Futebol, Religião e Política

Em 17 de Fevereiro de 2008, mais de seis anos atrás, escrevi neste Blog um artigo chamado “Há Conversão no Futebol?”

(http://liberalspace.net/2008/02/17/ha-conversao-no-futebol/)

No artigo aduzi várias evidências para a tese de que a conversão no futebol é evento mais raro do que a conversão na religião e na política.

Eis meus argumentos – e, embora a etiqueta literária não recomende a prática, cito a mim mesmo:

“Quando dois se casam, se a mulher é realmente torcedora de um time, quase nunca se converte para o time do marido.

Meu irmão, Flávio Chaves, palmeirense doente, casou-se, longos anos atrás (já tem um neto, ele, também, Gabriel), com uma corintiana. Não só ela não se tornou palmeirense como conseguiu que meus dois sobrinhos, filhos deles, contraíssem essa doença que é ser corintiano.

Meu amigo Roberto Carvalho, são-paulino de quatro costados, casou-se com a também minha amiga, Adriana Martinelli — palmeirense. Ela se converteu para o SPFC? Nem pensando. Neste caso, porém, ela perdeu a custódia futebolística dos dois filhos, ambos são-paulinos desde a maternidade.

. . .

Enfim: pelo jeito, a mulher se converte — em geral quando ainda é namorada — apenas quando não liga muito para o futebol e realmente não torce — quero dizer T-O-R-C-E — para um time. Converte-se porque, não torcendo para nenhum time, não custa nada fazer um agradozinho para o (em regra futuro) marido. Se trocarem de marido um dia, provavelmente trocarão também de time…

Aqui entre nós, nunca vi um caso de homem se converter para o time da mulher nem antes nem muito menos depois do casamento.”

Fim da citação.

No entanto, apesar de conversões “entre cônjuges” serem raras no futebol, não são raras na religião e acontecem até mesmo na política. E o mais curioso é que, na religião, em geral é o marido que se converte para a religião da mulher… Talvez sinal de que, para o homem, a religião é bem menos importante do que o futebol.

Na política a regra não é conversão “entre cônjuges”, mas, sim, conversão à medida que o tempo passa. Já disse alguém que a pessoa que não foi socialista antes dos 30 anos não tem coração – mas aquela que continua sendo socialista depois dos 30 não tem cérebro…

Enfim… Não quero rediscutir aqui o que discuti seis anos atrás. Quero abordar a questão da tríade futebol, religião e política de um outro ângulo: Por que discordâncias políticas são mais irritantes do que discordâncias religiosas ou futebolísticas?

Minha questão – algum leitor familiarizado com a Lógica poderá dizer – traz em si uma falácia: ela pressupõe uma resposta afirmativa a uma questão anterior que não foi sequer formulada. Ela é análoga à conhecida questão (hoje politicamente incorreta) “Por que você parou de bater em sua mulher?” A maior parte dos homens responderia dizendo: “Ora, eu nunca bati em minha mulher, como é que você me vem com essa pergunta absurda agora?”.

Em minha questão pressuponho, por experiência própria e observação, que discordâncias em futebol e religião são menos irritantes do que discordâncias em política. E me pergunto por quê.

Fui instigado a pensar sobre isso ao comprar um livro chamado The Righteous Mind: Why Good People Are Divided by Politics and Religion, de Jonathan Haidt (Pantheon Books, New York, 2012). O livro foi publicado nos Estados Unidos em 2012 e foi escrito por um americano (do estado sulista de Virginia – o grande estado de Thomas Jefferson e James Madison). Todos sabemos que a sociedade americana anda bastante dividida entre “azuis” (a esquerda social-democrata, lá chamada de liberalismo) e os “vermelhos” (uma mescla ou aliança de direita religiosa fundamentalista e liberalismo econômico clássico). Sendo americano, o autor não inclui o futebol como fator de divisão social.

Minha experiência pessoal e minhas observações me mostram que, apesar da violência que caracteriza os marginais das torcidas organizadas, as pessoas normais (sic) são capazes de tolerar, e tomar como brincadeira, um bocado de abuso de torcedores de outros times de futebol. Eu, por exemplo, sou são-paulino roxo, mas não me importo de que chamem os são-paulinos de bambi ou que, no passado, chamassem o grande Mauro Ramos de Oliveira de Martha Rocha. E aguento bem outras gozações de corintianos, palmeirenses e santistas. Tenho grandes amigos corintianos: Edson Saggiorato, Enézio Eugênio de Almeida Filho, Jarbas Novelino Barato. Como disse na citação acima, minha cunhada, Inês, e meus sobrinhos Flávio e César, todos pessoas muito queridas, têm a infelicidade de ser corintianos. Nem por isso gosto deles menos. O próprio Flávio, meu irmão, as minhas irmãs Priscila e Eliane, o meu cunhado João, os meus sobrinhos Vítor e Diogo, são todos palmeirenses – que não é tão ruim quanto ser corintiano, mas é suficientemente ruim. E eu gosto muito de todos eles. E a gente se provoca, se cutuca, mas tudo numa boa. As brincadeiras e gozações nessa área não me irritam em nada.

No tocante à religião, embora as brincadeiras e gozações apareçam com menor frequência, elas raramente me irritam. Meu amigo Edson e sua mulher Sílvia são espíritas. O Enézio é presbiteriano conservador. O Jarbas é um ex-seminarista católico que hoje é ateu. O Flávio é presbiteriano, a Eliane e família são luteranos. A Paloma já foi metodista, Renascer, batista… E assim vai, tudo numa boa. Pouca coisa me irrita aqui – exceto fanatismo fundamentalista.

Mas no tocante a política, irrito-me com enorme facilidade – especialmente com os esquerdistas simpatizantes com o PT. Já fui mais tolerante, admito. Mas minha tolerância nessa área tem se reduzido bastante e muito rapidamente. Quando encontrei uma página no Facebook em defesa do José Dirceu, chamando-o de herói nacional, patati-patatá, tive literalmente vontade de vomitar, e, tendo vomitado, bloquear para sempre uns (felizmente pouquíssimos) amigos meus que haviam endossado a página.

Por que tolero bem divergências futebolísticas e religiosas e sou cada vez menos tolerante em relação a divergências políticas mais radicais? Esclareço que não morro de amores pelo FHC, pelo Serra, pelo Aécio, nem pelo Eduardo Campos e pela Marina. Mas eles não chegam a me irritar como me irritam o Lulla, a Dillma, e outros vermes mais miúdos. E sinto que, para boa parte da população brasileira, esses dois estão, ó, “porraqui”.

Nos Estados Unidos, também, os tea-partists do centro do país e a esquerda Pierre Cardin das duas costas (Atlântica e Pacífica) não se toleram. Se houver uma nova Guerra Civil lá, não será mais entre o Norte e o Sul: será entre o miolo e as bordas laterais. Aqui no Brasil, imagino, se vier a haver uma, como prognostica o Enézio, será entre o Sul/Sudeste e o Norte/Nordeste.

Vou ler o livro para ver se descubro por que a política é capaz de tirar a gente do sério.

Em São Paulo, 25 de Abril de 2014

Breno Souza: Um Bravo Herói da Resistência

Breno Souza

Sou professor de Filosofia. Sempre exerci meu ofício na universidade, nunca na educação básica. E sou contra a obrigatoriedade da Filosofia no currículo do Ensino Médio. Por uma razão simples: não há gente competente para lidar com os desafios da filosofia nesse grau do sistema escolar.

Trago um exemplo, retirado do Facebook. Uma “Avaliação de Filosofia”. Tem valor de 10 pontos. O teste infelizmente não traz o nome do professor de Filosofia que o perpetrou. Melhor. Meu ódio fica difuso.

Mas, felizmente, traz o nome do aluno que enfrentou o desafio com coragem: Breno Souza. Tirou zero. Na verdade, zero vírgula zero, para não ficar dúvida: “0,0”. E o mestre (?) ainda resolveu escrever em diagonal na prova: “Anulada”. Ou seja, ele achou que não havia nada que se salvasse na resposta do aluno.

Discordo. Discordo com veemência.

Ou vejamos.

Uma das perguntas do teste, a que é focada aqui, foi:

Liberdade significa o direito de agir conforme o seu livre arbítrio, de acordo com a própria vontade. A liberdade é um conceito utópico, uma vez que é questionável se os indivíduos têm a liberdade que dizem ter, se com as mídias ela realmente existe, ou não. Você concorda com esse raciocínio? Você se sente livre? (3,0 pts)”.

A resposta do Breno Souza foi esta:

“Não concordo, até porque eu nem li! Eu poderia estar em casa agora jogando videogame, poderia estar na praça jogando bola na quadra, poderia estar no computador mexendo no Facebook, mas não, estou preso em uma sala de aula contra a minha PRÓPRIA VONTADE, aonde [sic] um professor de filosofia está dizendo sobre a ‘LIBERDADE’… kkkkk Sério isso??? EU PRESO CONTRA A MINHA PRÓPRIA VONTADE E VOCÊ AINDA PERGUNTA SE EU ME SINTO LIVRE? ‘-‘ KKKK…

QUANTA IRÔNIA [sic] ! ! !”

