente também é — embora a recíproca claramente também não se aplique aqui. O enunciado universal negativo “Nenhum brasileiro é cordial” implica o enunciado particular negativo, “Algum brasileiro não é cordial”. Novamente, se o primeiro é verdadeiro, o segundo necessariamente também é — embora a recíproca claramente não se aplique — e se o segundo é falso, o primeiro necessariamente também é — embora a recíproca claramente também não se aplique aqui. Fim de parêntese.)

Um enunciado universal afirmativo, no entanto, é contraditado por um enunciado particular negativo, e um enunciado universal negativo é contraditado por um enunciado particular afirmativo. Neste caso, se um é verdadeiro o outro é falso e se um é falso o outro é verdadeiro — e vice-versa.

(Outro parêntese. O enunciado universal afirmativo “Todo brasileiro é cordial” é contraditado pelo enunciado particular negativo “Algum [pelo menos um] brasileiro não é cordial”. Isto é: se eu encontrar um brasileiro só que não seja cordial, eu refuto a afirmação de que todos são. Por seu lado, o enunciado universal negativo “Nenhum brasileiro é cordial” é contraditado pelo enunciado particular afirmativo “Algum [pelo menos um] brasileiro é cordial”. Isto é: se eu encontrar um brasileiro só que seja cordial, eu refuto a afirmação de que nenhum é. E vice-versa. Fim do parêntese.)

Voltando a Popper, a forma de argumentar que sustenta a discussão racional, inclusive (mas não exclusivamente) na ciência, nos leva a buscar enunciados particulares (afirmativos ou negativos) que refutem enunciados universais (negativos e positivos).

A tese que os chamados relativistas culturais defendem, curiosamente (como vimos), é uma tese universal negativa — que, como tal, tem caráter absolutista: “Nenhuma cultura é superior à outra”.

Para contraditar, e, conseqüentemente, refutar, essa tese, basta achar uma cultura que seja superior a outra. Uminha só. Ainda que seja num só aspecto ou em relação a um só traço — “et ceteris paribus”, isto é, outras coisas sendo iguais.

III) A Questão da Natureza da Cultura e o Problema dos Valores

Em sua mensagem o Roberto afirma algo que gostaria de contestar em parte. Diz ele:

“Pegar traços isolados de uma cultura e querer [comparar] com outra é falacioso”. (A palavra em colchetes faltou na mensagem dele, mas acho que se pode presumi-la).

Concordaria plenamento com o Roberto se a afirmação dele fosse que é falacioso pegar um traço isolado e, a partir dele, generalizar. Mas essa afirmação (que não é a que ele fez), embora verdadeira, não é relevante aqui.

Não usei o relato de espancamento de mulheres na África para, a partir dele, generalizar, afirmando (por exemplo) que todas as culturas africanas aceitam o espancamento de mulheres como norma.

Quando transcrevi o relato de que na África o espancamento de mulheres é norma, e acrescentei meu comentário de que, apesar disso, “os relativistas de plantão continuam a afirmar que nenhuma cultura é superior — ou inferior — às outras”, estava afirmando, implicitamente, apenas o seguinte:

* Há culturas em que o espancamento de mulheres (por motivos até triviais, como o fato de que a comida ficou salgada demais) é considerado normal;

* Há culturas em que o espancamento de mulheres (por qualquer motivo, até mesmo a traição conjugal) é considerado inadmissível;

* Uma cultura do primeiro tipo é claramente diferente de uma cultura do segundo tipo, ainda que em todos os demais aspectos sejam idênticas;

* Uma cultura do primeiro tipo é não só diferente: é inferior a uma cultura do segundo tipo, em relação a esse aspecto específico (ainda que sejam idênticas em todos os demais aspectos, ou ainda que haja outros aspectos, não focados na discussão, em que a cultura do primeiro tipo de cultura seja superior);

* Logo, há culturas que não só são diferentes mas que são superiores ou inferiores a outras (em relação a determinados aspectos);

* Logo, a tese universal negativa do relativismo cultural, de que nenhuma cultura é superior a outra, está refutada, pois encontramos pelo menos um exemplo de uma cultura que é superior a outra — evidentemente, no aspecto em discussão.

