Educação Formal Centrada na Aprendizagem do Aluno

Recebi agora de manhã, por gentileza de meu amigo Enézio Eugênio de Almeida Filho, link para um artigo intitulado “Teacherbot: Interventions in Automated Teaching”, de Sian Bayne, publicado em Teaching in Higher Education. O artigo aborda, dentro do tema, vários assuntos interessantes. Um, em especial, me chamou a atenção, porque tem que ver com algo que venho dizendo há uns bons 15 anos, a saber, que a educação formal, quando ocorre, deve ser “centrada no aprendente”, isto é, a tese de que as atividades consciente e deliberadamente organizadas para resultar em aprendizagem devem estar orientadas para os interesses de quem aprende — não de quem organiza essas atividades, qualquer que seja o nome que se lhe dê: professor, mestre, instrutor, tutor, mediador, facilitador da aprendizagem, etc.

Sublinho, no que acabo dizer, a expressão “educação formal, quando ocorre”, e o faço porque a educação da maior parte das pessoas, naqueles aspectos que mais importam, não acontece através da chamada “educação formal”, mas, sim, através das diferentes dimensões do que se pode chamar de “educação não-formal”. Em seu sentido mais genérico, esta é simplesmente a educação que não é formal.

Ilustro.

Quando abri meu computador hoje cedo, e entrei no Facebook, ele me informou de que dois anos atrás, no dia 16/5/2013, eu havia postado uma citação da escritora Tatiana Belinky, em que ela comentava como a educação mudou sua vida. Dizia:

“A própria existência dos meus pais me educou. Eles não me ensinavam nada. Eu via tudo. Lia e ouvia. Todo mundo lia e todo mundo conversava. Meus pais nunca me apontaram: faça isso, faça aquilo, era a vida de todo dia que era assim, educacional, naturalmente. Você me pergunta o que é Educação e não dá nem para responder. É só tudo!”.

Talvez seja coincidência, talvez seja providência. Melhor ainda, talvez seja o que chamo de “provincidência”, uma mistura das duas coisas, ou, simplesmente, um nome que a gente dá quando não sabe se se trata de uma ou da outra. Eu, especificamente, nunca sei. Mas o Enézio e o Facebook, cada um com seus interesses e com suas intenções, colocaram esses dois textos na minha frente hoje cedo. Do meu ponto de vista, foi provincidência.

A citação de Tatiana Belinky me fez lembrar de outra citação, esta de Paulo Freire, em que ele diz, de forma (no meu entender) muito feliz, o seguinte (as palavras são em parte minhas, porque cito de memória):

“Ninguém educa ninguém; mas tampouco alguém se educa sozinho. Nós nos educamos uns aos outros, em comunhão, mediatizados pelo mundo.”

Ou seja:

Os que estão por trás dos diversos programas de educação formal (professores, mestres, instrutores, tutores, mediadores, facilitadores da aprendizagem, etc.) podem encher o peito e se chamar de educadores profissionais — mas não é isto que são, segundo Paulo Freire, porque “ninguém educa ninguém”. Ninguém educa ninguém assim de modo formal, consciente, intencional, deliberado. A gente, a maior parte do tempo e no que realmente importa, se educa um ao outro de maneira não-formal, inconsciente, não-intencional, não-deliberada, simplesmente interagindo (o mais das vezes com outras intenções), com quem nos cerca, vendo-os, ouvindo-os, falando com eles, diretamente ou através de livros, de revistas, de jornais, do rádio, da televisão, da Internet, do Facebook… Exatamente assim como nos diz a Tatiana Belinky. Educamo-nos um ao outro simplesmente “comungando” uns com os outros, isto é, conversando, dialogando, lendo, escrevendo, discutindo, debatendo, colaborando (fazendo coisas juntos), vivendo juntos, convivendo, enfim, aprendendo juntos nesse magnífico ambiente educacional que é o mundo, tendo ao fundo o cenário genuíno de toda educação que vale a pena, a vida (não, necessariamente, a escola — embora a escola seja uma pequena parte da vida, e possa se tornar tão mais importante quanto mais semelhante à vida ela for).

o O o

Mas voltando ao artigo que me enviou o Enézio. “Teacherbot” quer dizer robô que ensina, robô didático. O tema do artigo é “Automated Teaching”, Ensino Automatizado. Em suma, o autor discute se podemos ser ensinados (e, assim, vir a aprender, ser educados) de forma automática, por um robô.

Não vou entrar no mérito dessa questão, porque ela me entedia. Vou discutir apenas algo que o autor menciona mais ou menos en passant, como se fosse entre parênteses. Trata-se da tese de que “na educação a linguagem da aprendizagem deve prevalecer sobre a linguagem do ensino” — tese que, no entender de alguns, acaba por “marketizar o discurso pedagógico”, “instrumentalizando a educação”, “desagregando o ensino e o reduzindo a nada mais do que facilitação ou apoio à aprendizagem”. Essa tese, ainda no entender de alguns, “desprofissionaliza o ensino” e “abre as portas para que o ensino automatizado possa entrar na escola e oportunamente substituir o professor”, realizando, assim, o “sonho tecnocrático”.

A raiz dessa tese está na afirmação de que a educação formal deve estar sempre “centrada no aprendente”. (Digo “educação formal” porque a educação não-formal sempre está centrada no aprendente). Os críticos da tese discutida no parágrafo anterior e da dessa afirmação acham que esse “modo discursivo subavalia o papel do professor ou até mesmo o deixa fora da equação”.

Os críticos citam um artigo publicado pela National Science Foundation (Fundação Nacional de Ciência) que afirma:

“Sugerimos que, dentro de poucas décadas, a educação se tornará personalizada, porque se harmonizará com as principais características do aluno, como, por exemplo, sua personalidade e seu estilo de aprendizagem, e com seus estados de espírito, como sua disposição afetiva, sua motivação, o nível de seu envolvimento. Ferramentas computacionais aferirão quais seus pontos fortes e fracos, quais as áreas em que ele tem problemas, qual seu estilo motivacional — e o fará isso tão bem quanto qualquer tutor humano. As tecnologias disponíveis para produzir esse tipo de instrução personalizada incluem modelos do usuário, ambientes inteligentes, ambientes lúdicos, e data mining (‘mineração de dados’)”.

Nenhum comentário dos críticos ou do autor sobre o fato que se sugere, nessa citação, que a personalização da educação se dará através da “instrução personalizada” — quando estávamos falando de aprendizagem, não de instrução ou ensino, da tese de que a educação formal deve estar sempre centrada na aprendizagem do aluno — e não no ensino ou na instrução do professor (ou equivalente).

O autor do artigo que estou analisando (o que me enviou o Enézio) tenta tucanamente fazer a media com a oposição e a situação afirmando que está longe dele afirmar que“o uso e métodos automatizados na educação seja indesejável”. Longe disso. O problema, afirma ele, está no fato de que “os termos em que esses métodos são propostos são dirigidos por um solucionismo orientado para a produtividade que vem sendo criticado já faz décadas”. Segundo o autor, quando isso acontece “é preciso resistir a esses métodos”, enfatizando que “o toque humano”, “a humanidade desejável”, “os relacionamentos humanos” são o “locus principal” a partir do qual é forçoso resistir “ao frio imperativo tecnocrático”. Ele sugere que o referencial teórico proposto pelo “pós-humanismo crítico e outras áreas anti-antropocêntricas dentro das humanidades e das ciências sociais” podem fornecer uma “base adequada” para “a construção de uma experimentação pedagógica responsável”. O que ele chama de uma “perspectiva pós-humanista” se reduz, no final dessa discussão, “a tentar usar visão dupla: ver o humano e o não-humano ao mesmo tempo”.

Pode? Essa baboseira “pós-modernista” e pseudo-intelectual se resume a “ver o humano e o não-humano ao mesmo tempo”. Quem jamais disse, no “pré-pós-humanismo” (isto é, no “humanismo”, isto é, numa visão moderna e liberal), que era impossível ver o humano e o não-humano (a técnica, a tecnologia) ao mesmo tempo?

Engana-se o autor do artigo que a alternativa seja usar apenas o ser humano para ensinar e instruir, sem tecnologia, ou usar apenas tecnologia para ensinar (robôs didáticos), sem o ser humano (o que ele chama de “ensino automatizado”).

No processo de discutir essas besteiragens o autor do artigo se esquece da tese que havia se proposto discutir na seção que me interessou: a tese de que “na educação a linguagem da aprendizagem deve prevalecer sobre a linguagem do ensino”. Eu, pessoalmente, não tenho a menor dúvida de que essa tese é verdadeira e merece toda nossa atenção e o nosso endosso.

Na educação não-formal (como a que Tatiana Belinky menciona) não há a menor dúvida de que a aprendizagem prevalece sobre o ensino.

A educação ativa, interativa, colaborativa, e, portanto, fatalmente dialógica, e a única que resulta em aprendizagem significativa, também não há a menor dúvida de que a aprendizagem prevalece sobre o ensino — onde quer que essa educação se realize, em contextos formais ou não-formais.

A aprendizagem só não prevalece sobre o ensino na escola — onde se presume que o aluno só aprende se for ensinado por um professor (ou equivalente), uma besteira de tal tamanho que basta enunciar a tese para qualquer um (exceto professores) concluir que ela é falsa, e, pior do que isso, também nociva e prejudicial à verdadeira aprendizagem, que vai muito além de assimilar e absorver o que outros acham que a gente deve assimilar e aprender e que, a maior parte do tempo, não têm a menor relevância ou utilidade para aquilo que realmente nos interessa.

A educação existe para que seres humanos — que nascem não sabendo fazer nada e não sabendo nada, e, por isso, são totalmente dependentes (inautônomos) por um bom tempo — se tornem competentes (adquiram competências ou construam capacidades). Porque nascem com uma programação genética mínima e aberta, e uma enorme capacidade inata de aprender, os seres humanos são capazes de, tendo adquirido algumas competências, escolher ou definir para si próprios um projeto de vida e de procurar transforma-lo em realidade, passando a ser, não só competentes, mas, também, autônomos.

Competência e autonomia se alcançam da forma indicada por Tatiana Belinky e Paulo Freire. É uma besteira gigantesca afirmar, em adesivos ou alhures, que a gente nunca chegaria a assinar o nome, quanto mais ser médico, engenheiro ou advogado, se não tivesse frequentado escolas e aprendido com professores. A escola moderna é relativamente recente. E professores “profissionalizados e sindicalizados”, mais recentes ainda. É crível que ninguém nunca tenha aprendido nada, e nunca aprendido a fazer nada, antes da existência dessa instituição e desses profissionais?

Ivan Illich, que era amigo de Paulo Freire e que possivelmente concordaria 100% com Tatiana Belinky, queria, em 1970, uma sociedade sem escolas, desescolarizada, em que a gente aprenderia e aprenderia a fazer tudo o que fosse necessário em interações colaborativas horizontalizadas e não-formais.

Note-se que Illich escreveu antes da revolução dos microcomputadores, antes da Internet, antes da Web, antes das redes sociais. O potencial para que aquilo que ele propôs — em 1970, para ser feito face-a-face — seja hoje feito (também) através da tecnologia é enorme. Mas não será a tecnologia de robôs didáticos e de ensino automatizado que fará isso: será a tecnologia de comunicação e acesso à informação que está aí nas mãos e no bolso de cada um, o computador personalíssimo que se disfarça de telefone celular…

E essa educação é, sim, centrada no aprendente. Não poderia ser diferente. E isso não é nada pós-moderno, pós-humanístico. É um procedimento tão simples quanto os que descreve Tatiana Belinky.

Bem disse o Rubem Alves que professor que tem medo de perder seu emprego para um computador (ou um robô didático) merece perde-lo. A gente se vira sem eles.

Em São Paulo, 16 de Maio de 2015.

Tecnologia e Educação: Um Recorte Biográfico

1. Os Primórdios

Comecei a me interessar pelo papel que a tecnologia pode desempenhar, e tem desempenhado, na educação — mais particularmente, na aprendizagem — a partir de acontecimentos fortuitos que só em retrospectiva se entrelaçam.