Como eu disse, o professor deu 0,0 para a resposta e a anulou. Não viu nada que valesse a pena nela.

Pior cego é o que não quer ver.

O professor forneceu uma definição de liberdade: “o direito de agir . . . de acordo com a própria vontade”. E perguntou: “Você se sente livre?”

O professor tentou induzir a resposta sugerindo que o conceito de liberdade é utópico e que, “com as mídias”, é questionável que ela exista. Mas o aluno ignorou essa baboseira e foi direto à jugular da pergunta:

Como posso me sentir livre, se estou preso aqui na escola, contra a minha própria vontade, quando há tanta coisa lá fora que eu preferia estar fazendo?

Como pode um professor falar em liberdade, entendida como o direito de agir de acordo com a própria vontade, para aqueles que estão presos na escola contra a sua vontade e que preferiam estar em quase qualquer outro lugar menos ali?

QUANTA IRONIA!

Comentei que a resposta do Breno Souza era perfeita e que deveria ter recebido 10,0, magna cum laude. Disse ainda que o professor é que deveria ser anulado.

E acrescentei:

Na nossa sociedade somos obrigados a frequentar a escola, somos obrigados a votar, somos obrigados a pagar impostos escorchantes… Está certo o Breno Souza. Enquanto tivermos essas obrigações todas, e outras que não menciono aqui, não somos livres, no sentido proposto.

Várias pessoas comentaram. Algumas pessoas fizeram piada. Uma sugeriu que “O Breno é livre, menos para definir o que é liberdade!” – porque a definição de liberdade lhe foi imposta… Outra disse: “O Breno foi livre ao escrever o que quis e o professor foi livre ao avaliar o quiz”. Gozadinho, o trocadilho.

Mas os comentários de duas pessoas me irritaram. Elas observaram:

1) “É… ele poderia tb estar roubando, matando… Mas não! ‘Coitado’… está preso numa sala de aula sem ter feito nada! ‘Que injustiça’… Que ‘irônia’ “

2) “Pois é! Coitado do Breno, nem sabe que essa ‘prisão’ é a forma mais verdadeira da futura liberdade dele! Que cabecinha condenada! Ê ê.”

Discordo radicalmente desses dois comentários.

O Breno tem uma consciência de sua realidade, de seus interesses, e de suas limitações que eu gostaria de ter tido quando estava na escola. Ele tem total clareza de que a escola é realmente uma prisão, na qual cumprimos uma sentença que, daqui dois anos, será de quatorze anos — os melhores anos de nossa vida. Esses anos são um enorme e caríssimo pedágio que, infelizmente, ainda somos obrigados a pagar (“contra a nossa própria vontade”), antes de termos autorização para viver livremente. E mesmo depois, há outras limitações à nossa liberdade.

E o Breno tem senso de humor. Mais que isso: tem enorme coragem: tem peito para enfrentar o professor. Tudo bem, ele usou “aonde” quando deveria ter usado “onde” e colocou um acento inexistente em “ironia”. Mas o mais importante é que:

a)   ele tem perfeita clareza de que ele está onde está contra a sua vontade e que, portanto, a escola é uma prisão;

b)   ele sabe que é de ironia mesmo que se trata: perguntar para um prisioneiro se ele se sente livre. . .

Hoje nos colocam nessa prisão cada vez mais cedo, à nossa total revelia. Há criança na escola com menos de dois anos. Mantêm-nos nela por um número cada vez maior de anos. Quando eu estudei, eram quatro anos obrigatórios. Depois viraram oito. Depois, nove. Agora, a partir de 2016, serão quatorze… E lutam para que fiquemos lá, não três horas por dia, como acontecia quando eu estava na escola, mas o dia inteiro, em período integral!

Lá dentro não temos nenhuma voz nem direito de escolher o que queremos aprender, nem, muito menos, como. Massacram-nos com uma quantidade enorme de informação que se espera que absorvamos e assimilemos (para, depois, regurgitar numa prova). Em sua maior parte, essa informação não serve para absolutamente nada. Exceto por algumas poucas competências que desenvolvemos enquanto estamos lá, não por causa do que lá se faz, mas a despeito de tudo que a escola exige e representa, e que poderíamos muito bem e melhor desenvolver fora, o resto é tempo literalmente perdido, desperdiçado, que poderia ser mais bem aproveitado fora, em casa ou na rua, ou, então, trabalhando, fazendo alguma coisa útil. Se frequentar a escola fosse realmente algo bom, não precisaria ser obrigatório. Ilude-se quem imagina que ali está a chave de nossa liberdade. . .

O Breno está fisicamente preso na escola, posto que a frequência a ela é obrigatória na faixa etária dele. Mas mentalmente ele é livre — “as free as a bird“. A escola não conseguiu subjugar a mente dele. Aleluia. Ao dizer isso lembro-me do discurso do Coronel Frank Slade (Al Pacino) em defesa de seu protegido, Charlie (Chris O’Donnell) no belíssimo filme “Perfume de Mulher”. A-ha!

Como disse Karl Popper em A Sociedade Aberta e seus Inimigos, a maior prova que temos da saúde mental de nossa juventude é que na maioria dos casos a escola não é capaz de destruí-la, por mais que tente, e, por isso, não causa dano permanente. E, como disse Samuel Butler, em Erewhon, a escola não consegue destruir essa saúde mental porque a juventude não a leva suficientemente a sério. Para a maior parte dos jovens a escola é apenas um rito de passagem. Felizmente.

Acredito que até o “Irônia”, com acento circunflexo, do Breno Souza, é sarro.

Triste de ver é o professor. “0,0”. “Anulada”. Ele não conseguiu ver por trás da brincadeira a genialidade do seu aluno.

Um dos dois não tem futuro. E não é o Breno.

É bom ter mais de 70 anos e poder dizer o que se pensa. Mas é melhor ainda conseguir chegar a isso na adolescência.

Em São Paulo, madrugada de 25 de Abril de 2014

Uma Breve Cronologia da Ditadura Militar de 1964-1985

1964

31/03 – Tem início o Golpe Civil-Militar visando a deposição de João Goulart.

01/04 – O Golpe Civil-Militar se consolida e o General Arthur da Costa e Silva se proclama “Comandante do Exército Nacional”.

01/04 – À noite, João Goulart, o presidente, abandona Brasília e vai para o Rio Grande do Sul.

02/04 – É declarada a vacância da Presidência da República pelo Congresso Nacional.

02/04 – Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados, é interinamente empossado na Presidência pelo Congresso Nacional.

09/04 – É baixado o Ato Institucional 1 (AI-1) pela Junta Militar composta pelos Ministros do Exército, Marinha e Aeronáutica. Ele dava ao governo militar o poder de alterar a constituição, cassar mandatos legislativos, suspender direitos políticos por dez anos e demitir, colocar em disponibilidade ou aposentar compulsoriamente qualquer pessoa que tivesse atentado contra a segurança do país, o regime democrático e a probidade da administração pública. Determinava ainda eleição indireta para a presidência da República no dia 11 de abril de 1964, estipulando que fosse terminado o mandato do presidente em 31 de janeiro de 1966, quando expiraria a vigência do ato.

11/04 – O General Humberto de Alencar Castello Branco é eleito Presidente pelo Congresso Nacional, com 361 votos (em tese para completar o mandato de Jânio Quadros / João Goulart, que iria até o final de 1965.

15/04 – Castello Branco toma posse, inaugurando o ciclo de presidentes militares.

xx/06 – Mandato de Castello Branco é estendido até 15/03/1967.

1965

27/10 – AI-2, que determina que as eleições para presidente serão indiretas e dissolve todos os partidos existentes desde 1945, e toma outras providências.

1966

05/02 – AI-3, que determina que as eleições para governador serão indiretas, por um colégio eleitoral composto pelos deputados estaduais. Determina ainda que os prefeitos das capitais dos estados serão indicados pelos governadores, com a aprovação das Assembleias Legislativas, fixa 3/10 com a data para as eleições presidenciais e 15/11 para as eleições para o congresso, e toma outras providências.

03/10 – O General Arthur da Costa e Silva é eleito Presidente pelo Congresso Nacional, com 294 votos.

07/12 – AI-4, que convocou o Congresso Nacional para aprovar uma Nova Constituição para o país.

1967

24/01 – É aprovada e promulgada a nova Constituição Brasileira.

15/03 – Costa e Silva toma posse. Os Estados Unidos do Brasil passam a ser chamados República Federativa do Brasil.

18/07 – Morre Castello Branco, em desastre de avião no Ceará.

13/12 – AI-5 – o início da fase mais negra da Ditadura Militar. O AI-5 dava ao presidente o poder de cassar mandatos, intervir em estados e municípios e suspender direitos políticos de qualquer pessoa. Além disso, a tortura foi praticamente instituída. Também suspendia o  Habeas Corpus para crimes políticos e proibia protestos por motivos políticos.