A Darlana respondeu à minha mensagem original afirmando que eu estava considerando como inferior apenas o que era diferente. Em minha resposta a ela, procurei mostrar que, mesmo segundo os valores DELA, uma cultura que não aprova e considera normal o espancamento de mulheres é não só diferente, mas superior a uma que aprova e considera normal esse tipo de prática.

Há três questões importantes que merecem ser mencionadas para que esta mensagem seja encerrada — permitindo que a discussão continue.

Primeiro, a complexidade dos traços que incluímos no termo “cultura” é enorme. Tudo o que é feito pelo homem, e, portanto, não é natural, é parte da cultura, no sentido mais amplo do termo. Logo, a quantidade de traços envolvidos ao se falar em uma determinada cultura é inacreditavelmente grande. Ao se comparar uma cultura com outra, é literalmente impossível comparar todos os traços de uma com todos os traços da outra.

Na verdade, se tentarmos falar de uma cultura específica, não em termos de traços essenciais e característicos, mas em termos da totalidade dos traços que definiriam uma cultura, nos perderemos. Se pensarmos na totalidade dos traços, não existe uma cultura ocidental ou européia ou mesmo uma cultura brasileira, pois há traços em que a cultura francesa claramente difere da alemã e da inglesa como há traços em que a cultura gaúcha difere da cultura do sertanejo nordestino no Brasil.

Por isso, quando falamos em cultura, qualificando o termo com um adjetivo que se refere a uma região geográfica, estamos em geral pensando em algumas de suas características que nos parecem essenciais — não na totalidade dos traços que definiriam aquela cultura.

Segundo, quando falamos de relativismo cultural não queremos, portanto, focar traços como, por exemplo, o fato de que no Japão se escreve da direita para a esquerda enquanto nós escrevemos da esquerda para a direita. O que queremos focar, ao discutir essas questões, são valores — valores morais, em especial, questões relativas a condutas que consideramos moralmente certas, e, portanto, louváveis, e condutas que consideramos moralmente erradas, e, portanto, condenáveis ou censuráveis. São essas questões que são importantes.

Terceiro, mesmo em relação aos valores morais, cada cultura apresenta uma variedade tão surpreendente que torna impossível abranger, num determinado momento, todos os seus valores morais (aqui entendidos como traços culturais). Assim sendo, comparamos duas ou mais culturas em relação a determinados valores ou conjuntos de valores — como, por exemplo, sua relação para com as mulheres, ou para com as crianças, ou para com os velhos, etc. Ao concluir que uma cultura é superior ou inferior a outra, em relação a determinado valor ou conjunto de valores, não se está fazendo uma avaliação geral de todos os traços culturais das respectivas culturas, nem mesmo de todos os valores morais.

Assim sendo, o fato, se é fato, de que a cultura dos índios brasileiros não aprova o espancamento de crianças, trazido à baila pelo Roberto, curiosamente só mostra que a cultura indígena, nesse aspecto, é superior a outras culturas que aprovam esse espancamento — tese que é contrária àquela que ele pretende estar defendendo. Não tem nada que ver com a questão que estava sendo discutida, que era o de que as culturas africanas que consideram normal o espancamento de mulheres estão erradas, do ponto de vista moral, e, por isso, merecem censura e condenação, e que esse fato as torna, nesse aspecto, inferior a culturas que não consideram essa prática normal. Idem sobre a clitoridectomia (remoção do clitóris) e a infibulação (costura da vagina). (Quem tem dúvida sobre o sentido desses dois termos, procure no Google “clitoridectomy” e “infibulation” e veja as descrições, os gráficos e as fotos. É preciso ter estômago).

IV) Conclusão

Em nenhum momento afirmei que a cultura européia ou ocidental no seu todo, isto é, na totalidade dos seus traços, fosse superior à totalidade dos traços de outras culturas. Afirmar algo assim seria temerário e irresponsável. O que chamamos de cultura européia ou ocidental é tão abrangente e complexo que nem sequer conseguimos conhecer e descrever todos esses traços. Além disso, em relação aos poucos traços que conhecemos melhor, há muita divergência, de modo a permitir que falemos de várias culturas que compartilham alguns traços essenciais. O fato de a cultura européia ou ocidental ter traços que são comprovadamente superiores a traços de outras culturas não exclui o fato de que ela também tenha traços em que é comprovadamente inferior a outras culturas. Isso é tão óbvio que fico até constrangido de dizer. Conseqüentemente, o livro sugerido pelo Roberto é irrelevante — embora possa ser de leitura muito instrutiva.