Transcrevo aqui passagens de um artigo que escrevi quando da morte de Steve Jobs e publiquei, primeiro, no Blog da Editora Ática, e, depois, aqui, no meu próprio blog, Liberal Space (as partes em colchetes foram acrescentadas agora, 7 de Fevereiro de 2015):

“ Meu primeiro contato com um microcomputador remonta a esses tempos: conheci um Apple II por volta de 1979, através de um colega da UNICAMP, especialista em Linguística Computacional (algo que eu nem sabia que existia) [Frank Roberts Brandon era o nome dele. Infelizmente, morreu cedo]. O equipamento em si me chamou a atenção, mas quando ele me demonstrou as aplicações da linguagem de programação ProLog (Programming in Language) para o aprendizado de Lógica, eu me encantei. Ali na hora tomei a decisão de comprar um equipamento daqueles quando pudesse… [Comprei um Commodore 64 um ano depois, numa viagem aos EUA, e, logo depois, um clone brasileiro do Apple II, feito pela Unitron. Interpretadores de ProLog tive vários, mas gostava mais do Borland Turbo Prolog]. Até hoje, cerca [mais] de 30 anos depois, ainda guardo o meu clone brasileiro do aparelho fabricado pela Unitron. [E em minha biblioteca pessoal possuo mais 30 livros sobre ProLog.]”

Na época eu era Diretor Associado da Faculdade de Educação da UNICAMP. No ano seguinte, em Abril de 1980, assumi a direção da Faculdade de Educação da UNICAMP, no auge dos meus 37 anos. Uma das primeiras coisas que me caiu em mãos foi um pedido de apoio financeiro feito à FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos) assinado por meu melhor amigo, na ocasião, Raymond Paul Shepard, especialista em psicologia cognitiva, e meu colega na Faculdade de Educação (ele era membro do Departamento de Psicologia da Educação, eu do Departamento de Filosofia da Educação da faculdade). O projeto era assinado também por Fernando Curado, professor de computação no que era então Departamento de Computação do Instituto de Matemática, Estatística e Ciência da Computação, outra unidade acadêmica da UNICAMP. (Hoje o departamento é um instituto com vários departamentos).

Interessei-me pelo assunto do projeto: o papel que o computador pode desempenhar na aprendizagem da criança. Os dois pesquisadores se propunham investigar o uso da linguagem de programação LOGO, criada por Seymour Papert, então do Media Lab do Massachusetts Institute of Technology (MIT), na aprendizagem e no desenvolvimento cognitivo de crianças relativamente pequenas — na fase anterior ao que hoje se chama de Fundamental II da Educação Básica. Confesso que fiquei encantado com o que li.

Foram esses os meus dois primeiros contatos com o tema “Educação e Tecnologia”. Primeiro, envolvendo ProLog; depois, LOGO. Em 1979 e 1980.

A partir daí comecei a conversar diariamente sobre o assunto com o Paul (corríamos juntos diariamente na hora do almoço pela Cidade Universitária), comecei a mergulhar na literatura, e li o livro Mindstorms: Children, Computers and Powerful Ideas, de Papert (que acabava de ser publicado em 1980). Achei o livro fascinante, em especial porque, ao tratar do potencial do computador, e da linguagem LOGO em particular, na aprendizagem da criança, Papert descortinava uma pedagogia diferente, centrada no aluno, na aprendizagem, na descoberta, na vida, no mundo e não (como na pedagogia convencional) no professor, no ensino, na instrução, na aula, na escola. . .

Comecei a caçar gente interessada nos dois assuntos: computadores na educação (particularmente na aprendizagem) e pedagogias não-convencionais (ou, como se prefere hoje, pedagogias inovadoras).

Em 1981 o MEC — Ministério da Educação (então Ministério da Educação e Cultura) resolveu, em parceria com a SEI — Secretaria Especial de Informática, fazer uns encontros sobre Informática na Educação (forma em que o assunto acabou sendo batizado no Brasil). O primeiro foi em Brasília, em Agosto de 1981, e o segundo em Salvador, um ano depois. Participei apenas do segundo deles (pois quando o primeiro aconteceu eu estava como Professor Visitante na Bowling Green State University, em Bowling Green, OH, sobre História da Educação Brasileira) e ali, naquele encontro, fiquei conhecendo muitos dos que se tornaram pioneiros nessa área no Brasil, oriundos de outras universidades brasileiras: Samuel Pfromm Neto (USP, depois PUCCAMP), falecido em 2012, Lea Fagundes e Lucila Santarosa (UFRGS), Fernando José de Almeida (PUC-SP), Paulo Gileno Cysneiros (UFPE), Lydineia Gasmann e Riva Roitman (UFRJ), Antonio Mendes Ribeiro (UFMG), etc. Da UNICAMP foram, além de mim, Vilmar Faria (do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas), falecido em 2001 (quando era assessor do FHC), Cecília Callani (depois Baranauskas) e Heloísa Vieira da Rocha (ambas do Instituto de Matemática, Estatística e Ciência da Computação), e, da Faculdade de Educação, além de mim, Amélia Americano Domingues de Castro e Afira Vianna Ripper.

Em decorrência desses encontros foi lançado em 1983 o Programa EDUCOM, que fez um chamado às universidades brasileiras para que submetessem projetos na área de Informática na Educação. Vinte e seis projetos foram submetidos. Eu coordenei a elaboração do projeto da UNICAMP, que contou com a participação dos nomeados atrás, da Universidade. Quando saiu o resultado, cinco universidades tiveram seus projetos aprovados: quatro federais (UFPE, UFMG, UFRJ e UFRGS) e uma estadual (nós, da UNICAMP). Recebemos financiamento da FINEP para tocar o projeto, que coordenei de 1983 a 1986, quando fui trabalhar na Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (mediante autorização e afastamento da UNICAMP).

Para submeter e, depois, implementar o Projeto EDUCOM da UNICAMP, propus ao então reitor, José Aristodemo Pinotti, em 1983, a criação de um centro interdisciplinar de pesquisa na área de Informática na Educação. Dei-lhe o nome de Núcleo de Informática na Educação (NIED). Ele foi efetivamente criado ainda em 1983, e eu fui designado seu Coordenador, função que ocupei até 1986, e da qual me desliguei pela razão já indicada. O NIED existe até hoje. Sucedeu-me na Coordenação do NIED o professor José Valente, que, em 1986, retornava à UNICAMP depois de cerca de sete ou oito anos no exterior, fazendo seu Doutorado.

No NIED, enquanto eu era coordenador, fizemos parceria com duas escolas de Campinas e uma de Americana, traduzimos Mindstorms para o Português (sendo a principal responsável pela tradução Beatriz Bittelman, que trabalhava no NIED), e desenvolvemos uma versão da Linguagem LOGO para o Sistema Operacional CP/M dos computadores I-7000 da Itautec (sendo responsáveis por esse projeto principalmente Heloísa Vieira da Rocha e Cecília Callani Baranauskas, que também haviam se integrado ao NIED).

Historiei em bem mais detalhe o processo de criação do EDUCOM no primeiro capítulo, que teve o título “O Computador na Educação”, que escrevi para o livro Educação e Informática: Projeto EDUCOM – Ano I, publicado pela Fundação Centro Brasileiro de Televisão Educativa (FUNTEVÊ), Rio de Janeiro, 1985.

Antes disso, porém, escrevi um artigo, em 1983, mais de trinta anos atrás, do qual muito me orgulho até hoje: “Computadores: Máquinas de Ensinar ou Ferramentas para Aprender”. O artigo foi publicado na revista Em Aberto, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), Brasília, DF, 1983.

Nesse artigo esboço, de forma tão clara quanto me foi possível, naquela época, duas filosofias da educação: uma, centrada no professor, no ensino, nos conteúdos programáticos a serem transmitidos pelo professor ao aluno; a outra, centrada no aluno, na aprendizagem, nos processos de investigação e descoberta a serem desenvolvidos pelo aluno com o apoio e a facilitação de terceiros (em especial, na escola, do professor). A primeira dessas duas filosofias da educação nos leva a ver o computador como uma “Máquina de Ensinar”; a segunda, como uma “Ferramenta de (para) Aprender”.

Os defensores no século 20 da primeira filosofia da educação vieram a criar a funesta proposta de “Instrução Programada”, na época inspirada pelo behaviorismo de B. F. Skinner, e viram no computador a solução de todos os seus problemas. Propuseram, imediatamente, a não menos funesta “Computer-Assisted Instruction”, em que o computador não passa de uma Máquina de Ensinar autônoma — ou uma máquina que ajuda o professor a ensinar, vale dizer, que assiste o professor no mister de ensinar.

Os defensores no final do século 20 da segunda filosofia da educação, com a qual eu me identifiquei inteiramente (e ainda me identifico), uniram-se atrás de Seymour Papert na defesa das diversas formas de “Computer-Mediated Learning”, entre as quais a programação do computador (usando LOGO ou outras linguagens de programação) parecia uma alternativa bastante interessante. Para Papert, que nisso seguia Jean Piaget, com quem havia estudado em Genebra, não se aprende, significativamente, quando se é objeto de um processo de ensino de terceiros. Aprende-se, significativamente, quando se encontra um problema que parece intrigante, instigante, e, por isso, interessante, e se propõe a resolve-lo. O enfrentamento de problemas intrigantes, instigantes e interessantes desemboca na descoberta ou na invenção de estratégias para resolve-lo — e essas estratégias em regra são aplicáveis a inúmeros outros contextos. Programar um computador para que ele faça alguma coisa útil e interessante é um desses megaproblemas. O processo de programa-la é, na verdade, o processo de ensinar a ele como fazer o que se pretende que ele faça. Quando o aluno programa o computador, portanto, ele não está sendo vítima ou paciente de um processo de ensino de terceiros, mas está sendo o sujeito ativo de um processo de ensino voltado para o computador… Para ensinar o computador a fazer algo, é preciso que o aluno descubra ou invente como se faz essa coisa e encontre formas de transmitir o seu saber ao computador usando linguagem (vocabulário e sintaxe) que o computador consiga interpretar. . .

Até hoje me entusiasmo ao relatar essa inversão de processo, essa verdadeira “Revolução Copernicana” que Papert, inspirado por Piaget, propôs em seu livro de 1980 (e mesmo antes, quando estava ruminando suas ideias).

2. A Evolução das Ideias

A melhor forma de aprender, diz um provérbio pedagógico tradicional, é ter de ensinar. Mas só que quem aprende, dentro dessa visão, é quem ensina — não quem é vítima ou paciente do processo de ensino, o aluno. . .

Qual a saída? Foi nesse contexto que descobri, primeiro Ivan Illich, depois Paulo Freire, que, no exílio, foi um grande amigo de Illich.

Abrindo um parêntese a propósito de Paulo Freire, no final de 1979, eu, ainda como Diretor Associado da Faculdade de Educação, me empenhei, direta e pessoalmente, em trazer Paulo Freire para a UNICAMP, iniciativa proposta inicialmente por meu amigo Moacir Gadotti e assumida pelo meu também amigo Antonio Muniz de Rezende, Diretor da faculdade, do qual eu era Diretor Associado. Paulo Freire ainda estava exilado em Genebra (onde convivia com meu grande amigo Aharon Sapsezian) e a Lei da Anistia acabava de ser aprovada. Quase perdi meu cargo pelo meu envolvimento (e por uma certa dose meio exagerada de entusiasmo e “estabanamento” de minha parte) — e, no final de 1979 e início de 1980, quando fui unanimemente escolhido pela comunidade da Faculdade de Educação para substituir Rezende na direção (pois ele concluía seu mandato de quatro anos), minha nomeação foi engavetada durante quatro meses pela Reitoria, até que a pressão da comunidade se fez sentir e o Reitor me nomeou para o cargo e Paulo Freire acabou vindo para a Faculdade de Educação da UNICAMP, já no meu mandato (embora não tenha ficado conosco em tempo integral: tivemos de dividi-lo com a PUC-SP). Fim do parêntese.

Ivan Illich propôs, em seu livrinho Deschooling Society, de 1971, traduzido para o Português como Sociedade sem Escolas, uma sociedade em que não há escolas nem professores profissionais, mas em que todos ensinam uns aos outros e todos aprendem uns com os outros. A hoje famosa Escola da Ponte (mas que só vim a conhecer depois que o Rubem Alves a revelou) pratica isso. Nela há cartolinas nas paredes com dois cabeçalhos diferentes. Numa cartolina se inscrevem aqueles que desejam ter ajuda no aprendizado de algo. O cabeçalho é algo assim: “Preciso de ajuda para aprender . . .” (e lista-se aquilo que se deseja aprender) . Na outra se inscrevem aqueles que se dispõem a ajudar os outros a aprender algo que eles conhecem ou sabem fazer bem. O cabeçalho é algo assim: “Estou disponível para ajudar quem queira aprender . . .” (e lista-se aquilo que pode ser o objeto de desejo, em termos de aprendizagem, do outro). A escola é o ambiente em que se encontram uns e outros. O modelo de Illich era mais ou menos isso, em última instância, só que não dentro de uma escola, mas no âmbito da sociedade como um todo.