1969

31/08 – Costa e Silva é afastado por causa de uma isquemia cerebral e assume o pode uma Junta Militar composta pelo General Aurélio de Lira Tavares (Ministro do Exército), pelo Almirante Augusto Rademaker (Ministro da Marinha), e pelo Brigadeiro Márcio de Souza e Melo (Ministro da Aeronáutica)

17/10 – É promulgada a Emenda Constitucional 1, que, na verdade, é uma nova Constituição Brasileira

22/10 – O general Emílio Garrastazu Médici é eleito Presidente da República pelo Congresso Nacional, com 293 votos.

30/10 – Médici toma posse.

1974

15/01 – O general Ernesto Geisel é eleito Presidente da República pelo Colégio Eleitoral.

15/03 – Geisel toma posse.

15/11 – O partido de sustentação do governo militar, a ARENA, é derrotada flagorosamente pelo partido de oposição, o MDB, em eleição para o Congresso, criando uma nova realidade política — embora a ARENA tenha conseguido manter a maioria.

1977

13/04 – Geisel baixa o chamado “Pacote de Abril”, com o Congresso fechado, para garantir ao governo militar uma maioria segura no Congresso.

1978

15/10 – O general João Baptista Figueiredo é eleito Presidente da República pelo Colégio Eleitoral.

1979

01/01 – O ainda presidente Geisel extingue o AI-5 (e os demais AI).

15/03 – Figueiredo toma posse.

28/03 – É sancionada a Lei da Anistia

20/11 – É reestabelecido o pluripartidarismo.

1985

15/01 – O senador Tancredo Neves é eleito Presidente da República pelo Colégio Eleitoral, derrotando o Deputado Paulo Salim Maluf. O Senador José Sarney é seu Vice-Presidente.

15/03 – Sarney toma posse, interinamente, na Presidência, em decorrência de doença grave do presidente-eleito.

21/4 – Tancredo Neves morre e Sarney se torna o Presidente da República. Está concluído o período da Ditadura Militar, que durou 21 anos e 21 dias, de 01/04/1964 a 21/04/1985.

[EM TEMPO: Por favor, enviem correções e complementações]

Em Salto, 17 de Abril de 2014

“O Sacerdote e o Feiticeiro”

Ontem (15/4/14) fiquei relendo os quatro livros já publicados pelo Elio Gaspari sobre a dupla Geisel-Golbery:

*  As Ilusões Armadas: A Ditadura Envergonhada (2002, 417p)

*  As Ilusões Armadas: A Ditadura Escancarada (2002, 507p)

*  O Sacerdote e o Feiticeiro: A Ditadura Derrotada (2003, 538p)

*  O Sacerdote e o Feiticeiro: A Ditadura Encurralada (2004, 525p)

Apesar de o termo “Ditadura” aparecer nos quatro volumes, Gaspari insiste que não se trata da uma “História da Ditadura Militar Brasileira”. Trata-se, isto sim, do papel da dupla Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva na Ditadura Militar — na verdade, até mesmo na sua preparação.  Os dois primeiros volumes, que possuem a expressão “As Ilusões Armadas” no título discutem os governos militares até Emílio Garrastazu Médici — principal responsável por colocar fim a essas ilusões. Ao terminar o seu governo, o Médici tinha quebrado a coluna vertebral dos grupos que defendiam a luta armada. Os dois últimos volumes traçam o esforço de Geisel, com o apoio e a ajuda de Golbery, para colocar em andamento o fim da Ditadura Militar — mas de forma “lenta, gradual e segura”.

Antes de continuar, dois parênteses:

Parêntese 1: Relendo é “façon de parler”… O que fiz, a maior parte do tempo, foi leitura dinâmica ou “browsing”, só relendo mesmo, com atenção e cuidado, pedaços selecionados, especialmente aqueles que, na leitura original, eu havia sublinhado.

Parêntese 2: Sempre achei que Gaspari deveria ter achado um outro adjetivo para o título do segundo livro, para que os quatro tivessem um adjetivo com “E” qualificando “Ditadura”. Mas, provavelmente, ele não é virginiano, como eu…

Fim dos parênteses.

Li com atenção mesmo a Introdução ao primeiro volume. A obra começou como um artigo (que Gaspari esperava que viesse a ter umas 60 páginas) sobre a dupla de colegas, amigos, co-conspiradores, artífices da distensão política na fase final da Ditadura: Geisel (o “Sacerdote”) e Golbery (o “Feiticeiro”).

Gaspari ganhou até mesmo uma bolsa para escrever esse artigo nos EUA em 1984. Concluiu que o que tinha a dizer não cabia em um artigo. Pediu permissão a quem lhe deu a bolsa para que o artigo virasse um livro que, imaginava, teria umas 300 páginas. A coisa foi crescendo e o artigo virou uma coleção (ainda inacabada até hoje) de quatro livros com perto de 2.000 páginas. As datas em que foram publicados estão acima: de 2002 a 2004. Ou seja: Gaspari levou cerca de 18 anos (1984-2002) para escrever esses quatro volumes, que daí foram publicados ao longo de basicamente três anos.

O primeiro livro cobre 1964-1968, por aí, com uma boa incursão no período anterior à deflagração do Golpe Militar de 31 de Março / Primeiro de Abril de 1964: o período da derrocada do Jango. Vai até basicamente o AI-5, baixado em 13/12/1968. Cobre, portanto, o final do governo Goulart (quando as diversas conspirações corriam soltas), o governo Castello Branco e o Governo Costa e Silva (que era detestado por Geisel e Golbery).

O segundo livro cobre 1969-1973, por aí: o período da Junta Militar e do Garrastazu Médici. Com esse livro se chega a Geisel.

O terceiro livro cobre basicamente 1973: as tratativas do Geisel “ungido”, sempre com a colaboração de Golbery, para conter os radicais que se opunham a eles e obter apoio de segmentos importantes, como a Igreja Católica. (Mais sobre a relação com a Igreja Católica abaixo, mas basta dizer aqui que, na posse do Geisel, os cinco cardeais que o Brasil possuía estiveram presentes, até Dom Paulo Evaristo Arns – obra do Golbery). Mas o livro de certo modo recapitula, de forma meio telegráfica, a atuação militar e política da dupla Geisel e Golbery, desde os primórdios. A amizade dos dois remonta aos bancos escolares.

O quarto volume cobre basicamente os primeiros  três quartos do governo Geisel, de sua posse, em Março de 1974, até Outubro de 1977, quando ele demitiu o Ministro do Exército linha-dura, defensor dos torturadores e assassinos, que estava planejando um golpe contra Geisel: o General Sylvio Frota.

Na ocasião da publicação do primeiro volume (2002) Gaspari informou que os quatro volumes estavam prontos, e que seriam publicados em sequência rápida, mas que iria escrever mais um volume, o quinto, cobrindo o último quarto do governo Geisel, depois da demissão de Frota (Outubro de 1977 até Março de 1979, quando transmitiu o governo a Figueiredo). No governo Figueiredo ele não tinha nenhum interesse, afirmou. (Curiosa, essa frase, não?)

Estamos todos ainda esperando esse quinto volume – se é que vai ser só um, ou se é que será algum… Chequei no Google e há boatos de que ele possa vir à luz em 2014 – dez anos depois do quarto volume. Mas há quem diga que só em 2015. E há mesmo os que acham que ele pode nunca publicar esse último volume, embora certamente o esteja escrevendo.

O que mais me chamou a atenção ao reler a obra foi o seguinte. . . Elio Gaspari, como ele mesmo diz na Introdução ao primeiro volume, foi comunista, membro de carteirinha do PCB, o pecezão. No entanto, ficou próximo, depois de que saíram do governo, de Geisel, Golbery e Heitor Aquino Ferreira (que, entre outras funções, foi secretário pessoal dos dois primeiros, e que manteve um diário que, segundo Gaspari, impresso chegaria a umas 1500 páginas). Golbery deu a Gaspari, para uso na elaboração de seu opus magnum, as 25 caixas de documentos que tinha. Relutou, mas quando percebeu que elas estavam ficando emboloradas em seu sítio perto de Brasília, cedeu. Geisel também deu a ele (via sua filha) cópias das doze fitas que continham mais de 30 encontros de uma hora e meia de depoimentos gravados por Geisel — depoimentos feitos a Gaspari. E deu outros documentos, além de conversar com ele pessoalmente várias vezes. Heitor Aquino deu a Gaspari cópias de partes do diário e deixou que ele visse/lesse outras partes. Gaspari diz que esse diário é o relato mais fascinante da “história privada” vivida por participantes do governo militar que jamais se escreveu (e que está esperando publicação, se é que vai ser publicada). Heitor Aquino e Élio Gaspari ficaram grandes amigos — uma amizade que já dura bem mais de 30 anos — talvez mais de 40.

Acho isso tudo muito fascinante.

O relato dos quatro livros não deixa de colocar Geisel e Golbery debaixo de uma luz relativamente favorável e mesmo simpática – embora não esconda os seus “malfeitos” (como gosta de dizer a ANTA). Mas esses malfeitos aparecem mais como coisas que deveriam ter feito e não fizeram, ou coisas que deveriam ter feito antes e só quiseram / conseguiram fazer depois — como demitir o detestável Frota.