Uma observação final. Nós temos, como seres humanos, não só o direito como o dever de julgar, avaliar, comparar, decidir, e escolher. O relativismo moral e cultural que pretende nos impedir de fazer julgamentos morais e culturais é uma tentativa de nos eximir não só de um direito, mas de uma responsabilidade que é inerente à condição humana.

As mulheres africanas, vítimas de espancamento, esperam que tenhamos sensibilidade moral e exerçamos nosso dever de condenar moralmente essa prática. Adotar o relativismo moral pode ser uma atitude cômoda (“isso é problema da cultura deles”) mas é irresponsável.

Bertrand Russell, por muitos considerados o maior filósofo europeu ou ocidental do século XX, sucumbiu à tentação relativista. Quando fazia 90 anos, afirmou algo mais ou menos assim (cito de memória): O que me leva a condenar Hitler por ter levado ao holocausto mais de seis milhões de judeus não é o fato de que eu considere moralmente errado o que ele fez, mas, sim, simplesmente o fato de que eu não gosto desse tipo de ação e, no lugar dele, não o faria.

Eu, que admiro o pensamento de Russell em outros aspectos, prefiro imaginar simplesmente que o velho estava caduco a crer que fosse tão irresponsável moralmente.

–Eduardo”

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Transcrito em São Paulo, 5 de Janeiro de 2012

It was a very good year

O ano de 2011 está chegando ao fim. Em menos de 72 horas, terá terminado.

Para mim, foi um ano muito bom. Pessoal e profissionalmente, não tenho nada que reclamar: foi um ano dos melhores.

Por isso, quero lhes deixar um presente: Frank Sinatra cantando “It was a very good year”. Há vários clips dele cantando essa música no YouTube. Escolhi o link abaixo, que tem um clip dele gravando a música, com narração do incomparável Walter Cronkite. É meio longo, quase dez minutos. Mas, na minha avaliação, cada segundo vale a pena.

Assim, se você gosta de boa música e/ou simplesmente gosta da voz de Sinatra, não deixe de ver.

Depois do link, coloco a letra da música, e um comentário, em Inglês, retirado da Wikipedia. Se você não lê Inglês, procure no Google: há traduções disponíveis.

Aqui vai.

It Was a Very Good Year

When I was seventeen,
 
It was a very good year

It was a very good year
For small town girls 

And soft summer nights 

We’d hide from the lights 

On the village green 

When I was seventeen.

When I was twenty-one,
It was a very good year

It was a very good year
For city girls

Who lived up the stairs 

With perfumed hair 

That came undone 

When I was twenty-one.



When I was thirty-five,
It was a very good year 

It was a very good year
For blue-blooded girls 

Of independent means 

We’d ride in limousines

Their chauffeurs would drive

When I was thirty-five.



But now the days are short,
I’m in the autumn of my years 

And I think of my life
As vintage wine 

From fine old kegs

From the brim to the dregs

It poured sweet and clear 

It was a very good year.

Yes, indeed.

“‘It Was a Very Good Year’ is a song composed by Ervin Drake in 1961 for and originally recorded by Bob Shane of The Kingston Trio[1][2] and subsequently made famous by Frank Sinatra‘s version in D-minor, which won the Grammy Award for Best Vocal Performance, Male in 1966. Gordon Jenkins was awarded Grammy Award for Best Instrumental Arrangement Accompanying Vocalist(s) for the Sinatra version. This single peaked at #28 on the U.S. pop chart and became Sinatra’s first #1 single on the Easy Listening.[3] The song can be found on Sinatra’s 1965 album September of My Years. A live, stripped-down performance is featured on his Sinatra at the Sands album.” (Wikipedia)

Espero que 2012 seja,  para você (e, naturalmente, para mim também), ainda melhor do que 2011 foi para mim.

Em São Paulo, 29 de Dezembro de 2011.

Reclamação contra a Telefónica / TVA

Conteúdo de uma reclamação que postei ontem no site http://www.reclameaqui.com.br/ contra a Telefónica / TVA. No site coloquei números de protocolo, etc. Já divulguei nos meus perfis no Facebook e no Twitter. Divulgo agora aqui.