Paulo Freire, em seu livro Pedagogia do Oprimido, de 1979, que é o local em que ele sistematiza sua crítica da “educação bancária”, chega a ridicularizar a noção de que o processo de aprendizagem é algo como uma quantia em dinheiro que se transfere da conta (ou da cabeça) do professor para a conta (ou a cabeça) do aluno, processo em que o aluno é totalmente passivo, mero recipiente dos depósitos de informação e conhecimento que lhe faz o professor.

Seguindo a intuição do provérbio popular (e de Papert, de quem também se tornou amigo), Freire propôs uma ideia genial e revolucionária nesse seu livro: “Ninguém educa ninguém”. Chocante para quem lê pela primeira vez e se acredita um educador. Mas ele acrescenta: “Tampouco alguém se educa sozinho”. E arremata: “Nós nos educamos uns aos outros, em comunhão, mediatizados pelo mundo”.

Esse insight me pareceu genial… Melhor do que aprender ensinando algo bobo (desenhar uma casinha, por exemplo) a uma máquina burra e inflexível (que é o caso do computador), é aprender ensinando algo interessante a pessoas interessadas, inteligentes e flexíveis e ser objeto do ensino delas em áreas que nos interessam e em que elas sabem mais do que nós. Esse me pareceu ser o modelo (algo simplificado) proposto por Illich e aquilo que Freire designou como “comunhão” (interação, diálogo, troca de ideias) “mediatizada pelo mundo”.

A essas alturas a tecnologia disponível já havia avançado o suficiente para que pudéssemos criar “grupos de discussão” na Internet — comunidades virtuais dedicadas (entre outras coisas) a aprender algo de interesse, através da interação, do diálogo, da discussão, vale dizer, da comunhão…

Meu primeiro ensaio nessa área foi criar uma dessas comunidades virtuais numa rede chamada BitNet, que antecedeu, no Brasil, a chegada da Internet. A comunidade se chamava InfEdInformática e Educação. O experimento foi limitado mas relativamente bem sucedido até que meu amigo Valdemar W. Setzer, arqui-inimigo do uso da tecnologia por pessoas de menos de 15-16 anos, conseguiu implodir a comunidade. Minha inexperiência na moderação dela me impediu de bloquear o processo de implosão em tempo.

Mais tarde, em 1998, com apoio da Microsoft, criei, agora na Internet (Yahoo! Groups), outra comunidade: EduTec.NetRede de Educação e Tecnologia. Essa durou bem mais tempo, chegou a ter quase 1.500 participantes, e foi unanimemente considerada uma experiência bem sucedida. Há pelo menos uma dissertação de Mestrado e um trabalho de fim de Curso de Especialização escritos sobre ela. Fechei-a em 2001 quando ela começou a ser explorada para fins políticos e ideológicos por alguns de seus membros.

Em decorrência dessa experiência com a EduTec.Net acabei por ser indicado, pela Microsoft, para o Instituto Ayrton Senna, que montava, com apoio da Microsoft, um programa de formação de professores e alunos para uso da tecnologia no processo de aprendizagem: o Programa Sua Escola a 2000 por Hora (que hoje se chama, creio, Escola Conectada).

No Instituto Ayrton Senna fui incumbido por minha amiga Adriana Martinelli (hoje Carvalho), de criar um modelo de programa de formação a distância, usando a Internet. Foi nessa ocasião que, em discussão com a equipe do Instituto, criei a expressão “Experiência de Aprendizagem Colaborativa (EAC)” para dar nome à coisa. Não queria chamar o programa de formação de uma série de “cursos”, porque curso imediatamente chama à mente as ideias de conteúdo, professor e ensino. A expressão escolhida enfatizava o fato de que a ênfase estava na aprendizagem, não no ensino, e que a aprendizagem deveria se dar de forma colaborativa, isto é, envolvendo interação, troca de ideias, diálogo, discussão.

Com o tempo a minha visão foi se expandindo e tornando mais abrangente.

Um grande valor da educação que eu encontrava e admirava em Sócrates estava no fato de que ela era personalizada (além de dialógica). Ou seja: o diálogo de Sócrates não era pautado por ele, mas por seu interlocutor. Este vinha a Sócrates com um problema ou uma questão e a discussão partia do interesse dele, não dos interesses de Sócrates. O grande filósofo ateniense se via, modestamente, como uma parteira, que ajuda os outros a dar à luz (ou a construir, para usar uma noção mais atual) conceitos (concepções!) e ideias, mas que é, ela própria, estéril . . .

Assim, concluí que não basta que a aprendizagem seja colaborativa: ela também precisa ser personalizada, isto é, ancorada nos interesses (nos projetos e sonhos!) do aprendente. Assim, mudei o acrônimo de EAC para APEC — Aprendizagem Personalizada e Colaborativa. 

Mas a experiência de 1998 me mostrou que um ambiente totalmente aberto e desestruturado frequentemente leva a resultados não desejados. Para que aprendamos de forma efetiva, isto é, eficaz (aquilo que de fato queremos aprender) e eficiente (sem desperdício de recursos, dos quais o tempo talvez seja o mais importante), é necessário que os ambientes de aprendizagem, em especial os virtuais, sejam estruturados para esse fim e que as atividades desenvolvidas sejam planejadas para esse fim. Assim, completei o acrônimo, que se tornou APECAVE — Aprendizagem Personalizada e Colaborativa em Ambientes Virtuais Estruturados.

3. O Amadurecimento das Ideias

Meu trabalho como consultor da Microsoft e do Instituto Ayrton Senna ao longo de cerca de 15 anos (1998-2013) me comprovou uma tese que eu havia proposto mais de dez anos antes de começar a trabalhar nessas duas fantásticas instituições.

A tese era a seguinte: O maior impacto que as tecnologias digitais vão ter na educação virá através do atacado, isto é, por meio das mudanças que essas tecnologias vão tornar possíveis na sociedade, não através do varejo, isto é, por meio dos usos específicos da tecnologia dentro da escola e, em especial, na sala de aula.

Eu enunciei essa tese pela primeira vez num livro que publiquei em 1987 em parceria com o Waldemar V. Setzer, que teve o título O Uso de Computadores em Escolas: Fundamentos e Críticas (publicado pela Editora Scipione e lançado pela Livraria Cultura num concorrido coquetel naquele ano).

Uma das mudanças mais chocantes que essas tecnologias produziram na sociedade foi transforma-la de uma condição de penúria para uma condição de superabundância na área de informações e conhecimentos. Até o aparecimento e a popularização das tecnologias digitais, a informação e o conhecimento eram escassos e o acesso a eles, difícil e trabalhoso. Hoje vivemos, a bem dizer, soterrados debaixo de informações e conhecimentos e o acesso a essa quantidade quase infinita de informações e conhecimentos está na ponta de nossos dedos, sendo fácil, rápido e qualquer coisa menos penoso.

Tradicionalmente, o papel das escolas e dos professores era, de certo modo, preservar e custodiar o montante relativamente pequeno de informações e conhecimentos considerados valiosos e transmiti-lo ou entrega-lo para as gerações futuras.

Mas hoje essas informações e esses conhecimentos, em quantidades antes inimagináveis, estão preservados e são custodiados fora da escola, e ninguém precisa transmiti-los a ninguém, porque eles estão disponíveis “na nuvem” para quem tiver interesse em busca-los e deles se valer.

O problema maior, hoje, não é, a preservação e a transmissão desse legado, mas, sim, o que se pode fazer com tamanha quantidade de informações e conhecimentos.

Em outras palavras: o foco deixa de estar no saber e passa para o saber fazer — ou seja, deixa de estar em informações e conhecimentos e passa para habilidades e competências.

O importante, hoje, não é o que devo saber, mas o que devo saber fazer, que habilidades e competências devo desenvolver para definir e realizar meu projeto de vida, para fazer de mim aquilo que eu posso, quero e devo me tornar.

John Dewey já havia prenunciado esse tema. Mas hoje ele se tornou imperativo.

4. É Possível Personalizar a Educação para Todos?

Estou totalmente convicto de que nenhum educador sério e em sã consciência, podendo escolher entre, de um lado, uma educação personalizada (ajustada aos interesses e às necessidades de cada um), significativa, autonomizadora, emancipadora, libertadora, e, de outro lado, uma educação de massa (em que um tamanho deve servir para todo mundo), sem sentido, automatizadora, enquadradora, escravizadora, vá escolher a segunda.

O que acontece é que, embora tenha preferencia pelo primeiro tipo de educação, a maior parte dos educadores acha que não há como, realisticamente, disponibiliza-la para todos, a educação de massa sendo, lastimavelmente, a única forma viável de educar.

Tenho defendido a tese, nos últimos quatro ou cinco anos, de que as redes sociais tornadas possíveis pela tecnologia apresentam um modelo de educação personalizada para todos (sem massificação).

Há muito trabalho ainda a ser feito para que as redes sociais se tornem verdadeiramente educativas. Quando se tornarem, teremos alcançado o paradigma da sociedade educativa — teremos adotado a pedagogia socrática em escala.

É neste ponto que me encontro hoje em relação à questão da tecnologia e da educação.

O desafio não é nem de longe tecnológico. É pedagógico. Ele não exige competência técnica no manejo da tecnologia. Ele exige criatividade e inteligência no âmbito da pedagogia.

5. Um Mundo Diferente é Possível na Educação

Ontem tive prova cabal de que um mundo diferente é possível na educação. Assisti a uma palestra inspiradora e desafiadora do professor Manoel Andrade Neto.

A aparência do Manoel já é, como dizem os americanos, um sopro de ar fresco. Ele não é um engravatado bonito e bem nutrido que acabou de fazer seu MBA numa escola de elite e que se veste na moda. É um senhor de 55 anos, magrinho, de ar despretensioso, que se veste e fala como a gente do povo. Mas quando ele começa a falar, você não quer mais parar de ouvir…

Manoel é professor de Química na Universidade Federal do Ceará (UFC), onde fez seu bacharelado, mestrado e doutorado. Mas não foi lá que ele aprendeu o que sabe, porque lá, e em nenhuma outra universidade que eu conheço, não se aprende o que ele aprendeu. O que aprendeu ele aprendeu na vida — “na acre escola da vida”, não “na doce vida da escola”, como um dia escreveu um poeta aqui do lado, de Americana (Antonio Zoppi).

O projeto inicial dele teve origem décadas atrás, lá no sertão do Ceará, num lugar chapado Cipó, na cidade de Pentecoste. Já ouviu falar desses lugares? Eu não havia ouvido — e, sem saber, era mais pobre por não ter ouvido. A ideia do projeto surgiu quando o Manoel nem sequer sonhava com a ideia de ir para uma universidade (que ele nem sabia direito o que era). O projeto se chamava PRECE (nome que sugere que o Manoel tem raízes “crentes”, o que de fato é verdadeiro): “Projeto Educacional Coração de Estudante” (com a devida permissão do Milton Nascimento). Depois o nome se alterou um pouco, mas o acrônimo permaneceu: “Programa Educacional por Células de Estudo”. Deem uma olhada no site http://prece.ufc.br/.

Para minha surpresa, a Fundação Mary Harriet Speers, de minha igreja, é uma das apoiadoras do projeto, sendo essa uma das razões pelas quais o Manoel foi convidado a falar na Faculdade de Teologia da igreja ontem à tarde. Até hoje também já têm apoiado o projeto dele a Fundação Lehman, o Instituto Ashoka, a Brazil Foundation… E o Manoel foi fazer seu pós-doutorado no Cooperative Learning Institute (http://www.co-operation.org), com os irmãos David e Roger Johnson.

A paixão do Manoel é a “aprendizagem cooperativa”. (Ele prefere “cooperativa” a “colaborativa” e tem boas razões para isso). Mas suas ideias mestras são proatividade, protagonismo, autonomia, emancipação, liberação… A definição de um projeto de vida e a construção de uma história de vida são recursos de que se vale.

Depois dos milagres que o Manoel conseguiu no interior do Ceará sua universidade se interessou pelo projeto, a Secretaria da Educação se interessou pelo projeto… Mas o que ele fez ele fez de baixo pra cima, começando das raízes para, oportunamente, colher os frutos.

Por enquanto o projeto não usa tecnologia — e mesmo assim tem se expandido “viralmente”. Fiquei sonhando com a possibilidade de transplantar o que ele fez e está fazendo para o mundo virtual…

Imagine the possibilities!