Geisel é chamado de “O Sacerdote”, sem dúvida, porque era de família protestante e tinha uma postura que pontificava, parecendo muito mais alto do que seus 1m78. Segundo Gaspari, porém, seu vínculo religioso era apenas cultural. Golbery é chamado de “O Feiticeiro” porque era considerado, pelos outros e provavelmente por si próprio, como um bruxo, o grande bolador de grandes esquemas. Glauber Rocha o chamou de um “gênio da raça”.

O curioso é que, num determinado momento, em que Geisel era presidente e seu irmão, o general Orlando Geisel, um influente membro do Estado Maior das Forças Armadas (EMFA), houve negociações entre os militares, representados pelos dois irmãos, e os cardeais Aloysio Lorscheider e Ivo Lorscheiter, repectivamente presidente e secretário geral da Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB) – que representavam a Igreja Católica, naquele momento a maior força da oposição, de a voz mais alta a denunciar as torturas, os desaparecimentos, os assassinatos sumários.

Naquele momento, o destino do Brasil estava, ali, sendo decidido, em um “summit” curioso, por quatro gaúchos, parentes dois-a-dois, descendentes de colonos alemães pobres, que fizeram carreira naquelas que eram, provavelmente, as duas únicas instituições capazes de possibilitar que meninos pobres, mas talentosos, viessem, anos depois, a estar entre as personalidades mais importantes da vida do país: o Exército e a Igreja.

Duas notas finais:

Primeira Nota (de um virginiano): no livro, o sobrenome de Dom Aloysio é grafado LorscheiDer e o de Dom Ivo, LorcheiTer. Dificilmente é descuido. Mas, não sendo, merecia uma explicaçãozinha nas notas de rodapé. Ou, quem sabe, a explicação foi dada e eu não a vi.

Segunda Nota: Os quatro livros do Elio Gaspari foram reeditados em papel este ano (2014) em decorrência dos 50 anos do Golpe Militar e estão também distribuídos em e-book pela Amazon Brazil pela bagatela de R$ 8,91 cada volume. Cada volume sai mais barato que uma edição da VEJA — ou um cone de sorvete da Parmalat. Do primeiro volume do e-book saiu uma versão “enhanced”, que, além do texto e das fotos, contém conteúdos multimídia (clips de áudio e de vídeo). Custa cerca do dobro, talvez 1 real a mais. É de imaginar que os outros volumes também venham a receber, “in due time”, suas versões enriquecidas por conteúdos multimídia. Mas, na minha opinião, a versão e-book simples, por menos de 9 reais, está de graça: 4 dólares por volumes.