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1) Desde 17/5/2010 possuo Speedy Fibra 30 Mbits (pago na conta telefônica), em combinação com a grade completa da TVA (TVA Total), via cabo coaxial, pagando 119,11 pelo Speedy e 164,90 + 19,00 por um segundo ponto adicional (o primeiro era gratuito), num total de 303,00 mensais.

2) Em 17/10/2010 a TVA me ofereceu um upgrade para TVA Total Full HD (ainda por cabo coaxial). Depois de muita negociação, e até de um pedido de cancelamento de todo o plano, ficou acertado que eu continuaria a pagar os 119,11 pelo Speedy e passaria a pagar 204,92 pela grade completa em Full HD com DOIS pontos adicionais. Esse valor me foi debitado em conta (o Speedy na conta do telefone, a TV em débito automático no Itaú) até Setembro de 2011, um ano depois, com pequena variação nos pagamentos de 7/4 e 7/9/2011.

3) Em 18/5/2011 uma agente da TVA, chamada Rebecca, assessorada pelo controlador de qualidade Bruno, me ofereceu o Serviço Full Fiber TV HD, com a grade completa da TVA por fibra, inclusive todos os canais HD que eu vinha desfrutando por cabo coaxial, ao preço de 164,69, com DOIS pontos adicionais, mais os 119,11 do Speedy, o que daria o valor de 283,90 mensais, não sendo cobrados os dois primeiros meses do plano da TV. Aceitei e o a TV por fibra foi instalada em 21/5/2011.

4) Ao final da instalação constatei que os canais fechados de HD não estavam disponíveis. Reclamei. O instalador me mandou ligar para 0800-771-5047. Liguei, recebendo um número de protocolo, com atendimento por Felipe. Lá a Telefónica alegou que a representante de vendas Rebecca não poderia ter feito a oferta que eu afirmava que ela fez, porque aquele preço seria sem os canais HD fechados. Pedi para ela reproduzir a fita que contém a gravação da conversa que a representante de vendas teve comigo. A Telefónica alegou que levaria cinco dias para recuperar a gravação. Passaram-se cinco dias, depois mais cinco, eu ligando sempre e eles alegando não encontrar a gravação.

5) Finalmente (9/6/2011) consegui falar com uma supervisora, de nome Edilaine Souza, e-mail edilaine.souza@atento.com.br, telefone (11) 3241-9300. Ela disse que a gravação não foi encontrada. Eu argumentei que, neste caso, a Telefónica teria de cumprir o que eu afirmava ter sido combinado comigo. Nada feito.

6) Em 16/6/2011 a mesma supervisora me propôs cobrar 204,92 pela TV, mais os 119,11 do Speedy, devolvendo-me a diferença entre 204,92 e 164,69, se eu ligasse e reclamasse ao receber a fatura, enquanto ela continuava a procurar a gravação. Continuava a isenção dos dois primeiros meses (Junho e Julho) no preço da TV. Concordei.

7) A Telefónica/TVA me enviou um monte de faturas, em discordância com o combinado. Liguei, e a Supervisora disse que não poderia continuar restituindo a diferença, mesmo sem ter encontrado a gravação.

8) Recorri e fui atendido por Maria Amélia Calixto, em 4/8/2011, que se apresentou como sendo Speedy Pós-Venda. Disse que iria verificar o caso e me retornaria. Em 10/8 me fez uma proposta, que recusei, porque, entre outras coisas, incluiía o serviço de telefonia Fale à Vontade. Continuamos discutindo até que em 16/11, às 12:15 h, me ligou alguém que se apresentou como Edigelma, que me propôs o seguinte: Isenção no pagamento da TV por dois meses (Junho e Julho); 263,80 a partir do terceiro mês e por mais doze meses, valor esse que incluía a grade completa Full HD mais Speedy 30 Mbits, valor esse que se tornaria 299,90 depois do décimo segundo mês de pagamento do valor anterior (isto é, não incluídos no cômputo os dois meses de isenção da TV). Disse-me ainda que me daria um crédito de 51,04, correspondente a valor que eu havia pago a maior. Concordei.