Manoel, obrigado pela lição de vida de ontem. Você ontem me fez lembrar de meu amigo Antonio Carlos Gomes da Costa. Também um educador de primeira, fora do mundo acadêmico, desprezado pelos educadores profissionais, ignorado pela mídia educacional. Antonio Carlos já se foi. Você, por favor, se cuide.

Em São Paulo, 7 de Fevereiro de 2015

Relíquias de Tempos Digitais que (Felizmente) não Existem Mais

Os que me acompanham aqui no Facebook sabem que estou no processo de abrir umas ‘trocentas’ caixas de livros e papeis que, já faz quase três anos, estão enchendo até o teto um dos quartos (o maior, exceto pelo meu) aqui do sítio.

Com as novas estantes montadas, estamos começando a abrir as caixas. Este post, denominado “Relíquias”, registra coisas interessantes que vou descobrindo no processo e que mostram quão rapidamente o mundo mudou nos últimos — digamos — 30 anos. A história começa em 1983.

A seguir, três relíquias.

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RELÍQUIA 1 (1983)

No domingo, 4 de Setembro de 1983, a Folha de S. Paulo publicou, em seu Terceiro Caderno, que então tratava de Generalidades, na fl. 27, um longo artigo que tinha o seguinte título: “Computador chega na redação da ‘Folha'”. O subtítulo ressalta: “Sistema permite rápido trabalho de edição”. Uma foto panorâmica, composta de três imagens, mostra alguns “monstros” (do ponto de vista de hoje) e tem a seguinte legenda: “À esquerda, sala central dos computadores; à direita, editoria geral; no alto, a Folha Ilustrada sendo editada”. Note-se que os computadores não estavam distribuídos pela redação: eles tinham uma “sala central”. Só a “editoria geral” tinha alguns terminais.

Vou transcrever apenas algumas partes da longa matéria. (O marketing da Folha pode não ser bom, mas ele sempre é extenso).

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“Há algumas semanas, uma pequena nota no Painel da ‘Folha’ vem pedindo desculpas pelos eventuais erros gráficos que têm aparecido no jornal. Mas eles se justificam. São resultado da fase inicial de implantação, entre nós pioneira, com similar apenas nos grandes jornais dos Estados Unidos, Europa e Japão: [sic; faltou algo aqui] um sistema de terminais de vídeo nas redações e oficina, responsável pela produção e edição de jornais, e que determinará, a curto prazo, a própria sobrevivência de empresas jornalísticas, na busca de um produto cada vez mais ágil, moderno e inteligente.

Com apenas dois meses de funcionamento experimental, 52% das matérias publicadas pela ‘Folha’ e 50% das matérias publicadas pela ‘Folha da Tarde’ são produzidas e editadas diretamente pelo novo sistema. A totalidade das reportagens produzidas pelos jornalistas da Agência Folhas, assim como artigos de colaboradores e críticos, é transmitida diretamente nos terminais de computadores.

. . .

Em dois meses, as sucursais da ‘Folha’ já estarão operando com terminais e remetendo, pelo telefone, os impulsos que serão captados diretamente pela central de computadores e distribuídos a todos os jornais da empresa.

. . .

“O sistema ‘Folha’ de terminais — afirma [o engenheiro Pedro Pincirolli Júnior, responsável por toda a área de produção da empresa Folha da Manhã S/A] veio trazer velocidade e autencididade [!] maior às informações, uma vez que nos permitiu eliminar etapas no processo industrial gráfico e, também, que o jornalista falasse diretamente com seu público leitor”.

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Muita coisa curiosa aqui.

Primeiro, os erros são sempre devidos ao “sistema”, nunca a falhas cometidas pelos profissionais.

Segundo, embora o ano fosse 1983, e os microcomputadores já estivessem conosco há cerca de seis anos (apareceram em 1977), nenhuma menção deles. Fala-se apenas em terminais de um equipamento central. E, pelo que transparece, os terminais eram “terminais burros”, isto é, incapazes de realizar qualquer processamento localmente. O curioso é que a matéria, que foi feita sob o beneplácito de Caio Túlio Costa, um de dois Secretários da Redação da “Folha” e exatamente aquele designado como “responsável pela implantação dos terminais de vídeo na redação da ‘Folha'”, não parece ter nenhuma ideia de que os terminais de vídeo burros pudessem vir a ser substituídos, primeiro, por terminais inteligentes e, depois, por microcomputadores, e que o modelo computador-central e terminais poderia ser substituído por um sistema de redes locais de microcomputadores com capacidade plena de processamento local, interligadas e conectadas a vários computadores de maior porte, que armazenariam grandes bases de dados, e que, por sua vez, estariam ligadas a uma rede de maior alcance…

Terceiro, embora a Internet tivesse surgido em 1969, era, ainda, um brinquedo acadêmico-militar. Só as universidades americanas que prestavam serviços ao sistema militar tinham acesso a ela. Seriam necessários mais dez anos para que Al Gore, então (1993) Vice-Presidente de Bill Clinton, comprasse a briga que viria a tirar a Internet — não sem grandes resistências — do controle acadêmico-militar e coloca-la à disposição do universo empresarial e pessoal. Apesar de não “topar” o Al Gore, considero-me devedor à sua coragem por ter comprado essa briga e ajudado a criar, em 1993, nos Estados Unidos, a “Internet Comercial”. Da mesma forma, considero-me devedor a Sérgio Motta, o “Serjão”, Ministro das Comunicações de FHC, por ter comprado a mesma briga em relação à Embratel e ao Sistema Telebrás e criado a “Internet Comercial Brasileira”. Uma empresa de Campinas, a DGL-Net, foi o primeiro provedor de acesso à Internet Comercial Brasileira, até então controlada pelo Sistema Telebrás, via Embratel. Também não “topava” o “Serjão”, que sempre me pareceu um troglodita, mas considero-me devedor também a ele pelo que fez — algo que deve ter-lhe custado tanto stress que ele morreu logo depois de enfarte. (É verdade que o tamanho horizontalmente gigantesco dele deve ter contribuído).

Quarto, o texto fala em sobrevivência das empresas jornalísticas frente aos concorrentes, mas não vislumbra que a Internet seria seu maior concorrente e o “jornal virtual”, com suas informações instantâneas, que não precisam esperar pela edição diária do jornal convencional, o seu maior desafio. O texto não dá o menor sinal de que um dia o leitor poderia preferir ler as informações também diretamente na tela, sem precisar de um jornal impresso, ou até mesmo sem precisar de que um empresa jornalística compilasse as notícias e opiniões em um jornal virtual para ele.

Tudo isso, há 30 anos apenas. Quatro dias antes de eu completar os meus 40 anos.

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RELÍQUIA 2 (1988)

Em 1988 eu era Diretor do Centro de Informações e Informática (CIIS)  da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. A Secretaria era totalmente dependente da PRODESP — Processamento de Dados do Estado de São Paulo, estatal que fazia todo o processamento de dados para o governo do estado e seu vários órgãos, da Administração Direta e da Administração Indireta.

A Secretaria da Saúde era ocupada pelo médico José Aristodemo Pinotti, o governador era Orestes Quércia, amigo pessoal de Pinotti, e a todo-poderosa Secretária Pessoal e Chefe de Gabinete do Governador era Ana Maria Tebar, amiga pessoal dos dois e de mim também. Dos quatro, só restamos ela e eu.

Assim, eu estava, naquele momento, em situação especialmente favorável para começar, se não uma revolução, pelo menos uma revolta, dentro desse sistema.

Propus, em primeiro lugar, a compra, por licitação, (a) de três mini-computadores (na época tinham de ser equipamentos produzidos pela indústria nacional), para a sede, (b) de 300 microcomputadores para serem distribuídos pelos usuários centrais e pelos usuários remotos, nas regionais da Secretaria, e, por fim, (c) de 300 cópias de MS-DOS, de MS-Word, de MS-Excel, de MS-PowerPoint e de MS-Access.

Foi um rebu.

No tocante aos minicomputadores, o protesto foi de que a PRODESP detinha direito exclusivo de processar os dados dos órgãos estaduais. No tocante à compra dos microcomputadores, o mesmo argumento foi usado: em vez de microcomputadores, deveríamos aquirir terminais (burros) dos computadores da PRODESP. No tocante ao sofware da Microsoft, o protesto foi diferente. Além de se argumentar que não precisaríamos dele, porque estaríamos usando os terminais burros da PRODESP, argumentou-se que, mesmo que fosse autorizada a compra dos microcomputadores, deveríamos usar software nacional (como previa a legislação de “Reserva de Mercado para Empresas Genuinamente Nacionais), como, por exemplo, o sistema operacional SISNE, um processador de textos supostamente nacional, o Carta Certa, o Saci, uma planilha eletrônica também supostamente nacional, o gerenciador de base de dados supostamente nacional, Dialog (uma cópia deslavada de dBase II/III). Não havia, que me lembre, nenhum produto supostamente nacional que substituísse PowerPoint.

A briga ficou feia.

O Secretário Pinotti me apoiou e apelou ao Governador Quércia. Eu, nos bastidores, acionei Ana Maria Tebar. Quércia, que era um prodígio em termos de capacidade de lidar com assuntos complicados, decidiu criar o Conselho Estadual de Informática (CONEI), para reduzir o poder da PRODESP. Fui nomeado para ele (com outras pessoas amigas do Governador). A solicitação da Secretaria da Saúde foi submetida ao CONEI, que a aprovou.

Estava quebrado o monopólio da PRODESP dentro do Estado.

A SISCO ganhou a licitação para os minicomputadores, a Prológica para os microcomputadores, e a empresa que representava a Microsoft no Brasil (a Microsoft ainda não tinha subsidiária aqui) ganhou a licitação para o software.

Mas havia mais um problema.

Naquela época a Secretaria da Saúde tinha de coletar informações rotineiramente sobre vinte e seis moléstias de notificação compulsória — e tinha de encaminhar essas informações à World Health Organization – WHO (Organização Mundial da Saúde – OMS) em Genebra. Acho que ainda tem — e que o número de moléstias de notificação compulsória aumentou. As informações eram encaminhadas em papel pelo Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) — embora a WHO, através de sua divisão de Information Systems Support – ISS, dirigida por um ex-profissional da IBM, Dr. Salah Mandil, do Sudão, estivesse plenamente equipada para receber esses dados por telecomunicações.

Entrei em contato com Mandil, que logo se tornou meu amigo, e fiquei sabendo o que tínhamos de fazer para enviar os dados para a WHO por telecomunicações.

O problema, porém, não era do lado da WHO: era do nosso lado.

O governo brasileiro — já não mais o governo militar, mas o governo da chamada Nova Republica, presidido pelo José Sarney, não havia ainda conseguido revogar a “herança nefasta” do período militar.

O governo brasileiro tinha um departamento, vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), chamado de TransBorder Data Flow (TBDF), que controlava o Fluxo de Dados Trans-Fronteiras. A SEI, na “Nova República”, estava vinculada ao MCT. Ou seja, o governo imaginava que era capaz de controlar cada bit que entrava no Brasil ou saía do Brasil. Assim, para enviar os relatórios mensais de moléstias infecciosas para a WHO em Geneva, tive de solicitar permissão ao Governo Federal. Fiz isso. Eis a resposta que recebi em 24//3/1988:

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“Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT)

Conselho Nacional de Informática e Automação (CNIA)

Secretaria Especial de Informática (SEI)

Certificado SAE no. 028/88

A Secretaria Especial de Informática – SEI certifica que se pronunciou favoravelmente quanto ao estabelecimento de ligação internacional para comunicação de dados com as seguintes características básicas:

INTERESSADO: Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo

TIPO DE LIGAÇÃO: Uma ligação internacional, via nó internacional (RENPAC/INTERDATA), a 1200 bps

LOCALIDADES LIGADAS: São Paulo-SP e a Organização Mundial da Saúde em Genebra.

O presente certificado é expedido com base nas informações e dados constantes do Proc. SEI no. 51746/87-5 (374), e expira em 15/3/1991.

Brasília-DF, 24 de Março de 1988

Kival Chaves Weber, Secretário Executivo

Dorgival S. Brandão Júnior, Sub-Secretário de Atividades Estratégicas”

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Para obter esse aval, tive de me comprometer, através de “TERMO DE COMPROMISSO”, de 24/2/1988, a não usar o link com a WHO para outros fins, e de me declarar ciente de que, se o link fosse usado para outros fins, seria imediatamente cancelado.