Em Salto, 16 de Abril de 2014

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Discurso de Formatura – 1963   1,347
Transações econômicas   1,300
A visão religiosa do mundo – 1   1,282
O que faz de um objeto uma obra de arte?   1,280
Cena ou sena?   1,267
Ética marxista   1,190
Administrar o tempo é planejar a vida (*)   1,185
Será que terminou o dilúvio na Serra da Mantiqueira?   1,176
A causa principal dos problemas da educação básica brasileira   1,162
Rancho 53 na Castello: Imperdível   1,128
A interferência do estado na vida privada: o casamento   1,108
Têm os índios brasileiros o direito de praticar o infanticídio?   1,067
Bondes e trens em Campinas (e Genebra)   1,052
Desigualdade educacional   1,034
A Educação: Visão Sociológica e Visão Psicológica   1,009
A liberação do desejo e a busca da riqueza   976
Creacionismo vs evolucionismo na escola: o debate chega à grande imprensa brasileira   971
O Leitor / The Reader: Uma Resenha   900
Capital e Trabalho   878
O reconhecimento da independência de Taiwan   861
O liberalismo e o mercado   844
Educação: conceito, modelos, paradigmas – I   841
Impostos e taxas (e mais: contribuições, empréstimos compulsórios, etc.)   835
+Meu Résumé+   797
Carta Renúncia de Janio Quadros (25/08/1961)   794
“O Elemento” – A Propósito do Livro de Sir Ken Robinson   743
Mais uma crônica antiga: Meus 60 anos   709
Tecnologia, Redes Sociais e Educação   699
+Meu Credo Liberal+   683
As Competências Essenciais para o Século 21 de Marc Prensky   682
A “relativização” dos direitos individuais   672
A Questão das Políticas Públicas na Educação   650
+Sites Liberais+   616
O Colégio Engo Juarez Wanderley da Embraer   613
Entrevista para a Revista Nova Escola   609
Educação pública nos Estados Unidos   604
É preciso ensinar a criança a brincar, ou sempre brincar com ela???   590
Verdade, dogmatismo e intolerância (mais uma vez)   584
Matética   580
Campeonatos Mundiais de Futebol Interclubes (1960-2011)   572
Que bicho complicado é o ser humano… – 1   565
Desigualdade material e igualdade formal   557
Livros   541
Lucélia… Terra natal   524
A criança e a aprendizagem   505
“2 Filhos de Francisco”   502
Desigualdade, pobreza e liberdade   502
“Sexting”– ou o envio de torpedo sexy   502
O “Liberalismo” e a “Justiça” de John Rawls   497
Orações infantis   496
“Educação sem Doutrinação” e “Escolas sem Partido”   494
Aprendizagem por Projetos: O Desafio da Avaliação   486
Mobilidade, Redes Sociais e Escola   485
Computadores: Máquinas de Ensinar ou Ferramentas para Aprender   480
Instantes e Epitáfio   476
+Este Blog+   472
Ronaldo e o racismo do movimento negro   461
Homenagem ao Oscar: A arte de traduzir títulos de filmes   442
Howard Gardner e as Múltiplas “Inteligências”   431
O desafio da educação moral   430
Marido e Mulher e as “Novas Conjugalidades”   421
Multiculturalismo, interculturalidade e relativismo   411
A verdade: contra o ceticismo, o relativismo, e o dogmatismo – 2   408
É o embrião um ser vivo?   406
O Cristianismo e a arte   393
Relativismo Cultural e Moral   386
É possível e defensável terceirizar a educação?   384
A catástrofe de New Orleans   382
Os Indicados ao Oscar (em Português)   380
Café da manhã em padarias…   375
Dogmatismo e doutrinação   375
28 de Novembro de 2010   373
+Outros Blogs Meus+   372
Mercado, mercadorias e a distribuição de riquezas   367
Os aeroportos com maior tráfego de passageiros no mundo   358
A simplificação do divórcio   357
Rev. Oscar Chaves, a Igreja Presbiteriana Maranata, e outros elos que se restabelecem em torno de Santo André   354
A Educação e a Vida: O Papel da Tecnologia   354
A tragédia da escola de Realengo   351
A lei e a honra   329
A natureza da moralidade   325
Carta Testamento de Getúlio Vargas (24/08/1954)   325
Resultados do Oscar 2012   323
O Anti-americanismo   317
Mudança NA e DA Educação   316
Chácara Klabin   309
SPFC: Tri/Hexa Campeão Brasileiro (6-3-3)   306
Coerência vs Incoerências   304
Uma outra crônica antiga: sobre avós, pais e netos…   301
São todas as culturas iguais?   299
Pode (e deve) a moralidade ser ensinada (na escola pública)?   297
Entre Peter Pan e Dom Fulgêncio   296
Aprendizagem e projetos de aprendizagem   295
Liderança (ou: O Monge e o Executivo…)   284
Os Estados Unidos e Cuba   283
Nós, os Liberais, e a Questão da Direita vs Esquerda – De Novo   280
Pobreza e desigualdade   276
Protestantismo, pobreza e ascensão social   273
“Cubanos por 30 dias”   272
Educação, Mudanças e Inovação: Proposta de Palestra   270
A verdade – entre a dúvida e a certeza   267
Press Release de 15/3/2000 do Programa “Sua Escola a 2000 por Hora”   260
A construção do conhecimento e a busca da sabedoria   259
Novas Formas de Ensinar e Aprender   257
Latitudes, longitudes, e itinerários sem sentido   252
A identidade pessoal da mulher brasileira: a propósito do artigo de Mirian Goldenberg   252
Modelos de educação e de educação a distância   252
O Leilão da Virgindade: A Culpa é do Mercado?   250
Qatar: o anti-Brasil?   244
“Tudo que você tuitar pode ser usado contra você, até no tribunal”   242
O melancólico resultado do Comunismo em Cuba   240
Virginianos   236
Eita nóis… Quanto mais eu rezo, mais assombração aparece!   235
+Motes deste Blog+   234
Uma Apologia da Vagabundagem e da Indisciplina   228
Portugalícia (Portugaliza)   226
Pode uma decisão judicial mudar o passado?   223
Idealismo vs realismo político (ou: de fariseus e publicanos)   222
A visão religiosa do mundo – 2   220
O Canto da Coruja   214
Dia de Ação de Graças / Thanksgiving Day (em comemoração do dia que está chegando)   214
Idéias, pássaros e gaiolas   213
A Coréia do Sul e o Brasil   212
Em defesa do direito de não ser perfeito   212
Da prostituição – do corpo e da mente   211
Alfabetização, letramento e seus correspondentes no mundo digital   209
O liberalismo e o aborto   209
A “novilíngua” e a justiça, o liberalismo, a cidadania, e o republicanismo   209
Os Emoticons (Emocícones?)   209
Reclamação contra a Telefónica / TVA   206
O Estado e a educação   206
Escrita à Mão, Papel Almaço…   203
Projeto de Lei sobre Alienação Parental   203
“O Colocador de Pronomes”   202
Os analfabetos funcionais escolarizados   200
O Contar Histórias na Era Digital (Digital Storytelling)   197
Os pequenos roubos de cada dia no emprego (e nas viagens?)   195
Sebastião Francisco da Silva   195
Indicados do Oscar 2011 – versão LEGO   194
Os Homens são Eternas Crianças a Brincar na Areia…   194
A arte de maquiar defuntos e as pseudoinovações educacionais   193
A formosa Taiwan (Formosa)   192
Esquerda e Direita (segundo Antonio Prata)   192
Uma última crônica antiga (por enquanto): O professor   191
Educação compulsória e educação estatal   190
Escritório da LEGO em Moscow, na Russia   190
O Blog das Editoras Ática e Scipione   186
Desafios da Escola Pública Brasileira   186
O Medo (versos do fado interpretado por Mariza e, antes, por Amália)   184
China: comunismo, capitalismo, liberdade   182
Democracia Constitucional Republicana vs A Tirania da Maioria   182
Alienação Parental – Vamos Combatê-la   179
O Estado e a lei antifumo (ou Do fascismo do Estado democrático)   178
Verdades absolutas e conhecimento relativo: uma réplica   176
Modalidades de escolas   176
Críticas à escola tradicional   175
“Criança, não verás nenhum país como este!”   173
Tecnologia, criatividade e mudanças   170
Multa de 250 dólares por fumar no quarto   169
Ainda a educação como mercadoria   168
“Adeus, Lênin”   167
50 Anos de Atlas Shrugged   165
A Escola e as Redes Sociais   165
Quarenta anos de casado   165
A Revolta Protestante contra a Tentativa Católica de Sacramentar a Vida   164
Redes Sociais, Um Computador por Aluno e a Reinvenção da Escola   163
Pedofilia entre padres   163
A nova face do socialismo   162
A proposta de limitar a propriedade   160
De cães e gatos   160
Pedro Salomão José Kassab (1930-2009)   157
O mercado livreiro brasileiro que se cuide…   157
Não vote em branco nem anule seu voto   157
“Entre os muros da escola”: Uma escola sem alma   156
Emoção e razão na arte   155
Educação e conservadorismo: uma resposta liberal   155
Os Indicados ao Oscar (em Inglês)   153
A lei e a conduta sexual   152
Literatura, cinema… Alienação?   151
Ainda a inclusão / exclusão digital   150
Trecho de Atlas Shrugged (Quem é John Galt?)   149
Livros e Filmes   148
O avô paterno do meu neto Gabriel   148
Uma Nova Forma de Aprender   147
Finlândia: A tragédia na escola   147
“A consciência por vezes é uma merda”   146
Eugenia ou bom senso?   146
Free flow of consciousness   145
A greve dos que sustentam o mundo nas costas   145
Hotéis, tecnologia e serviços   145
A Revolta de Atlas (Atlas Shrugged)   144
Educação e Mudanças: De Reforma a Transformação Através da Inovação [Slideshow]   143
O conservadorismo brasileiro no Ensino Superior   141
Aprendizagem significativa   141
Administrar o tempo é planejar a vida   140
Dá pra viver o mesmo dia duas vezes? Ou pra pular um dia, sem vivê-lo?   140
SPFC: Dentre os grandes, és o primeiro   140
A ditadura lingüística do Politicamente Correto   140
Histórias (verídicas e falsídicas) e a arte de contá-las   138
O estado patriarcalista socializante   137
Educação da sensibilidade — de novo   135
A “externalização” do trabalho: o trabalho “invisível”   134
A moeda vietnamita: o “dong”   134
Os ruídos da noite   132
Meus três tenores atuais   132
A Linha Amarela do metrô paulistano   129
Dois fatos importantes sobre o ser humano   129
Ainda o Qatar e o Brasil   129
Jovens e velhos convivem em todas as faixas etárias   129
Brasil pobre   128
Ainda sobre o trem no Brasil   128
Felicidade, individualismo, igualitarismo   127
Finalmente um Prêmio “Nobel” na Educação   127
Quarenta anos   126
Desabafo   126
Sobre a natureza humana   125
Crônicas sobre um tempo que não volta mais   123
Coisas Importantes, a Propósito da Igreja da Boate   120
É possível justificar filosoficamente o ateísmo?   119
Aharon Sapsezian, amigo e irmão   119
50 Anos de Carreira   117
O Tempo (de Olavo Bilac)   117
Identidade pessoal e mudanças   114
A moralidade   114
Religião e Educação, Igreja e Escola: Como Impedir a Inovação   114
Nossos nomes   111
Por que caímos de quatro diante de nossos netos (Drauzio Varella)   111
Educação, Tecnologia e Mudanças (ou: A Importância de Outras Tecnologias para a Educação)   110
A av Paulista e a região ao redor   110
Encontro da Família Machado (o primeiro, pelo que consta)   108