9) A Telefónica, entretanto, não cumpriu a proposta, continuou a me cobrar 119,11 pelo Speedy mais 204,92 pela TV, num total de 324,03 (valor que oscilou para cima em Set 2011, tornando-se 341,16. Esses valores foram debitados em conta até o mês de Setembro de 2011, quando, depois de tentar junto à Telefónica que o problema fosse corrigido, sem sucesso, suspendi o débito automático da TV (não o do Speedy).

10) A Telefónica / TVA agora me ameaça cortar o serviço, colocar as faturas em protesto, colocar meu nome no serviço de proteção ao crédito. Pelos meus cálculos, todos devidamente documentados, a Telefónica / TVA ME DEVE hoje 285,91. No entanto ela está me cobrando 716.15. Já tentei falar com alguém inúmeras vezes, sem sucesso.

É isso.

Eduardo Chaves

Transcrito aqui em 28 de Dezembro de 2011

A Educação das Emoções e da Vontade

Originalmente publicado no Blog das Editoras Ática e Scipione.

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1. Introdução

Sócrates morreu no domingo. Não o grego, naturalmente, que morreu já faz tempo. Quem morreu esta semana foi o Sócrates Brasileiro (com “b” maiúsculo): o homem do futebol arte, o capitão daquela seleção brasileira que muitos consideram a melhor de todos os tempos — mas que, entretanto, perdeu a Copa do Mundo na Espanha.

Estava pensando sobre o assunto deste artigo quando soube que Sócrates, o homem, havia, como antes o jogador, encerrado sua carreira. 

Eu lia um livro genial quando fiquei sabendo da notícia: The Goal, de Eliyahu Goldratt. Foi a partir de uma discussão interessante no Facebook que alguém me sugeriu a leitura dele. Não é um tratado ou um ensaio: é um romance. Procurei na Internet algumas resenhas, achei-as interessantes, e comprei o livro. Foi um excelente investimento. Gosto de romances que não apenas entretêm, mas que, ao contar bem uma história, também ilustram uma filosofia de vida. Melhor do que isso: ilustram a busca por uma filosofia de vida interessante.

Aos poucos, Sócrates e The Goal se juntaram…

2. A Meta

É difícil descrever o enredo do livro quando já é complicado traduzir o título. “Goal” é o quê? “Goal” é gol (“o grande momento do futebol”, como dizia um programa de rádio e de TV antigo). Foi esse título que me fez juntar mentalmente a morte de Sócrates com o conteúdo do livro. O termo “goal/gol” é usado no futebol para descrever a meta que os jogadores devem perseguir. A meta, no futebol, é representada por aquele retângulo delimitado por dois postes e um travessão que a bola deve ultrapassar para que um time faça pontos e, caso os faça em maior número que o time adversário, ganhe o jogo. Por isso, enquanto uma equipe tenta fazer a bola ultrapassar a meta da equipe adversária, esta busca protege-la. Tanto isso é assim que o goleiro era antigamente chamado de “guarda-meta”. E, quando se fazia um gol, dizia-se que a meta havia sido “vasada”.

Embora haja uma grande e interminável discussão sobre “futebol arte” vs “futebol resultado”, não há como discordar do truísmo que “futebol é bola na rede”, ponto final. Ganha o jogo, ao final, quem fez mais gols. Ou, em outro chavão, jogo bonito não ganha campeonato — nem a Copa, como descobrimos tristememente em 1982.

Apesar de que, muitas vezes, pode parecer mais gostoso ver nosso time jogar bonito do que ganhar, se o time perder o jogo, ficamos frustrados, porque o objetivo real do futebol é fazer mais gols do que o adversário. Como dizem os mais fanáticos, o objetivo é fazer gol, ainda que seja gol contra, em impedimento, de canela, sem querer, chorado, com a ajuda do morrinho artilheiro, ou então do juiz, etc.

O livro de Goldratt discute a história de uma empresa. E procura deixar claro que, se a empresa não sabe qual é a sua meta, não tem jeito de ganhar no jogo do mercado — a menos que tenha muita sorte e, ainda assim, quando isso acontece, a vitória é por pouco tempo.