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RELÍQUIA 3 (1993)

A revista Newsweek de 5/4/1993, vinte anos atrás, publicou, como matéria de capa, um artigo com o título “Wiring the World” (Cabeando o Mundo) [fls. 26 e seguintes]. Newsweek era publicada pelo conglomerado The Washington Post. A matéria procurava mostrar que o mundo estava sendo interligado, e que, dentro de pouco tempo, estaria todo interligado por fios e cabos.

Na semana seguinte, em 12/4/1993, a revista Business World, uma das principais concorrentes de Newsweek, publicou, como uma matéria de capa, um artigo com o título “Wireless World” (Mundo sem Fios). Business Week era publicada por McGraw-Hill Publications.

Business Week faturou. Demonstrou ter uma percepção mais precisa do que estava ocorrendo. O mundo de fato estava fincando interligado — mas a interligação se daria prioritariamente sem fios, via satélites.

É verdade que Newsweek acrescentou uma pequena matéria, nas fls. 32-33, a “Wireless Age” (A Era Sem Fios), mas a matéria criava no leitor a impressão de que o “wireless” seria a exceção, não a regra, e que se aplicaria unicamente aos telefones celulares, não aos computadores. Consequentemente, nenhum sinal dos “SmartPhones”, os telefones que são computadores e que operam basicamente sem fios, e que tenderiam, em termos de número, a suplantar os computadores interconectados, e conectados à Interenet, por fios e cabos.

E o ano era 1993 — o ano em que Al Gore daria sua inestimável contribuição à Revolução Digital.

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É isso. Por enquanto. É verdade que, olhando pelo retrovisor, é bem mais fácil. Mas quem sabe ainda acho mais relíquias.

Em Salto, 15 de Janeiro de 2014.

O que Será do meu FaceBook Quando eu Morrer?

Meu amigo Jarbas Novelino chamou minha atenção, hoje cedo, através do Facebook, para um artigo que anuncia a criação, em Israel, de algo, não virtual, infelizmente, que parece um Facebook dos Mortos. Ele fotografa lápides e cria um site onde, um perfil para cada lápide, elas são exibidas e os parentes podem deixar suas memórias e curtições para o finado.

Acho desnecessário — e meio mórbido — fotografar lápides físicas para criar os perfis em um site. Deveria ser possível, mediante a apresentação da certidão de óbido, já criar o perfil do recém-falecido (ou do falecido há tempo), com fotos e demais memorabílias.

Certamente fica mais barato. Talvez, não tão bonito: veja a foto.

Cemetery in Israel

Cemetery in Israel

Um acordo com o Mark Zuckerberg poderia até permitir que o perfil e timeline do aposentado da vida fosse transferido para o site — que poderia se tornar, por assim dizer, e com perdão do trocadilho de mau gosto, um arquivo morto do Facebook. Este teria a vantangem de poder dar uma depurada no seu sistema, eliminando os que já passaram desta para aquela. Afinal de contas, os estatísticos já preveem que em 2065 o Facebook terá mais perfis de mortos do que de vivos, dadas as curvas atuais (curvas de novos membros e de falecentes).

Sempre acho essas coisas fascinantes.

Uma rápida busca em meu blog identificou três ocasiões: duas muito perto uma da outra, em Agosto de 2006, outra no fim de 2011.

“O que Será dos meus Hard Disks?” (de 21/8/2006)

http://liberalspace.net/2006/08/21/o-que-sera-dos-meus-hard-disks/

Literatura, Cinema… Alienação? (25/8/2006)

http://liberalspace.net/2006/08/25/literatura-cinema-alienacao/

Que Será de Nossos Pertences Digitais quando Morrermos? (17/11/2011, 28/12/2011)

http://liberalspace.net/2011/12/28/que-ser-de-nossos-pertences-digitais-quando-morrermos/

Quem estiver a fim de enfrentar uma discussão meio mórbida, vá em frente.

Acho que aos poucos estamos encontrando a chave para uma vida após a morte. Ela será uma vida “apenasmente” virtual, mas é melhor do que nada. Não vai exigir ressurreição, arrebatamento, nada. Uma mera transferência dos arquivos de um site para o outro.

Em São Paulo, 19 de Novembro de 2013

Now There is a Facebook for Dead People

By Christopher Mims @mims November 18, 2013

An Israeli entrepreneur has spent “hundreds of thousands of shekels” (tens of thousands of US dollars) to photograph and log 120,000 gravestones, in an effort to create a sort of Facebook/Wikipedia for the dead. It sounds ghoulish, but the project, Neshama, is intended to be the opposite: each page is to be a memorial to a particular deceased person, where family members can leave remembrances.

So far the site encompasses just five cemeteries, but the idea for the site seems eminently exportable. It’s unclear whether Shelly Furman Asa, the site’s founder, sought permission to take the photographs. But at least in the US, there is little to protect gravestones from being photographed, and similar sites like Find A Grave and BillionGraves already serve amateur genealogists in the US.

Facebook allows relatives to “memorialize” the profile of a deceased person, and cartoonists have calculated that Facebook could have more dead people than living by as early as 2065. Neshama’s differentiator is that Facebook has only existed since 2004, but people have been marking the site of their dead relatives for millennia.

Asa says digitization of more cemeteries is ongoing, and that eventually the site will make money by charging relatives to upload images and other tokens to their relatives’ pages.

http://qz.com/148560/now-theres-a-facebook-for-dead-people/

Computadores: Máquinas de Ensinar ou Ferramentas para Aprender

[Escrevi este artigo em Campinas, terminando-o em 17 de agosto de 1983. Ele foi publicado em Em Aberto, Revista do INEP, MEC, Brasília, Outubro de 1983 (faz 30 anos este ano de 2013)]

Em relação à questão da utilização de computadores na educação, a exemplo do que tem acontecido em muitas outras situações, teses ou causas perfeitamente sensatas e defensáveis acabam por se inviabilizar quando alguns de seus mais ardorosos defensores fazem reivindicações totalmente inverossímeis a seu favor, fornecendo àqueles que se opõem a essas teses na direção oposta.

Ilustremos em relação à nossa questão.

Que trabalhadores não-qualificados, ou semi-qualificados, possam vir a perder seus empregos para sofisticados robôs ou para outros complexos sistemas de automação industrial sempre me pareceu uma real possibilidade. Que professores, porém, possam vir a perder os seus empregos decorrência da introdução, ainda que maciça, de computadores nas escolas tem sempre me parecido bastante implausível. Surpreendia-me, portanto, ver que os professores, ou seus porta-vozes, freqüentemente externavam este receio nas ocasiões em que se discutia a possibilidade de introduzir computadores nas escolas. Uma fábrica totalmente, ou quase inteiramente, automatizada, sem os trabalhadores não- ou semi-especializados, é algo perfeitamente imaginável. Uma escola, porém, totalmente sem professores, apenas com alunos sentados diante de terminais de vídeo, é algo que tenho sérias dificuldades em imaginar. Concluía, pois, que o receio não passava de paranóia de professor.

Minha surpresa foi grande, portanto, quando, ao ler um artigo sobre CAI (Computer-Assisted Instruction), em Creative Computing, encontrei as seguintes afirmações do autor, John Herriott:

“Há uma possibilidade bastante acentuada de que antes do final deste século os estudantes venham a receber toda a sua instrução através de computadores, sem, absolutamente, nenhum contato com professores vivos. Isto pode ser feito, e muito bem” (John Herriott, “CAI: A Philosophy of Education — and a System to Match”, in Creative Computing, vol. VIII, n° 4, April 1982, p.80).

Herriott não está sozinho. Clive Sinclair, o gênio por detrás do Sinclair, afirma:

“Chegará o dia em que os computadores ensinarão melhor do que seres humanos, porque computadores podem ser tão pacientes e muito afinados com as diferenças individuais. O computador substituirá não só a Encyclopaedia Britannica mas também a escola” (Clive Sinclair, apud “Viewpoint”, de Paul Kriwaczek, in Computing Today, vol. IV, n° 11, January 1983, p. 29).

Segundo Sinclair, portanto, junto com os professores as próprias escolas serão substituídas pelo computador. Charles Lecht, presidente da Advanced Computer Techniques Corporation, de New York, dá o fecho: “saibam que eu realmente acredito que máquinas podem fazer qualquer coisa (sic) melhor do que pessoa” (apud, ibid).

Ao ouvir estas visões do futuro que os profetas de um novo milênio nos apresentam , eu me pergunto se estes defensores da introdução de computadores nas escolas, ou mesmo da substituição da escola por computadores instrucionais, ajudam ou atrapalham a causa daqueles que, preocupados com a qualidade e a eficiência do ensino é ministrado em nossas escolas, investigam a melhor maneira de introduzir computadores no processo de aprendizagem.

Esta investigação, porém, tem que ser feita com plena consciência do fato de que a introdução de computadores nas escolas é, nem virá a ser, uma solução para todos os problemas pedagógicos que afligem a educação brasileira. O computador não é nenhuma panacéia — como não é nenhum monstro de sete cabeças: ele não vai nem acabrestar nem salvar a escola. Ele pode educar, ou então deseducar, dependendo da maneira em que for utilizado. Ele não é nenhum substituto para o uso da inteligência e da criatividade — e é por isso que alguém já disse, a meu ver com propriedade, que, se algum professor vier a perder seu emprego por causa da introdução de computadores na escola, este professor na verdade merecia ser substituído (se não necessariamente por uma máquina, pelo menos por outro professor que, fazendo valer sua inteligência e sua criatividade, tornasse inviável sua substituição por um computador.

Outra questão que deve ser mantida em mente ao investigarmos o tema que já está proposto para discussão é que já não é mais a hora de se cogitar da introdução ou não de computadores nas escolas. Esta questão já está decidida, e não é pelo MEC ou pela SEI — ela está decidida por um processo histórico que é irreversível, inclusive no Brasil. A questão que resta discutir é quem vai conduzir esta introdução e como ela será feita. Se os educadores não se propuserem a assumir esta introdução, e a conduzi-la, outros o farão, e os educadores, mais uma vez, ficarão na posição de meros observadores de um processo conduzido por quem tem iniciativa. Hoje muitos educadores lamentam o que é feito no país em matéria de tele-educação, por exemplo. Mas no momento, num passado que hoje nos parece remoto, em que poderiam ter se envolvido, não o fizeram (com raras e honrosas exceções), por uma série de razões. Hoje não têm o direito de lamentar. O mesmo acontecerá em relação à utilização de computadores na educação se a questão não for enfrentada com realismo, inteligência, e decisão.

Uma terceira questão preliminar, que precisa ser encarada de frente, é a que indaga se a introdução dos computadores nas escolas ajudará a aumentar ou a diminuir a distância entre as classes sociais. Novamente aqui, a resposta sensata deve realçar o fato de que a utilização de computadores nas escolas poderá acentuar ou diminuir a distância entre as classes sociais, dependendo da maneira em que for feita. Se o problema for deixado meramente à iniciativa das escolas, sem a interveniência do poder público, somente aquelas escolas que já atendem às classes mais altas é que se envolverão — e já estão envolvidas — com a introdução de computadores na educação. As escolas mais pobres, entre as quais se encontram, sem exceção, as públicas, ficaram a ver navios. Deixar a questão, portanto, meramente ao sabor das iniciativas particulares é condenar, mais uma vez, as escolas públicas a uma educação de categoria inferior. É necessário, portanto, que o poder público, na qualidade de regulador, intervenha para tentar igualar, na medida do possível, a situação. Pois o dilema que se coloca, nunca é demais repetir, não é se as escolas vão ou não introduzir o computador na educação, mas se somente as escolas particulares e abastadas o farão ou se todas terão alguma chance. A introdução é inevitável: cumpre, a meu ver, encontrar maneiras de entender o privilégio ao maior número possível de escolas e, conseqüentemente, de alunos.

Por outro lado, é sempre bom lembrar que, se não fizermos um esforço maciço para nos capacitar também nesta área, não resta a menor dúvida de que a distância entre os países desenvolvidos e o nosso país aumentará cada vez mais. Só isto, a meu ver, já justificaria um envolvimento e um investimento nesta área. Só isto já justifica o EDUCOM.