O memorioso e o pensoso…   108
Cinco anos deste space (e um pouco de história de vida)   107
Educação 3.0: A Escola do Futuro chegou? – NÃO!   107
Direita e esquerda   106
O Desafio da Formação do Professor na Sociedade da Informação   106
Bênçãos   105
Uma família olhando múltiplas telas na mesma sala ao mesmo tempo…   104
Relativismo moral e cultural   102
Pittsburgh Steelers: hexacampeões nacionais de futebol (americano) [como, aqui, o glorioso SPFC (em futebol de verdade)]   101
Calligaris, me desculpe, mas você está muito errado…   100
David Hume, filósofo   100
SoArte   100
Socialismo na escola   99
Educação e Ideologia   98
O elogio à pobreza – material e do espírito (não nessa ordem)   98
As pequenas coisas que esquecemos ou perdemos   97
Hábitos de Leitura   97
A Livraria Saraiva é incompetente: Eis a Prova   96
Justiça Social, Igualitarismo e Inveja – Parte 1   96
Da amizade e do amor (e, quem sabe, do sexo)   96
Está certo: Elas são o sexo forte   95
Ainda o Colégio da Embraer   94
Corrupção, a lei e a moralidade   94
São a mente e o cérebro a mesma coisa?   93
O Rei do Paraíso Imaginário (ou: Indico Lulla para a ABL)   93
Casoy e FHC, Datena e Dilma   93
Tecnologia, Inovação, e Transformação: A Arte de Quebrar Paradigmas   92
Filmes antigos de que eu gosto…   92
Morando com mamãe   92
Isto É: Eles deram a virada   92
Didi e o Criança Esperança   91
Ferramentas e Brinquedos   91
Lugares que eu conheço que são Patrimônio Cultural da UNESCO   91
Síndrome de Alienação Parental   89
A arte – 2   89
Os Views dos Meus Artigos Aqui   88
Ivan Illich e a Troca do Paradigma   87
Tamanho máximo do cabelo masculino socialista   86
Preços monitorados e administrados   86
Suicídio e eutanásia a pedido vs eutanásia não solicitada, infanticídio e aborto   85
A Idiotice do Protecionismo (especialmente no caso dos vinhos)   84
A UNICAMP inova na seleção de alunos de escolas públicas   84
Hotéis japoneses e a tecnologia de higienização pessoal   84
O debate sobre a tecnologia e a educação continua…   84
Uma Homenagem a John Holt   83
A mudança do Live Spaces para o WordPress   82
Na Escola Lumiar o professor é dividido em dois…   80
O trem no Brasil   80
Redes Sociais e Educação: Personalização em Escala   80
Desejos, riqueza e felicidade   80
ENEM: Um vexame atrás do outro   79
Igualdade   79
Homo sum: nihil humanum a me alienum puto   78
Respeitar a liberdade alheia não é fácil   78
A referência bibliográfica do Calligaris sobre o aborto   78
Juliette Binoche e Olivier Martinez   76
It was a very good year   76
Justiça: a verdadeira e as falsas   75
Critical Thinking Skills   75
Yoaní Sánchez e a Esquerda Fascistóide Brasileira   74
O Português dos Jornalistas   74
Educação, felicidade e riqueza   74
Computadores e Educação: Bom artigo do Gilberto Dimenstein   74
Parabéns, dona Márcia Maria!   73
A Relatividade da Importância que Damos a Certas Coisas…   73
Modelos de aprendizagem   73
Verdades absolutas e conhecimento relativo   73
84 Charing Cross Road   72
Joaquim José da Silva Xavier – Tiradentes   72
O Batismo Tricolor do Gabriel: 16/02/2008   72
“El Secreto de sus Ojos” – Parte 1   72
GPS, Instrumentos de Navegação e Guias de Viagem   71
SPFC, Pentacampeão Brasileiro: Dentre os grandes, és o primeiro!   71
Corrupção e o Mensalão   71
Em Louvor da Dúvida   71
A traição de Ferreira Gullar   70
50 Anos Atrás: Meu Ano de 1963   70
Como aplicar “o elemento” à aprendizagem escolar   70
Setentinha, como disse a minha irmã…   68
Os múltiplos tentáculos do Estado   68
A Esquerda mais uma Vez Vai à Luta para Defender Dirceu…   68
Brasil: A Primeira Potência de Semiletrados (Gustavo Iochpe na VEJA)   68
Arremetidas   67
Bill Cosby e a responsabilidade pessoal dos negros pobres   67
Relíquias de Tempos Digitais que (Felizmente) não Existem Mais   67
Livros de C S Lewis que eu tenho (22-11-2013)   66
Dudu, the Puff (*)   66
Luís Inácio Lulla da Silva vs Orlando Zapata Tamayo   66
Uma modesta contribuição à estética da aparência feminina   66
Educação e Felicidade   65
Epistemologia da fé – 2   65
Megalivrarias. shoppings, conjuntos de cinemas…   65
Remorso (de Olavo Bilac)   64
Steve Jobs (1955-2011)   64
De Interpretatione – da Lei e Outros Textos (inclusive a Bíblia)   64
Chamando as coisas pelo nome certo: “Ação Afirmativa” é discriminação racial contra os brancos   63
“Afinal, quem faz o quê” em casa?   63
Salvos da Perfeição – 2 (ou: “No limite entre a teologia e a poesia está o ‘O Reino da Delicadeza’. . . “)   63
Vídeo da festa da Abril Educação em 22/03/2011– Parte 1   62
O primeiro banho do Chico   62
E-Books: É só uma questão de tempo; Paper Books: “Your days are numbered”…   62
Gabrielle Anwar   62
Vidas   62
Sobre a arte de desaprender   62
O desafio de uma linguagem objetiva   61
A lista dos 24 vencedores do Oscar   61
Escola e Ensino não são Sinônimos de Educação   61
O mercado (I)   60
Livros Impressos   60
Metadiscussão da presente discussão do aborto   60
Meu Pai, o Rev. Oscar Chaves (1912-1991)   60
O Casamento entre Homossexuais   60
Cutucando o paradigma…   59
A questão da arte “engagée” e “partisanne”   59
Graham Greene e sua biografia   59
Isso não é Liberalismo (Capitalismo)…   58
A Educação das Emoções e da Vontade   58
“Inclusão Universitária”   57
Igualdade   56
O suposto neoliberalismo petista   56
Atores favoritos   55
Infidelidade na Internet   55
“Você não sabe até onde eu chegaria para te fazer feliz”   54
Educação a Distância “Suficientista”   54
A Faculdade de Educação da UNICAMP e o Secretário da Educação   54
Debate entre Valdemar Setzer e Eduardo Chaves na TV Cultura em 28/5/99   54
Prefácio a um livro de Renato Soffner   54
Eu era pobre e feliz… e não sabia   54
Que será de nossos pertences digitais quando morrermos?   53
Taiwan: engraxates, tocos de cigarro no chão, maus espíritos e outras amenidades   53
A esquerda e Cuba: dois pesos e duas medidas   53
45 anos sem Jânio Quadros no cenário político nacional   52
“Se não vos fizerdes como crianças…”   52
Quarenta anos depois do CAOS: 1966-2006 (II)   52
Censura   52
Um Círculo que se Fecha Depois de 40 Anos   52
“Superendividamento”   51
A riqueza e densidade da informação no livro inibe a imaginação   51
Nights in Rodanthe (2008, Noites de Tormenta)   51
Itinerários de Aprendizagem e Trajetórias Intelectuais   50
Os esquemas de corrupção   50
Desemprego, informática, sorte e azar   49
Tecnologia: modem celular   49
Educação e Tecnologia   49
Reflexões não tão fúnebres: relações pessoais e a Internet   49
Carlos Brito e a Inbev   49
Liberdade e Tolerância   48
Oitenta anos da fundação do JMC   48
As explicações da Microsoft sobre o fim do Live Spaces   48
Quarenta anos depois do CAOS: 1966-2006 (I)   48
A tecnologia, a escrita, o cálculo…   48
A autobiografia como um processo de (re)construção do eu   48
About Schmidt: Alguém vai se lembrar de nós quando morrermos?   48
Transdisciplinaridade   48
História do Comunismo nos Estados Unidos   47
Que bom é viver frugalmente — quando isso se dá por escolha e não por necessidade…   47
Educar pode custar caro, mas não educar custa mais caro ainda   47
Inovação: Fruto da Criatividade e da Inteligência   47
Administração do tempo – Entrevista ao site do Padre Marcelo Rossi   47
“I Have a Dream” – 50 Anos   47
O Direito à Privacidade impede que alguém fale ou escreva sobre a pessoa?   47
Educação fiscal   46
Escolas presumidamente bem sucedidas   46
L’amant   46
Pouca vergonha !!! (Parte 1)   45
Windows 8   45
A Igreja como Comunidade Virtual dos Crentes (short)   45
“Et Dieu Créa la Femme…”   45
Os Meandros da Machadada (em parte)   45
EduTec.Net: Possivelmente a primeira comunidade virtual brasileira   45
O Novo não é o Velho Disfarçado: Transformando a Educação e Desprivilegiando a Escola e o Ensino   44
“El Secreto de sus Ojos” – Parte 2   44
Justiça Social, Igualitarismo e Inveja – Parte 2   44
A Economia da Aprendizagem e a Educação Escolar   43
Bielo-Rússia (ou Bielorrússia)   43
Décimo aniversário da criação da EduTec   42
Marcelinho   42
Macau – onde o Ocidente e o Oriente se encontram   41
As fontes de nossos direitos   41
James Patrick Maher, In Memoriam   41
Fotos digitais   41
O que Será do meu FaceBook Quando eu Morrer?   41
Natal: famílias, tradições, transições   40
As falácias da campanha pelo desarmamento   40
Vídeo da festa da Abril Educação em 22/03/2011– Parte 2   40
Os números de 2010   40
A chave da qualidade na área da educação   39
Os Indicados do Oscar 2013 (Português)   39
O Exame da OAB   38
Dom Pedro II   38
Educação e escola   38
Deve a Wal-Mart pagar mais aos seus empregados?   37
Filantropia   37
Cutucando ainda mais o paradigma…   37
Epistemologia da fé – 1   37
“Vitrines de Amsterdã”   37
A Violência em São Paulo   36
10 inovações que afetarão o mundo dos negócios   36
O primeiro discurso de Dilma, depois de eleita   36
Machado de Assis   36
(O Brasil) “Agora, vai!” (Será?)   36
O Homem das Ações Simbólicas   36
A Revolução da Intermediação   36
Escolhas   36
Prefácio a um livro de Arnaldo Niskier   36
O novo Windows Live Space   36
A oração de Jabez   36
Caso Isabela: O Circo Nardoni-Jatobá   36
A Fé, a Esperança e o Amor   35
Do meu jeito (“My way”)   35
Gestão do conhecimento: o conceito   35
No Brasil não há Liberalismo: Há Autoritarismo de Esquerda e de Direita   35
“Há algo de podre no reino da Dinamarca”   35
Os Dois Brasis   34
Educação: conceito, modelos, paradigmas – II   34
A salvação da universidade pública (e da privada!)   34
Uma nova Escola Lumiar   34
Jaci Maraschin, amigo por tabela   34
Mercadores da bondade e da justiça   34
Primavera no sítio   34
A Igreja como Comunidade Virtual dos Crentes   33
Os nus que não têm de que se orgulhar. . .   33
Heróis Discretos   33
O primeiro Natal de que eu (mais ou menos) me lembro   32
Sete anos deste blog!   32
You Needed Me   32
O seu futuro e o do seu país dependem do que você vai fazer agora…   32
Direita e esquerda – de novo   32
Play and Learning: One Brazilian’s Point of View (*)   32
Muros: o de Berlin e os outros…   31
O “bem público” e a “política pública”   31
Que bicho complicado é o ser humano… – 2   31
Ayn Rand, romancista e filósofa   31
Quarenta anos depois do CAOS: 1966-2006 (III)   31
Sonhando com o Impossível. Será?   31
Outono   30
Memória, Verdade e Autobiografias   30
A febre legisferante que assola o país   30
Oito Anos deste Blog   30
Vagabundagem e Bagunça   29
Mudança na Educação   29
Os oitenta anos do Oscar   29