A sugestão de Goldratt é simples e óbvia: a meta de uma empresa é (como todo empresário deveria saber) fazer dinheiro. Fazer dinheiro, “make money”, é diferente de simplesmente ganhar dinheiro. Alguém que acerta na Loteria ganha dinheiro. Fazer dinheiro, porém, é dar lucro, é gerar mais dinheiro do que se investe e gasta para gerá-lo. Para não conquistar a antipatia dos meus leitores de simpatias esquerdizantes, que acham que a meta de uma empresa é exercer sua responsabilidade social, contribuir para a melhoria do meio ambiente, contribuir para o crescimento econômico do país, fazer filantropia, etc., paro aqui o relato sobre o livro de Goldratt.

Mas fica a lição: nenhuma organização, nenhuma pessoa, e nenhuma atividade consegue ser bem sucedida se não souber qual é a sua meta.

Aqui chegamos à educação.

3. A Meta da Educação

Qual a meta da atividade que chamamos de educação?

Hoje a gente houve várias sugestões: formar cidadãos, preparar trabalhadores do conhecimento para a economia digital, etc.

Prefiro, entretanto, uma visão diferente… Para usar uma expressão bonita da Viviane Senna, a meta da educação é fazer com que as pessoas “dêem certo”. Ou, para usar uma expressão que foi incluída pela Microsoft na sua missão, fazer com que as pessoas realizem seu pleno potencial. Ou ainda, como eu mesmo venho dizendo aqui neste blog, fazer com que as pessoas se desenvolvam, plena e integralmente, como seres humanos.

Essas três formulações são bonitas, nobres e, estou convicto, corretas. Mas não bastam, porque é preciso que se esclareça o que queremos dizer quando afirmamos que uma pessoa “deu certo”, ou “realizou seu pleno pontencial”, ou “se desenvolveu plena e integralmente como ser humano”?

Quando Goldratt afirma que a meta de uma empresa é fazer dinheiro ou dar lucro, todo mundo entende claramente o que ele quer dizer, mesmo que não concordo ou que não saiba o que uma empresa precisa fazer para alcançar essa meta.

Mas quando a gente diz que a meta da educação é fazer as pessoas darem certo, realizarem seu pleno potencial, ou se desenvolverem como seres humanos, não há uma clareza comparável de entendimento. Parece que fica faltando explicar alguma coisa.

E aqui chegamos à filosofia. Mais cedo ou mais tarde a gente chega a ela.

4. A Contribuição da Filosofia

Pegando uma sugestão dos principais filósofos gregos clássicos (Sócrates, Platão e Aristóteles), gostaria de sugerir que uma pessoa dá certo, ou realiza o seu potencial, ou se desenvolve como ser humano, quando se torna uma “pessoa virtuosa” (no sentido técnico que vou tentar esclarecer).

Muitos vão me acusar de estar trocando seis por meia dúzia, por que, afinal de contas, o que queremos dizer quando chamamos uma pessoa de virtuosa?

Mas os gregos tinham uma resposta para essa questão…

Para chegar à resposta dos gregos, precisamos, como Jack o Estripador, ir por partes…

Primeiro, os gregos (que eram muito lógicos — na verdade, eles inventaram a lógica…), sabiam que, para responder à pergunta “O que é uma pessoa virtuosa?” tinham de esclarecer antes o que é uma pessoa e o que é a virtude…

Assim, refletiram sobre o que significa ser uma pessoa.

Uma pessoa, concluíram, é um ser que é capaz de pensar, sentir (emocionar-se, por exemplo) e agir. Para agir, ele tem de ser capaz de escolher e decidir. Essas competências (ou “faculdades”) de pensar, sentir, escolher, decidir e agir compreendem a mente (ou “alma”) da pessoa.

(Algumas pessoas, como, por exemplo, as pessoas humanas, têm, além de sua mente, um corpo. Isso não é novidade. Outras, porém, como quem sabe os anjos e os deuses, não teriam um corpo, por não terem necessidade dele. Mas deixemos de lado esses detalhes).

Virtude, por seu lado, é aquilo que é bom (ou certo) na ação ou na conduta.

(A propósito, os gregos davam enorme importância a três coisas que consideravam “transcendentais”: o verdadeiro, o belo e o bom. O verdadeiro deve reger os nossos pensamentos; o belo, os nossos sentimentos; e o bom, a nossa ação ou conduta. O leitor pode notar que os gregos gostavam de deixar tudo muito bem “amarradinho”).