Ou vejamos alguns fatos, só à guisa de ilustração. A revista Creative Computing de Maio do corrente ano (1983) assinala o fato que a Inglaterra é o primeiro país do mundo a colocar um microcomputador (ou algum recurso computacional mais potente ) em todas as escolas secundária do país. Através de um projeto chamado “Micros nas Escolas” o Ministério da Industria permitiu que mais de 5.800 escolas secundárias viessem a receber em doação ou a adquirir microcomputadores. Enquanto isso, nos Estados Unidos, legislação aprovada no Estado da Califórnia levou um só fabricante — a Apple — a doar mais de 10.000 microcomputadores às escolas do Estado. No mesmo Estado da Califórnia já há cursos de formação de professores para atuar na área de utilização de computadores na educação — e a Universidade de Stanford, localizada no Vale do Silício, foi a primeira Universidade americana a criar um Mestrado em Computação Educacional, dirigido a professores que estejam interessados em aprender computação (especialmente programação) e a programadores que estejam interessados em aprender educação. O programa contém disciplinas nas áreas de computação, psicologia educacional, filosofia da educação, teoria do currículo, métodos de ensino e avaliação, etc. O objetivo fundamental é formar pessoal que possa escrever programas de alto nível técnico e de grande teor pedagógico e educacional. Para tanto, a Universidade de Stanford, em termos de recurso materiais, está excelentemente equipada: 17 computadores de grande porte, 343 minicomputadores, e literalmente centenas de microcomputadores e processadores de texto (dados retirados do jornal da Universidade, The Stanford Observer, de Fevereiro de 1983).

Diante de tudo isto, e diante da enorme lista de vicissitudes de que padece o ensino brasileiro, muitos poderão ser tentados a adotar a atitude que, já que nunca iremos poder chegar ao ponto de ter e fazer tudo isto, será que não seria melhor não fazer nada? Será que não seria melhor aguardar até que os problemas mais básicos fossem solucionados para então pensar na introdução de computadores nas escolas? Esta e a receita típica do inativismo pedagógico: já que não posso mudar tudo, é melhor deixar tudo como está. O problema é que, se o educador não o fizer, outros o farão, e dentro de pouco tempo teremos um “Info-Curso 2° Grau”, e depois um “Info-Curso 1° Grau”, e depois, quem sabe, um “Info-Curso” disfarçado de Vila Sésamo ou Sítio do Pica-Pau Amarelo, ou qualquer coisa equivalente — e os filhos dos educadores se deleitarão.

Mas depois deste preâmbulo exortativo, vamos à discussão do tema que me propus.

Computadores e Educação. Há várias maneiras de se entender este binômio. Deixando de lado a questão do ensino da Computação, propriamente dita, poderíamos classificar em três grupos principais as opiniões sobre como se deve entender o binômio em questão.

Em primeiro lugar há aqueles que, tendo em vista o fato de que computadores (e microcomputadores, em particular) acabaram por se constituir em um novo fenômeno tecnológico e social , acreditam que seja útil, indispensável mesmo, que as crianças venham a aprender alguns fatos básicos sobre os computadores e seu impacto na sociedade. Acreditam estes que as crianças de hoje devam estar preparadas para viver em uma sociedade altamente informatizada e que, portanto, devem ser introduzidas aos computadores o mais cedo possível, bem como vir a discutir as questões relativas ao impacto que a introdução maciça de computadores na vida moderna exerce sobre os indivíduos e os grupos e as relações sociais. É isto que normalmente se tem em mente quando se fala em “Computer Literacy”, ou “Computer Awareness”. Uma vantagem desta abordagem é que a questão (importante, por sinal) pode ser introduzida em vários lugares do currículo acadêmico, com abordagens as mais variadas, não sendo necessário criar uma disciplina ande o assunto seja estudado (embora no contexto fundamentalmente disciplinar em que nossas escolas atuam esta seja a normal). Áreas curriculares tradicionais como Ciências, Matemática, estudos Sociais, etc.; podem, cada uma de sua perspectiva introduzir o tópico aos alunos.

Em segundo lugar, há aqueles que acreditam que a principal, quiçá a única, possibilidade de utilização do computador na educação é como um instrumento para o ensino das matérias do currículo tradicional. Normalmente é isto que se tem em mente quando se fala em “Computer-Assisted (or Aided) Instruction” (CAI) : o computador é visto como um instrumento, uma ferramenta, que ajuda ou facilita o ensino de matemática tradicionais (como matemática, física, etc.; ou até mesmo aritmética, geometria, geografia, história).

Em terceiro lugar, há aqueles para quem as abordagens anteriores realmente deixam de apreciar o impacto fundamental que os computadores podem ter aprendizado da criança. Segundo estes, o pleno potencial pedagógico dos computadores só será explorado se os alunos aprenderem a programar (e não apenas aprenderem apenas fatos sobre o computador, ou fatos sobre outros assuntos através do computador ). advogados desta tese argumentam que a programação pode fornecer aos alunos habilidades que não seriam desenvolvidas de nenhuma outra maneira. Fala-se aqui, às vezes em “Computer-Assisted Learning” (CAL).

A maior disputa, atualmente, é entre os grupos que defendem a segunda e a terceira das posições esboçadas. Ninguém parece discordar de que aquilo que o primeiro grupo propõe é importante é deve ser incentivado. Muitos, porém, acham que não é suficiente — e discordam sobre o que deveria ser acrescentado. Acreditam estes também que a melhor maneira de se informar ou conscientizar sobre o computador é através do próprio computador, e que, portanto, os objetivos a que se acreditam os defensores da primeira tese poderiam ser igualmente atingidos por uma das outras duas abordagens.

Sendo assim, vou me concentrar na disputa entre os defensores das proposta resumidas em segundo e terceiro lugar. Fundamentalmente, a controvérsia maior ocorre entre os que defendem a utilização do computador basicamente como um instrumento de ensino e os que defendem a utilização do computador basicamente como uma ferramenta de aprendizagem (na verdade, de auto-aprendizagem).

Pode parecer que a questão não é tão fundamental assim é que tudo não passaria de uma questão de ênfase. Contudo, há aspectos importantes por detrás destas colocações. Vou resumir os principais aspectos destas duas colocações, sem pretender imparcialidade — minha preferência é claramente pela segunda — mas tentando ser justo e, na medida do possível, objetivo em minhas ponderações.

Cerca de 90% (ou até mais) dos chamados “programas educacionais” existentes no mercado refletem a primeira preocupação. São programas destinados a transmitir certas informações ou a desenvolver certas habilidades básicas, através do exercício, na prática, de tutoriais, etc. O computador funciona, neste caso, como se fosse um professor, uma máquina de ensinar: ele é um meio instrucional, ele instrui. A aprendizagem que ocorre é totalmente estruturada pelo programa, ou seja, pelo computador o computador que está em controle da situação. Ao aluno cabe responder perguntas que lhe são feitas, ou intervir quando solicitado. Sua postura acaba sendo fundamentalmente passiva: ele responde ou intervém quando solicitado, pelo computador, a fazê-lo.

O computador, neste contexto, é utilizado de uma maneira que meramente substitui ou duplica métodos educacionais tradicionais, sem que, em decorrência da utilização do computador, seja profundamente alterado o processo de aprendizagem. Isto faz com que o modelo aqui analisado, embora introduza o computador na educação, o faça sem maiores inovações, sem que haja uma transformação profunda em objetivos e métodos de ensino tradicionais.

A maior parte do que se faz em CAI nada mais é do que exercício, prática repetitiva. Transpõem-se, freqüentemente, textos para a tela, passa-se uma série de informações, e depois testa-se o aluno para ver se ele aprendeu (i.e. , memorizou ou compreendeu) o que lhe foi apresentado. Em caso positivo, o aluno recebe um certo reforço positivo, em caso contrário, alguma recomendação para estudar mais, etc. Ou então, em alguns casos, se pede ao aluno que leia algum texto em um livro, ou que assista alguma aula regular, e depois se testa, através do computador, o conhecimento assimilado. A única novidade, na verdade, em situações como estas, de resto bastante freqüentes, é a utilização de um medium novo — que é usado, porém, dentro de um contexto inteiramente tradicional. A meu ver, este tipo de utilização do computador é um desperdício de um recurso que potencialmente é muito rico.

Usar o computador para ensinar tabuada, ou aritmética elementar, nomes das capitais ou nomes de presidentes da república, etc. , é usar um equipamento de alto potencial pedagógico para promover objetivos educacionais bastante tradicionais e, a despeito do medium, através de métodos bastante condenados quando utilizados sem a auréola de novidade que o computador permite que eles assumam. Em conseqüência disto, os programas, ainda que tecnicamente bons (com uso de gráficos, simulações, etc.), acabam sendo instrucionalmente ingênuos, pobres do ponto de vista pedagógico. Estes programas não tomam nenhum risco, usando o computador quase como se fora apenas uma caixa de Skinner.

Mas se é este o caso, por que é que estes programas são tão difundidos? Há várias razões, que gostaria de ressaltar aqui.

Em primeiro lugar, este modelo de utilização do computador na educação introduz um medium novo mas, como já se mencionou, para alcançar objetivos educacionais tradicionais e através de métodos já de certo modo consagrados pela prática (exercício, repetição, etc.), mesmo que não pela teoria pedagógica. Assim, o computador não intimida tanto e vem preencher necessidades que, qualquer professor ou pai reconhece facilmente ( aprender tabuadas, geografia, fatos históricos, etc.). Esta uma das razões de sua popularidade.

Em segundo lugar, numa época em que testes de múltipla escolha padronizados acabam por se substituir no método de avaliação por excelência, este tipo de utilização do computador fornece aos alunos maneiras individualizadas de se exercitar, de praticar habilidades básicas, e de avaliar o seu progresso.

Em terceiro lugar, a popularidade deste tipo de utilização do computador na educação se explica pelo fato de que o conhecimento que se transmite aqui e o aprendizado que se espera são de contornos razoavelmente bem definidos e, conseqüentemente, permitem uma avaliação mais “objetiva” do progresso feito. Além disso, os programas que se encaixam nesta categoria não são tão difíceis de programar, existindo, inclusive, linguagens criadas especialmente para facilitar a tarefa de construção de programas de “instrução programada” (PILOT, por exemplo), bem como vários tipos de “pacotes” que permitem ao professor a construção, de maneira simples, de seu “courseware” — ou, “didacticiel”, como preferem os franceses.

A questão é se vamos utilizar a abordagem meramente porque ela é de implementação ou utilização mais fácil, ou porque ela não causa maiores transtornos ao processo educacional e à vida do professor, por se encaixar dentro de objetivos educacionais tradicionais e de métodos de ensino convencionais.

Pessoalmente, acredito que esta função digamos instrucional que o computador exerce é (embora até útil, em alguns contextos) uma de suas características menos interessantes. Sua função educacional mais importante o coloca em papel inteiramente aposto: não no de instrutor, mas no de aprendiz. A tarefa do aluno não é aprender do computador, mas ensiná-lo a realizar certas tarefas — programá-lo, enfim.

Aqui chegamos, portanto, à outra abordagem. Segundo esta abordagem, o computador é fundamentalmente uma poderosa ferramenta de aprendizagem que, bem utilizada, pode levar ao aprendizado não só de fatos importantes sobre o próprio computador bem como sobre outros conteúdos, mas, e mais importante, pode levar à aprendizagem de princípios, técnicas, habilidades que ajudarão o aluno em seu aprendizado subseqüente, que farão dele um melhor solucionador de problemas (não só necessariamente em relação ao conteúdo que está incidentalmente manipulando).

Neste modelo de utilização do computador na educação, a situação de aprendizagem não é previamente estruturada. Não há, necessariamente, um determinado conteúdo que tem que ser aprendido, determinadas perguntas que têm, cada uma delas, uma só resposta correta, cabendo ao aluno descobri-la. Ao aluno cabe, aqui, estruturar o próprio contexto em que sua aprendizagem vai ocorrer. Ele é encorajado a explorar, criar, inovar, dentro de situações de aprendizagem não previamente estruturadas. Parte-se do pressuposto de que o aprendizado que ocorre nestas situações é mais frutífero e mais duradouro. Ao aluno é permitido errar — se bem que muitas vezes não seja muito claro o que é erro — porque se acredita que erros são pedagogicamente importante. Ao aluno se permite levar adiante uma solução para um determinado problema, ainda que seja óbvio que a solução não vai funcionar, porque se reconhece o valor pedagógico dessa exploração. O aluno, longe de ser um mero observador que só reage quando solicitado, passa a ser um participante ativo no progresso de construção de sua própria aprendizagem.