Em São Paulo, 14 de Abril de 2014 (14/4/14)

Hermenêutica — Ou a Ciência e a Arte de Traduzir, Interpretar e Clarear o Sentido

Hoje tenho aula no Centro Universitário Salesiano, em Americana, num seminário sobre Metodologia da Pesquisa que é de responsabilidade de meu amigo (e ex-orientando de Doutorado), Renato Soffner.

O tema que o Renato me deu foi Hermenêutica. Esse é um assunto que sempre me fascinou. O Renato sabe disso, por isso me atribuiu o tema…

“Hermenêutica” é um termo criado a partir do nome de Hermes, um deus grego especializado (os deuses gregos tinham especialidades) em descobrir, esclarecer, interpretar, ou mesmo traduzir o sentido de alguma coisa que não era autoevidente ou aparente.

A coisa, cujo sentido se buscava, podia ser qualquer coisa: um quadro com uma pintura (como Menina com Brinco de Pérola, de Johannes Vermeer), um incidente (como uma interação humana que começa como uma discussão entre duas pessoas e chega aos que se chama de ‘vias de fato’, culminando com a morte de uma das partes), um sonho, ou (mais comum) um enunciado (na forma de algo falado, um dito, como o oráculo de um deus, ou de algo escrito, um texto, como o artigo de uma lei ou uma passagem bíblica).

O processo pode parecer simples. Algumas imaginam que as coisas têm ou não têm sentido, e, quando têm, seu sentido é aparente, autoevidente, dispensando maiores elocubrações. Mas não é assim. Nem sempre o que parece ser é do jeito que parece. Até mesmo a linguagem, criada (supõe-se) para facilitar a comunicação e esclarecer o sentido das coisas, muitas vezes dificulta a comunicação e obscurece o sentido.

Hoje traduzimos (às vezes muito mal) a fala dos filmes (dublando ou colocando legendas), mas não traduzimos o filme. Mas podemos tentar interpreta-lo, descobrir o seu sentido, a sua mensagem… Da mesma forma, não traduzimos uma pintura ou uma escultura, mas podemos tentar interpreta-la. Podemos interpretar a linguagem corporal, mas não efetivamente traduzi-la.

A Hermenêutica que mais me interessa é a aplicada à linguagem — oral e escrita. Por deformação profissional, meu interesse tem se concentrado mais na linguagem escrita: nos textos bíblicos, nos tratados dos filósofos, nos diplomas legais, nos ensaios científicos ou acadêmicos, nas matérias jornalísticas, e, naturalmente, nas obras literárias.

Quando escrevemos — aqui, por exemplo — não podemos nos esquecer de que o texto que produzimos requer interpretação, esclarecimento. Para quem o escreve o texto frequentemente parece tão límpido e evidente que dispensa interpretação, clareamento. . . Mas isso não é verdade. Até um simples “não” pode, em circunstâncias especiais, significar um “sim”. . .

Uma questão que reputo fascinante é se o texto, uma vez produzido, se autocontém, por assim dizer, isto é, se pode ser entendido plenamente contextualização e outras referências externas.

Quando fiz o doutorado, na Universidade de Pittsburgh, fiz um seminário de dois semestres com meu grande mestre Ford Lewis Battle (que também foi meu professor de História da Igreja na Idade Média, no Seminário Presbiteriano de Pittsburgh). O tema era “Crítica de Fontes Escritas”. Ele era professor de história, como mencionei (indiretamente). Um semestre foi dedicado à crítica interna e outro à crítica externa. No primeiro, só se discutia um texto (às vezes mais de um, relacionado), sem sair dele, sem procurar saber quem era o autor, onde vivia, que interesses tinha, que agendas defendia. . . No segundo, o texto era colocado em seu “Sitz im Leben”, em seu contexto social e histórico.

Em sentido não técnico, Sitz im Lebem é o lugar, na vida de uma pessoa, que, quando conhecido, permite que outros entendam melhor algo que ela está dizendo (ou fazendo).

A expressão alemã quer dizer, quando literalmente traduzida, “Lugar na Vida”. Em terminologia mais simples e conhecida, Sitz im Lebem é o contexto. Consta que a expressão foi usada pela primeira vez em sentido mais técnico pelo teólogo alemão Hermann Gunkel, em seu trabalho sobre as diversas narrativas da criação no livro de Gênesis na Bíblia. [Vide Hermann Gunkel, The Legends of Genesis: The Biblical Saga & History (Schocken Books, 1964; reimpressão de uma tradução do Alemão feita em 1901]. Nas três primeiras décadas do Século 20, a expressão se tornou comum no contexto da exegese e interpretação do texto bíblico, tanto do Velho como do Novo Testamento. [Vide o verbete na WikiPedia: http://en.wikipedia.org/wiki/Sitz_im_Leben%5D.

Os estudiosos alemães estavam interessados, naquela época, em entender o contexto em que surgiram e em que foram considerados dignos de preservação os diferentes mini blocos de informação que compõem, hoje, o texto bíblico. A metodologia se estendeu e se tornou popular em relação ao texto dos Evangelhos no Novo Testamento (em especial dos três primeiros, os chamados Sinóticos). Acreditava-se, então, e até hoje ainda se acredita, que o texto final de cada um dos Evangelhos foi apenas uma tentativa de “alinhavar” e “amarrar” vários desses mini blocos (na verdade, mais de uma): genealogias, descrições de fatos isolados, narrativas mais bem sequenciadas, histórias inventadas (as parábolas, por exemplo), conjuntos de ditos isolados (as Bem-Aventuranças, por exemplo), comentários editoriais de quem estava compilando o material, etc. Assim, o sentido mais técnico da expressão Sitz im Lebem se refere, no caso dos Evangelhos, ao lugar (o contexto) na vida de Jesus em que um determinado mini bloco de informação pode ter surgido (a parábola do Filho Pródigo, por exemplo), ou, então, o lugar (o contexto) na vida da comunidade cristã primitiva que explica por que aquele mini bloco de informação veio a ser considerado suficientemente importante para ser preservado para a posteridade. [Vide Rudolf Bultmann e Karl Kundsin, Form Criticism: Two Essays on New Testament Research (Harper & Brothers, 1962, reimpressão de uma tradução do Alemão de 1934].

Além da teologia e da filosofia, sempre gostei de literatura. De cinema, também, mas a literatura sempre me pareceu mais básica. Sem ela, teríamos um número muito menor de grandes filmes. Embora haja bons filmes baseados em roteiro original, a maior parte dos grandes filmes se baseia em obras literárias de sucesso.

Quando era mais moço, ficava intrigado com a criatividade dos autores de ficção. Eu olhava para a minha limitadíssima criatividade – sempre tive enorme dificuldade até para inventar as mentiras mais simples – e ficava abestalhado com a capacidade que os grandes escritores pareciam ter de inventar e depois contar histórias tão complexas, com tantos detalhes envolventes.

Meu gosto pela literatura acabou por me levar a me interessar pela biografia, como gênero literário. No caso da biografia, imagina-se, o autor está delimitado pelos fatos relativos à vida do seu biografado. Mas mesmo assim, fiel aos fatos, ele constrói, criativamente, uma narrativa. (Biografias encomendadas são, naturalmente, um caso à parte).

As biografias mais fascinantes que li (inclusas aqui algumas autobiografias, admitidas ou disfarçadas) foram de pessoas que escreveram ficção (entre outras coisas): Ayn Rand, Graham Greene, Simone de Beauvoir, Arthur Koestler, Gabriel Garcia Márquez, Mario Vargas Llosa, Isabel Allende. . .

Ao ler essas biografias e autobiografias percebi que a criatividade que eu admirava tanto nos autores de ficção não estava necessariamente na invenção de histórias, ex nihilo, como se isso fosse possível, mas, sim, na narração, feita de forma interessante, não raro camuflada, e muitas vezes embelezada, de experiências vividas ou observadas por eles mesmos. Sua criatividade era, a maior parte do tempo, adaptativa em vez de inventiva.

O caso paradigmático que deixou isso eminentemente claro para mim foi o livro The End of the Affair (Fim de Caso), de Graham Greene. Segundo fica claro em uma de suas biografias (Norman Sherry, The Life of Graham Greene, Penguin Books: vol. 1, 1904-1939, publicado em 1989, 783p; vol. 2, 1939-1955, publicado em 1994, 562p; vol. 3, 1955-1991, publicado em 2004, 906p – ao todo, 2.251 páginas!), a narrativa é basicamente autobiográfica. Neste caso, a camuflagem foi tão tênue que Greene, na realidade, foi até processado pelo marido traído no caso que chegava ao fim.

Encontrada a pista, não foi difícil descobrir outros casos. Comecei a me especializar em identificar o Sitz im Lebem – o lugar na vida – dos autores de ficção, as experiências por eles vivenciadas, que acabaram por se tornar romances famosos. Mário Vargas Llosa e Isabel Allende, por serem tão explícitos acerca de detalhes de sua biografia, tornaram esse trabalho bem mais fácil. [Veja-se, por exemplo, La Tía Julia y el Escribidor (Tia Júlia e o Escrevinhador).]

É isso. Já estou começando a viajar… Espero que a aula seja boa. Nunca dou aula no sentido clássico, de ficar falando lá na frente. Isso faço em palestras. Minhas aulas são provocativas e discutitivas.

Em Salto, 14 de Abril de 2014; revisado em 26 de Setembro de 2019.

Igualitarismo Socioeconômico: Uma Analogia

Aproveitando o post anterior, que apresenta uma analogia, aqui vai outra: esta para o igualitarismo socioeconômico. Também foi retirada de um post no Facebook.

Um professor de economia em uma universidade americana disse que nunca havia reprovado um só aluno, até que certa vez reprovou uma classe inteira.

Esta classe em particular havia insistido que o socialismo realmente funcionava: com um governo assistencialista intermediando a riqueza ninguém seria pobre e ninguém seria rico, tudo seria igualitário e justo.