Uma pessoa virtuosa, portanto, é uma pessoa que, em suas ações, faz o que é bom ou certo, ou que pauta sua conduta por aquilo que é bom ou certo.

Mas como é que descobrimos o que é bom ou certo em nossas ações e em nossa conduta?

Resposta dos gregos (que considero difícil de melhorar): pensando, isto é, refletindo, discutindo, criticando e sendo criticado. Nesse processo, é possível (eles estavam convictos disso) descobrir algum critério que nos permita  distinguir a ação boa, ou conduta correta, da ação má, ou conduta incorreta. Digamos que um critério como este seja próximo do que é procurado: uma ação é boa ou correta se é generalizável, isto é, se eu, ao contemplá-la, posso desejar que qualquer outra pessoa, mesmo um inimigo meu, em circunstâncias semelhantes, faça a mesma coisa. (Essa é uma versão meio kantiana e afirmativa da lei áurea cristã: não fazer aos outros aquilo que não queremos que eles nos façam).

Aqui os gregos constataram um fato importante sobre a natureza humana. Mesmo que eu saiba (por concluir, através de um processo de reflexão, discussão, etc.) que determinada ação é certa, e, portanto, deve (ou pode) ser realizada, ou que é errada, e, portanto, deve (sem o “pode”, aqui) ser evitada, esse conhecimento é suficiente para que eu faça o que é certo e deixe de fazer o que é errado?

Resposta: não. Saber o que é certo e o que é errado é condição necessária, mas não suficiente, para fazer o certo e não fazer o que é errado. Há uma lacuna, ou “gap”, entre saber o que é certo e fazer o que é certo, entre saber o que é errado e não fazer o que é errado.

Os gregos também descobriram que esse “gap” pode ser de dois tipos:

a) Em alguns casos, a pessoa sabe o que é certo e o que é errado, mas não quer fazer o certo e evitar o errado;

b) Em outros casos, a pessoa sabe o que é certo e o que é errado, quer fazer o certo e evitar o errado, mas não consegue.

Em ambos os casos, a pessoa não tem nenhum problema no plano cognitivo: ela sabe o que é certo e o que é errado.

No primeiro caso, porém, a vontade da pessoa, o seu querer, não está alinhado com a sua cognição. Ela sabe que uma determinada ação é certa, mas não quer faze-la. Ou ela sabe que uma determinada ação é errada, mas ainda assim quer faze-la.

Consequentemente, ela não vai ser uma pessoa virtuosa: ela não vai fazer o que é bom ou certo.

Se o objetivo da educação é fazer com que as pessoas se tornem virtuosas, ou a educação acha um jeito de fazer a pessoa mudar o que ela quer (mudar a sua vontade) ou ela terá fracassado.

Note-se que não basta que a educação consiga que a pessoa faça ou que é certo e deixe de fazer o que é errado. Isso pode ser conseguido constrangendo-a ou mesmo obrigando-a (caso tenhamos como fazer isso) a fazer o certo e a não fazer o errado. Mas, nesse caso, ela não estaria escolhendo e decidindo ser virtuosa: estaria apenas agindo certo e deixando de agir errado por coação, física ou mental. A sua vontade, o seu querer, estaria inalterado, ainda desejando não fazer o certo e a fazer o errado. Assim que a coação fosse removida, possivelmente ela iria deixar de fazer o certo e fazer o errado.

O desafio da educação aqui é como agir sobre a vontade da pessoa, para alterá-la, na verdade, para conseguir que a pessoa mesma, de forma livre e espontânea, e, portanto, consentida, mude sua vontade.

Esse é um desafio enorme para a educação.

No segundo caso, o problema é outro. Nesse caso, a vontade da pessoa é fazer o que é certo e deixar de fazer o que é errado. Mas ela não consegue.

Até o apóstolo Paulo, que conhecia o pensamento grego, sabia que há um fosso difícil de transpor não só entre saber o que é certo e o que é errado e fazer o que é certo e não fazer o que é errado, mas também entre querer fazer o certo e não querer fazer o errado, e, de fato, fazer o certo e não fazer o errado. Ele disse algo assim: o bem que eu quero, esse eu não faço, e o mal que eu quero, esse eu faço… (Ver Romanos 7:19).