Quando se escolhe esta segunda opção está se optando por muito mais do que simplesmente um outro métodos de utilização do computador na educação: está se optando por uma filosofia da educação diferente. Muitos educadores já mostraram os benefícios da educação que ocorre através do fazer, do explorar, do descobrir. O computador, propriamente utilizado, torna esta meta alcançável de uma maneira nunca antes possível. Nele, como bem assinalou Seymour Papert, em Mindstorms: Children, Computers, and Powerful Ideas, o concreto e o formal se encontram, permitindo possibilidades pedagógicas difíceis de imaginar sem o apoio do computador.

Nesta abordagem, alteram-se drasticamente os objetivos educacionais tradicionais e os métodos de ensino convencionais. Todo o processo educacional é visto de uma maneira totalmente revolucionária.

Exatamente por isto, não é fácil elaborar programas que levam a estes objetivos. O que se tem que fazer é criar linguagens, programas utilitários, que dêem ao usuário um número cada vez maior de recursos que permitam o desenvolvimento de sua aprendizagem. Exatamente por atuar no pressuposto de uma aprendizagem não previamente estruturada, este modelo impede que sejam desenvolvidos “pacotes” que são então distribuídos e consumidos. O que é necessário desenvolver é todo um conjunto de recursos, todo um ferramental para a aprendizagem. É isto que todo o conjunto de linguagens e recursos identificado com o nome LOGO procura fornecer.

Ao optar por esta abordagem não se está sucumbindo à tentação representada por aquilo que alguns já convencionaram chamar de síndrome dos testes e medidas: ensinar aquilo que é mais fácil ensinar, avaliar aquilo que é mais fácil testar. Não resta dúvida de que algumas coisas são importantes, mas difíceis de testar e avaliar; outras são fáceis de testar, mas talvez não tão importantes (pode se substituir a palavra testar por investigar, aqui, e o que está sendo dito se aplicaria também à pesquisa educacional). O importante é não sucumbir à tentação de promover a aprendizagem apenas daquilo que é fácil testar, deixando de lado a aprendizagem daquilo que é importante, para não dizer essencial, aprender.

Concluo, portanto, com uma reafirmação clara da tese de que toda criança deveria aprender a programar o computador. Isto obviamente não quer dizer que todas as crianças devem se tornar programadores profissionais. Quer dizer, isto sim, que aprender a programar o computador envolve aprendizados de vários tipos, ou vários aspectos de aprendizado. Em primeiro lugar, está o aprendizado requerido para dominar o próprio computador. Em segundo lugar, está o aprendizado de várias técnicas e estratégias para a solução de problemas. E em terceiro lugar está uma compreensão mais profunda do assunto de que se ocupa o programa: O conteúdo do programa.

Olhemos, brevemente, e à guisa de conclusão, a cada um desses aspectos.

Um certo sentido de mistério e até mesmo da mágica geralmente cerca o primeiro contato de alguém com o computador. Embora no íntimo se saiba que se trata apenas de uma máquina com circuitos, teclas, etc., há algo acerca do computador que o faz parecer não só quase vivo como inteligente. A primeira coisa que o aprendizado de programação ensina é que o computador só faz aquilo que você o ensina a fazer. como já disse alguém, o computador é um completo idiota, que, entretanto, tem uma excelente memória e executa ordens com incrível rapidez. No processo de aprender isto o aluno aprende que é ele quem manda, o cérebro que instrui é o dele — é ele, enfim que determina as regras do jogo.

A descoberta deste fato, juntamente com a descoberta do fato de que o computador não irá resolver nenhum problema que você não consiga resolver para ele, ajuda as crianças, além de tudo, a desenvolverem auto-confiança, a auto-confiança que vem do fato de que você é capaz de fazer uma máquina poderosa e até misteriosa obedecer as suas ordens. Esta sensação de auto-confiança e de domínio sobre a máquina é importante não só para os alunos que têm grau de auto-confiança baixo, mas também porque, em uma sociedade cada vez mais permeada pela tecnologia, é importante que as pessoas cresçam imbuídas de um sentido de que são elas que devem controlar as máquinas — não vice-versa . (Na instrução programada, quem é controlado por quem?).

Em segundo lugar, quem aprende a programar o computador desenvolve uma série de habilidade e estratégias para a solução de problemas — e problemas bastante reais.

Embora as pessoas aprendam a solucionar problemas e a desenvolver certas estratégias para fazê-lo, simplesmente vivendo suas vidas, parece ser terrivelmente difícil ensinar, na escola, métodos de solução de problemas. As razões desta dificuldade provavelmente estejam relacionadas com a diversidade das habilidades, dos conhecimentos e da compreensão exigindo para a solução de problemas bem como com a complexidade inerente na avaliação das estratégias utilizadas para a solução de problemas. As escolas preferem se concentrar em habilidades que podem ser identificadas, isoladas, e medidas, a se dedicar àquelas que são menos tangíveis e mais profundamente interrelacionadas. Novamente aqui temos a síndrome dos testes e medidas a que já se fez menção. Ensina-se o que se pode mais facilmente identificado, isolar e avaliar — e não o que é menos tangível, mais complexo, mais interligado, mas difícil de avaliar.

Computadores fornecem um contexto cheio de problemas excitantes e atraentes para as crianças e as desafiam a solucioná-los. Mesmo as tarefas mais simples de programação, aquelas voltadas para criança, como desenhar na tela, são suficientemente ricas e complexas para permitir o desenvolvimento de uma série de habilidade que ajudam na solução de problemas. Ao mesmo tempo há aspectos envolvidos nesta experiência que fazem com que a solução de problemas neste contexto seja mais fácil e mais facilmente inteligível do que no mundo real.

Ou vejamos. O computador, em primeiro lugar, torna possível dividir, com relativa facilidade, um problema em vários outros pequenos problemas. Esta estratégia é extremamente útil na solução de problemas que, de início, parecem demasiadamente complexos para serem solucionados. Em segundo lugar, ao se propor escrever um programa o aluno é forçado a fazer uma descrição explícita e formal do problema que ele irá resolver com aquele programa. isto em si já é algo bastante positivo. Mas o mérito não para aí. Diferentemente de uma descrição verbal ou descrita de alguma coisa, um programa de computador pode ser testado com facilidade, e seu resultado comparado com o esperado. Este processo contínuo de descrição do problema, proposta de uma solução, testagem da solução, revisão, é de enorme utilidade pedagógica. Ele leva o aluno a aprender de e através de seus erros — ou seja, numa tradição bastante Popperiana, ele reveste o erro de enorme significado pedagógico.

O terceiro tipo de aprendizado que decorre do estudo da programação é o do próprio conteúdo ou assunto sobre o qual se está programando. Todos os que ensinam já tiveram a experiência de que ao ensinar determinado assunto a gente freqüentemente aprende muito sobre o assunto. Em programação ocorre a mesma coisa: ao tentar fazer um programa que leve o computador a executar gráfico, ou música, o programador geralmente desenvolve uma compreensão ( e mesmo uma apreciação ) bem mais profunda desses conteúdos do que tinha antes. O mesmo se aplica a qualquer outro conteúdo.

Muitas pessoas imaginam que, porque computadores são máquinas, pessoas que aprendem desde muito cedo a manejar computadores venham a se tornar mais “mecânicas” em seu modo de pensar. Outros imaginam que pessoas que não tenham uma grande inclinação para a matemática nunca vão se tornar bons programadores. Muitos educadores, principalmente aqueles que trabalham com LOGO, têm chegado à conclusão de que o oposto, em ambos os casos, é que é o verdadeiro. Toda criança pode aprender a programar a ser relativamente bem sucedida no empreendimento, e o aprendizado de programação ajuda as crianças a desenvolverem tanto o lado lógico como o lado intuitivo de sua personalidade .

Estou convicto de que todas as crianças se beneficiarão, em maior ou menor grau, é verdade, se aprenderem a programar. Este aprendizado ajuda tanto crianças como adultos a desenvolverem habilidades e conhecimentos de que necessitam em uma sociedade tecnologicamente avançada. Ao mesmo tempo, estas pessoas experimentam uma sensação de poder criativo sobre seu ambiente, aprendendo, também, com maior profundidade, os assuntos que estiverem explorando.

Inserido aqui em São Paulo, 4 de Fevereiro de 2013

Eduardo Chaves

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Da prostituição – do corpo e da mente

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Sebastião Francisco da Silva

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161

Educação compulsória e educação estatal

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50 Anos de Atlas Shrugged

159

Redes Sociais, Um Computador por Aluno e a Reinvenção da Escola

157

A Coréia do Sul e o Brasil

156

A nova face do socialismo

154

Os analfabetos funcionais escolarizados

154

De cães e gatos

154

Ainda a educação como mercadoria

153

Idealismo vs realismo político (ou: de fariseus e publicanos)

152

O mercado livreiro brasileiro que se cuide…

151

Pedro Salomão José Kassab (1930-2009)

147

“Entre os muros da escola”: Uma escola sem alma

147

“Adeus, Lênin”

146

Modalidades de escolas

146

O Estado e a lei antifumo (ou Do fascismo do Estado democrático)

145

“O Colocador de Pronomes”

145

Livros e Filmes

145

Pedofilia entre padres

145

Ainda a inclusão / exclusão digital

145

Quarenta anos de casado

145

Os aeroportos com maior tráfego de passageiros no mundo

145

A lei e a conduta sexual

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Eugenia ou bom senso?

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A greve dos que sustentam o mundo nas costas

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A Revolta de Atlas (Atlas Shrugged)

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Os Indicados ao Oscar (em Inglês)

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Finlândia: A tragédia na escola

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Hotéis, tecnologia e serviços

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Qatar: o anti-Brasil?

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“Criança, não verás nenhum país como este!”

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Verdades absolutas e conhecimento relativo: uma réplica

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Aprendizagem significativa

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SPFC: Dentre os grandes, és o primeiro

133

Alienação Parental – Vamos Combatê-la

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Os pequenos roubos de cada dia no emprego (e nas viagens?)

132

Escrita à Mão, Papel Almaço…

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O Medo (versos do fado interpretado por Mariza e, antes, por Amália)

130

O avô paterno do meu neto Gabriel

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A arte de maquiar defuntos e as pseudoinovações educacionais

129

Histórias (verídicas e falsídicas) e a arte de contá-las

128

Free flow of consciousness

128

“A consciência por vezes é uma merda”

125

Ainda o Qatar e o Brasil

125

Uma Nova Forma de Aprender

125

Não vote em branco nem anule seu voto

125

Brasil pobre

124

A moeda vietnamita: o “dong”

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Democracia Constitucional Republicana vs A Tirania da Maioria

123

O conservadorismo brasileiro no Ensino Superior

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Desabafo

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Jovens e velhos convivem em todas as faixas etárias

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Educação e conservadorismo: uma resposta liberal

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Sobre a natureza humana

120

Finalmente um Prêmio “Nobel” na Educação

119

O estado patriarcalista socializante

118

O Leilão da Virgindade: A Culpa é do Mercado?

117

Os ruídos da noite

116

Tecnologia, criatividade e mudanças

116

A Linha Amarela do metrô paulistano

114

Literatura, cinema… Alienação?

112

Educação da sensibilidade — de novo

110

Dá pra viver o mesmo dia duas vezes? Ou pra pular um dia, sem vivê-lo?

109

Educação, Tecnologia e Mudanças (ou: A Importância de Outras Tecnologias para a Educação)

108

A ditadura lingüística do Politicamente Correto

107

Educação e Mudanças: De Reforma a Transformação Através da Inovação [Slideshow]

106

50 Anos de Carreira

106

Multa de 250 dólares por fumar no quarto

105

Trecho de Atlas Shrugged (Quem é John Galt?)

104

Aharon Sapsezian, amigo e irmão

104

Ainda sobre o trem no Brasil

104

A proposta de limitar a propriedade

103

A “externalização” do trabalho: o trabalho “invisível”

102

A moralidade

102

Uma família olhando múltiplas telas na mesma sala ao mesmo tempo…

102

Direita e esquerda

99

O memorioso e o pensoso…

99

Pittsburgh Steelers: hexacampeões nacionais de futebol (americano) [como, aqui, o glorioso SPFC (em futebol de verdade)]

99

Cinco anos deste space (e um pouco de história de vida)

98

Relativismo moral e cultural

97

Emoção e razão na arte

96

É possível justificar filosoficamente o ateísmo?