O professor então disse, “Ok, vamos fazer um experimento socialista nesta classe. Ao invés de dinheiro, usaremos suas notas nas provas.” Todas as notas seriam concedidas com base na média da classe, e portanto seriam ‘justas’. Todos receberão as mesmas notas, o que significa que em teoria ninguém será reprovado, assim como também ninguém receberá um “A”.

Após calculada a média da primeira prova todos receberam “B”. Quem estudou com dedicação ficou indignado, mas os alunos que não se esforçaram ficaram muito felizes com o resultado.

Quando a segunda prova foi aplicada, os preguiçosos estudaram ainda menos – eles esperavam tirar notas boas de qualquer forma. Já aqueles que tinham estudado bastante no início resolveram que eles também se aproveitariam do trem da alegria das notas. Como um resultado, a segunda média das provas foi “D”. Ninguém gostou.

Depois da terceira prova, a média geral foi um “F”. As notas não voltaram a patamares mais altos mas as desavenças entre os alunos, buscas por culpados e palavrões passaram a fazer parte da atmosfera das aulas daquela classe. A busca por ‘justiça’ dos alunos tinha sido a principal causa das reclamações, inimizades e senso de injustiça que passaram a fazer parte daquela turma. No final das contas, ninguém queria mais estudar para beneficiar o resto da sala. Portanto, todos os alunos repetiram aquela disciplina… Para sua total surpresa.

O professor explicou: “o experimento socialista falhou porque quando a recompensa é grande o esforço pelo sucesso individual é grande. Mas quando o governo elimina todas as recompensas ao tirar coisas dos outros para dar aos que não batalharam por elas, então ninguém mais vai tentar ou querer fazer seu melhor. Tão simples quanto isso.”

1. Você não pode levar o mais pobre à prosperidade apenas tirando a prosperidade do mais rico;
2. Para cada um recebendo sem ter de trabalhar, há uma pessoa trabalhando sem receber;
3. O governo não consegue dar nada a ninguém sem que tenha tomado de outra pessoa;
4. Ao contrário do conhecimento, é impossível multiplicar a riqueza tentando  dividi-la;
5. Quando metade da população entende a ideia de que não precisa trabalhar, pois a outra metade da população irá sustentá-la, e quando esta outra metade entende que não vale mais a pena trabalhar para sustentar a primeira metade, então chegamos ao começo do fim de uma nação.

Texto adaptado por: Rodrigo Campanini Rubio

Professor que nunca havia reprovado um só aluno

Transcrito aqui em 8 de Abril de 2014

O Sistema Tributário Brasileiro: Uma Analogia

Retirei este post do Facebook, onde foi compartilhado por meu primo, Anello Sanvido, que (a exemplo de um dos personagens da história) se mandou do Brasil — mora no Canadá.

Tributação brasileira explicada com cerveja:

Todo dia 10 homens saiam para tomar cerveja e a conta era R$ 100.

Se eles pagassem a conta da forma como nós pagamos impostos, ficaria

mais ou menos assim:

> Os 4 homens mais pobres não pagariam nada.
> O quinto pagaria R$ 1.
> O sexto pagaria R$ 3.
> O sétimo pagaria R$ 7.
> O oitavo pagaria R$ 12.
> O nono pagaria R$ 18.
> O mais rico pagaria R$ 59.

Assim, foi o que eles decidiram fazer.

Os homens bebiam todos os dias e pareciam muito felizes com o arranjo,até que um dia o proprietário fez uma oferta:

“Vocês são todos bons clientes, e vou reduzir o custo da cerveja em R$ 20. As bebidas custarão somente R$ 80.”

O grupo ainda queria pagar a conta da forma como nós pagamos impostos, de modo que os 4 mais pobres continuariam a beber de graça. Mas … e os outros 6 que eram pagantes? Como dividiriam os desconto de R$ 20 de forma justa ? R$ 20 divididos por 6 = R$ 3,33.

Se subtraíssem isto da quota de cada um, o quinto e o sexto teriam que ser pagos para beber cerveja.

O proprietário do bar sugeriu que seria justo reduzir a conta de cada homem proporcionalmente ao valor pago por cada um, e calculou as quantias que cada um deveria pagar. Assim :

> O quinto homem, como os primeiros quatro, não pagaria nada .
> O sexto pagaria R$ 2 ao invés de R$ 3 (33% de economia).
> O sétimo pagaria R$ 5 ao invés de R$ 7 (28% de economia).
> O oitavo pagaria R$ 9 ao invés de R$ 12 (25% de economia).
> O nono pagaria R$ 14 ao invés de R$ 18 (22% de economia).
> O décimo pagaria R$ 49 ao invés de R$ 59 (16% de economia).

Cada um dos seis que pagavam ficou numa situação melhor. E os quatro primeiros continuavam a beber de graça. Mas, quando saíram do restaurante e começaram a comparar as suas economias, surgiu a crise :

“Eu só ganhei R$ 1 dos R$ 20”, disse o sexto homem. E apontou para o décimo homem, reclamando : “Mas ele ganhou R$ 10 !”.

“Está certo”, exclamou o quinto homem. “Eu também economizei somente R$ 1 . É injusto ele ganhar dez vezes mais do que eu !”.

“É verdade !!” gritou o sétimo homem. “Porque ele deve receber de volta R$ 10 e eu só recebi R$ 2 ? Os ricos levam vantagem sempre !”.

“Esperem aí “, gritaram juntos os 4 primeiros homens. “Nós não ganhamos nada. O sistema explora os pobres !”

Os 9 homens rodearam o décimo , mais rico , e o encheram de porrada !

Na noite seguinte, o décimo homem não apareceu para beber, de modo que os outros 9 tomaram cerveja sem ele. Mas quando chegou a hora de pagar, descobriram que não tinham, entre eles, dinheiro bastante para pagar nem a metade da conta !

E assim que funciona o sistema tributário brazuca. As pessoas que pagam os maiores impostos são as mais beneficiadas pelas reduções de taxas. Taxem elas demais, ataquem-nas por serem ricas, e simplesmente elas podem não aparecer mais. Na realidade, podem beber no exterior, onde a atmosfera e mais amigável (e a cerveja muitas vezes é melhor).

Para os que entendem, não é necessário explicar .

Para os que não entendem, nenhuma explicação é suficiente !!!

É isto.

Transcrito em São Paulo, 8 de Abril de 2014

“Por que não se Resolve a Desigualdade Social no Mundo?”

Na rede social do LinkedIn o Instituto Ethos pergunta: “Por que não se resolve a desigualdade social no mundo?” [visto em 7-4-2014].

Respondi, no LinkedIn e no Facebook, para onde copiei a pergunta:

“Porque o único jeito de resolve-la é tornando todo mundo pobre — e há muita gente que não quer ficar pobre só para que todo mundo fique igual do ponto de vista socioeconômico… Achem um jeito de tornar todo mundo rico que ninguém se oporá à igualdade social.”

Alguém comentou, no Facebook:

“A partir dessa premissa, então deixa tudo como está para ver como é que fica?”

Respondi com os quatro parágrafos que seguem:

“O problema de desigualdade é um falso problema. Ele sempre vai existir — exceto, até certo ponto, em ambientes socialistas totalitários, em que todo mundo fica pobre, EXCETO os encarregados de equalizar as condições socioeconômicas dos outros… Estes sempre se tornam diferenciados, socioeconomicamente. Eles seguem o ditado popular: “Quem parte e reparte e não fica com a melhor parte ou é tolo ou não tem arte”.

O problema real é o da pobreza — mais ainda, o da miséria. Quanto a esse, muito pode e deve ser feito. Mas reduzir a pobreza e eliminar a miséria só é possível com a receita anti-igualitária: a receita liberal na economia, i.e., com um choque capitalista. Nessa sociedade alguns vão ficar podres de rico, é verdade. Mas a miséria desaparece. (A esquerda se nega a admitir, porque fica levantanto o padrão de pobreza ou miséria – a ponto de, em alguns países, se afirmar que o percentual de pobres cresce, embora o limitar da pobreza seja 2.500 dólares. Neste caso, não é a pobreza que cresce: possivelmente seja a desigualdade).

Nessa sociedade liberal-capitalista é preciso haver redes de proteção para emergências: um grande desastre natural, por exemplo. Nos demais casos, a filantropia privada, voluntária, resolve. Nela não há esses “cash handouts” (que chamamos de bolsas): desembolsos de dinheiro que desincentivam o trabalho.

Hoje li, também na rede social do LinkedIn, que estamos vivendo, aqui no Brasil, em uma sociedade de quase pleno emprego. É mentira. Há mais de 60 milhões de brasileiros que deveriam ser considerados desempregados mas não são, porque não estão procurando emprego (e a metodologia diz que é desempregado quem procura emprego e não acha). Esses, que não procuram emprego, são os beneficiários das diversas bolsas. Eles literalmente não trabalham: vivem de renda. Como sua ambição maior não é deixar de ser pobre, mas, sim, deixar de trabalhar, estão contentes: nem procuram trabalho.”

Em São Paulo, 7 de Abril de 2014