Se a pessoa, mesmo querendo, não consegue fazer o que ela sabe ser certo, e, mesmo querendo, não consegue deixar de fazer o que ela sabe ser errado, aqui também ela não se tornará uma pessoa virtuosa. Mas o problema é outro. Se há problema com a vontade, aqui, o problema é que a vontade é demasiado fraca para produzir a ação.

5. As Emoções e os Sentimentos 

David Hume, filósofo sobre o qual escrevi minha tese de doutoramento nos idos de 1970-1972, escreveu sua primeira obra, que se tornou, oportunamente, sua obra prima, antes de completar 30 anos: A Treatise of Human Nature. Essa obra está dividida em três partes, que correspondem ao “Thought, Emotion and Will” (Pensamento, Emoção e Vontade) da filosofia clássica: “Of the Understanding, Of the Passions, Of Morals” (Do Entendimento, Das Paixões, Da Moral”).

Nesse livro ele diz algo que se tornou um ponto de vista importante na filosofia posterior.

“Reason is, and ought only to be the slave of the passions, and can never pretend to any other office than to serve and obey them” (A razão é, e apenas deve ser, a escrava das paixões, e não pode pretender nenhuma outra função além de servir e obedecer a elas).

Para Hume, a razão é incapaz de mover a vontade, ou, havendo a vontade, de produzir a ação — a menos que haja a intermediação do que ele chamava de paixões: as emoções e os sentimentos.

Em outras palavras: a razão me diz que é certo ou que é errado fazer determinada coisa, mas não é capaz de me fazer querer fazer o certo e evitar o errado, nem de capaz de, assumindo-se que eu queira fazer o certo e deixar de fazer o errado, de me levar a agir como eu quero.

Para mover a vontade ou fazer com que a vontade produza a ação, as emoções e os sentimentos são necessários.

Se Hume está basicamente correto, a educação, como um todo, precisa dar muito mais importância do que dá hoje (se é que dá alguma) à educação das emoções, dos sentimentos, da sensibilidade, porque esse aspecto da educação será indispensável para que uma pessoa possa “dar certo” na vida, ou “realizar seu potencial”, ou “se desenvolver como ser humano”.

6. Conclusão

No dia 25 de Outubro último o Instituto Ayrton Senna realizou um Seminário Internacional que teve o título de “Educação para o Século XXI”. A principal estrela do evento foi o James Heckman, professor de economia da Universidade de Chicago e ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2000. Ladeado por três ex-alunos, ele discorreu sobre a importância — para o sucesso na escola e na vida — das chamadas “competências não-cognitivas”. Não só elas seriam tão importantes quanto as competências cognitivas para explicar o sucesso na escola e na vida, como seriam importantes até mesmo para o desenvolvimento das competências cognitivas.

Vimos aqui que, se os filósofos gregos e David Hume estavam na direção certa, os desafios que a educação enfrenta são maiores do que a dicotomia cognitivo-não cognitivo deixa entrever. A dimensão não cognitiva abrange não só competências não-cognitivas como liderança, colaboração, persistência, resiliência, etc. Ela envolve também a educação das emoções, dos sentimentos, da sensibilidade, e da vontade.

Esse complexo de “educações” está estreitamente relacionado com a formação de hábitos, desde que a criança é muito pequena… É nessa fase que se desenvolvem, muito antes que a criança possa entendê-las racionalmente, atitudes e posturas básicas perante os outros, perante a vida, perante a natureza, perante as coisas, que farão com que a criança oportunamente venha a ter respeito pelo verdadeiro, pelo bom e pelo belo, sem os quais, mesmo que venha a saber, no plano cognitivo, o que é certo e o que é errado, dificilmente vai querer fazer o que é certo: por que não posso bater nele? por que não posso levar comigo o que é dele? por que não devo falar quando os outros estão falando? por que não devo chamar de você alguém que merece o meu respeito e a minha consideração?

Suspeito que, nesse caso, relações interpessoais sadias e afetivas, e os bons exemplos que elas produzem, são muito mais eficazes do que hoje passa por trabalho escolar.

Escrito em São Paulo, 5 de Dezembro de 2011, e transcrito aqui em 28 de Dezembro de 2011