95

Hábitos de Leitura

93

O Rei do Paraíso Imaginário (ou: Indico Lulla para a ABL)

93

O Desafio da Formação do Professor na Sociedade da Informação

93

Ainda o Colégio da Embraer

92

SoArte

92

Por que caímos de quatro diante de nossos netos (Drauzio Varella)

91

Quarenta anos

90

Tecnologia, Inovação, e Transformação: A Arte de Quebrar Paradigmas

90

Calligaris, me desculpe, mas você está muito errado…

90

Da amizade e do amor (e, quem sabe, do sexo)

90

O elogio à pobreza – material e do espírito (não nessa ordem)

89

Lugares que eu conheço que são Patrimônio Cultural da UNESCO

89

Administrar o tempo é planejar a vida

87

Crônicas sobre um tempo que não volta mais

86

Síndrome de Alienação Parental

85

Está certo: Elas são o sexo forte

85

David Hume, filósofo

85

A arte – 2

85

Filmes antigos de que eu gosto…

84

A av Paulista e a região ao redor

84

Ferramentas e Brinquedos

83

A UNICAMP inova na seleção de alunos de escolas públicas

83

As pequenas coisas que esquecemos ou perdemos

83

Bênçãos

82

A Idiotice do Protecionismo (especialmente no caso dos vinhos)

82

O Tempo (de Olavo Bilac)

77

Redes Sociais e Educação: Personalização em Escala

77

O debate sobre a tecnologia e a educação continua…

77

Felicidade, individualismo, igualitarismo

76

A mudança do Live Spaces para o WordPress

76

O trem no Brasil

76

Isto É: Eles deram a virada

76

Meus três tenores atuais

76

Identidade pessoal e mudanças

75

Hotéis japoneses e a tecnologia de higienização pessoal

74

ENEM: Um vexame atrás do outro

74

Corrupção, a lei e a moralidade

73

Suicídio e eutanásia a pedido vs eutanásia não solicitada, infanticídio e aborto

73

Ivan Illich e a Troca do Paradigma

72

Justiça Social, Igualitarismo e Inveja – Parte 1

72

O Português dos Jornalistas

72

Educação e Ideologia

71

Tamanho máximo do cabelo masculino socialista

71

Didi e o Criança Esperança

71

Igualdade

71

Uma Homenagem a John Holt

70

Parabéns, dona Márcia Maria!

69

Brasil: A Primeira Potência de Semiletrados (Gustavo Iochpe na VEJA)

68

SPFC, Pentacampeão Brasileiro: Dentre os grandes, és o primeiro!

68

Homo sum: nihil humanum a me alienum puto

68

Educação, felicidade e riqueza

68

It was a very good year

68

Morando com mamãe

68

Critical Thinking Skills

67

Em Louvor da Dúvida

67

Como aplicar “o elemento” à aprendizagem escolar

66

Casoy e FHC, Datena e Dilma

65

Verdades absolutas e conhecimento relativo

65

Os múltiplos tentáculos do Estado

65

“El Secreto de sus Ojos” – Parte 1

64

Steve Jobs (1955-2011)

64

A referência bibliográfica do Calligaris sobre o aborto

63

Modelos de aprendizagem

63

Preços monitorados e administrados

62

GPS, Instrumentos de Navegação e Guias de Viagem

62

O Batismo Tricolor do Gabriel: 16/02/2008

61

A lista dos 24 vencedores do Oscar

61

Educação e Felicidade

61

Megalivrarias. shoppings, conjuntos de cinemas…

61

Computadores e Educação: Bom artigo do Gilberto Dimenstein

60

E-Books: É só uma questão de tempo; Paper Books: “Your days are numbered”…

60

84 Charing Cross Road

59

“Afinal, quem faz o quê” em casa?

58

Socialismo na escola

58

Cutucando o paradigma…

58

Livros Impressos

57

De Interpretatione – da Lei e Outros Textos (inclusive a Bíblia)

57

Sobre a arte de desaprender

57

O mercado (I)

57

O desafio de uma linguagem objetiva

56

Uma modesta contribuição à estética da aparência feminina

56

Epistemologia da fé – 2

56

Bill Cosby e a responsabilidade pessoal dos negros pobres

56

Vídeo da festa da Abril Educação em 22/03/2011– Parte 1

56

Graham Greene e sua biografia

56

Escola e Ensino não são Sinônimos de Educação

56

Remorso (de Olavo Bilac)

55

Yoaní Sánchez e a Esquerda Fascistóide Brasileira

54

Isso não é Liberalismo (Capitalismo)…

54

Infidelidade na Internet

54

Nossos nomes

54

“Inclusão Universitária”

54

Atores favoritos

53

Educação a Distância “Suficientista”

53

A esquerda e Cuba: dois pesos e duas medidas

53

A traição de Ferreira Gullar

52

Juliette Binoche e Olivier Martinez

51

“Superendividamento”

50

A Educação das Emoções e da Vontade

50

A Faculdade de Educação da UNICAMP e o Secretário da Educação

50

“Você não sabe até onde eu chegaria para te fazer feliz”

50

Censura

50

Chamando as coisas pelo nome certo: “Ação Afirmativa” é discriminação racial contra os brancos

50

Itinerários de Aprendizagem e Trajetórias Intelectuais

49

Os esquemas de corrupção

49

Que será de nossos pertences digitais quando morrermos?

49

Tecnologia: modem celular

48

Debate entre Valdemar Setzer e Eduardo Chaves na TV Cultura em 28/5/99

48

“Se não vos fizerdes como crianças…”

48

As explicações da Microsoft sobre o fim do Live Spaces

47

Joaquim José da Silva Xavier – Tiradentes

47

Taiwan: engraxates, tocos de cigarro no chão, maus espíritos e outras amenidades

46

Desemprego, informática, sorte e azar

46

Transdisciplinaridade

46

Salvos da Perfeição – 2 (ou: “No limite entre a teologia e a poesia está o ‘O Reino da Delicadeza’. . . “)

46

Educação e Tecnologia

46

Gabrielle Anwar

46

A tecnologia, a escrita, o cálculo…

46

Educar pode custar caro, mas não educar custa mais caro ainda

45

45 anos sem Jânio Quadros no cenário político nacional

45

Carlos Brito e a Inbev

45

Reflexões não tão fúnebres: relações pessoais e a Internet

44

Quarenta anos depois do CAOS: 1966-2006 (II)

44

Justiça: a verdadeira e as falsas

44

Bielo-Rússia (ou Bielorrússia)

43

Educação fiscal

43

História do Comunismo nos Estados Unidos

42

Windows 8

42

About Schmidt: Alguém vai se lembrar de nós quando morrermos?

42

O suposto neoliberalismo petista

41

Marcelinho

41

Luís Inácio Lulla da Silva vs Orlando Zapata Tamayo

41

Igualdade

40

“El Secreto de sus Ojos” – Parte 2

40

Prefácio a um livro de Renato Soffner

40

Administração do tempo – Entrevista ao site do Padre Marcelo Rossi

40

Metadiscussão da presente discussão do aborto

39

As fontes de nossos direitos

39

L’amant

39

Vídeo da festa da Abril Educação em 22/03/2011– Parte 2

39

Pouca vergonha !!! (Parte 1)

39

Macau – onde o Ocidente e o Oriente se encontram

39

A Igreja como Comunidade Virtual dos Crentes (short)

38

A questão da arte “engagée” e “partisanne”

37

EduTec.Net: Possivelmente a primeira comunidade virtual brasileira

37

O primeiro banho do Chico

37

Dudu, the Puff

37

O Exame da OAB

37

“Vitrines de Amsterdã”

36

(O Brasil) “Agora, vai!” (Será?)

36

O novo Windows Live Space

36

A chave da qualidade na área da educação

36

Décimo aniversário da criação da EduTec

36

Do meu jeito (“My way”)

35

Escolhas

35

Fotos digitais

35

O primeiro discurso de Dilma, depois de eleita

35

Justiça Social, Igualitarismo e Inveja – Parte 2

34

Primavera no sítio

34

Caso Isabela: O Circo Nardoni-Jatobá

34

Machado de Assis

34

A Violência em São Paulo

33

Cutucando ainda mais o paradigma…

33

Os Indicados do Oscar 2013 (Português)

33

10 inovações que afetarão o mundo dos negócios

33

A salvação da universidade pública (e da privada!)

33

Filantropia

32

Deve a Wal-Mart pagar mais aos seus empregados?

32

Prefácio a um livro de Arnaldo Niskier

32

A Revolução da Intermediação

32

Gestão do conhecimento: o conceito

32

Os números de 2010

32

“Há algo de podre no reino da Dinamarca”

32

Sete anos deste blog!

32

Os Dois Brasis

32

Nights in Rodanthe (2008, Noites de Tormenta)

31

A oração de Jabez

31

Uma nova Escola Lumiar

31

Arremetidas

31

O primeiro Natal de que eu (mais ou menos) me lembro

31

Educação e escola

30

Direita e esquerda – de novo

30

O “bem público” e a “política pública”

30

Dom Pedro II

29

A febre legisferante que assola o país

29

Que bom é viver frugalmente — quando isso se dá por escolha e não por necessidade…

28

James Patrick Maher, In Memoriam

28

Viuvez

28

La Bohème

28

Escolas presumidamente bem sucedidas

28

Doçura

27

Oito Anos deste Blog

27

As falácias da campanha pelo desarmamento

27

Quarenta anos depois do CAOS: 1966-2006 (III)

27

Outono

27

A Igreja como Comunidade Virtual dos Crentes

27

Jaci Maraschin, amigo por tabela

27

Políticas Públicas – Ou a violência com o revólver escondido…

26

You Needed Me

26

Eu era pobre e feliz… e não sabia

26

O Super Bowl

26

Ricos meninos pobres

26

Muros: o de Berlin e os outros…

26

Os oitenta anos do Oscar

25

A riqueza e densidade da informação no livro inibe a imaginação

25

Administrar o tempo é planejar a vida

25

New Line Learning Academy, Kent (Reino Unido)

25

Bobby Chinn Restaurant

24

Natal: famílias, tradições, transições

24

Romance interessante sobre a luta acerca do aborto nos EUA

24

Educação e direito de escolha

24

Vagabundagem e Bagunça

23

A questão das cotas

23

Oitenta anos da fundação do JMC

23

A arte – 1

22

“A proteção que atrapalha”

22

Quarenta anos depois do CAOS: 1966-2006 (I)

22

Ayn Rand, romancista e filósofa

21

Filosofia

21

Ayrton Senna da Silva

21

Educação: conceito, modelos, paradigmas – II

21

Epistemologia da fé – 1

21

Orgulho Líquido

21

A parada gay

21

Moralidade e legalidade

21

A criança e a liberdade

21

O foco da questão no dia 31/10

20

Mais um aniversário do suicídio de Getúlio Vargas

20

O Texto

20

Entrevista para o site Miniweb

20

The Oscar 2013 Nominees (English)

20

Vaia estrepitosa

20

A América Latina e a Fórmula 1

19

Bibliotecas Escolares

19

Despedida do TREMA

18

Feliz Natal e Ano Novo a Todos

18

Brincar, Aprender, Trabalhar: Enfim, Viver

18

Santa Lindu, bendito o fruto de vosso ventre, Lulla (ou: Sonho e realidade, esperança e medo)

18

A desejada morte de Fidel Castro e a proximidade da liberdade em Cuba

17

Tool and Toy: Technology in Education

17

Termina o “Innovative Education Forum” da Microsoft em Salvador, BA

16

Fusos horários

16

O amanhecer e o entardecer na roça

16

Professor da USP critica os alunos radicais

16

As demonstrações dos imigrantes ilegais nos EUA

16

“Guerra”

15

24 de Agosto

15

O ser humano

15

Thelminha

15

Anti-americanismo

15

Dalmo Dallari condena os estudantes radicais da USP

15

União Européia

15

“Sem medo do passado”

15

Ainda Windows 8

15

“El Secreto de sus Ojos” – 5

15

When I was sixty-nine, it was a very good year…

15

Continuação da Homenagem a John Holt

14

“A Morte Inventada – Alienação Parental”

14

A cleptocracia do PT

14

Seis Anos do Liberal Space

14

Em São Paulo, 26 de Fevereiro de 2013

Oito Anos deste Blog

Há exatamente oito anos, neste dia, eu estava perto de Redmond, WA, onde fica a sede da Microsoft, na companhia de minha amiga Ana Teresa Ralston, fazendo uma formação em Peer Coaching com o meu amigo Les Foltos, quando minha outra amiga, Márcia Teixeira, me chamou pelo (então) MSN Messenger para perguntar se eu havia visto o lançamento do site de blog da Microsoft, Microsoft Spaces.

Não havia. Mas fui para o endereço indicado, criei uma conta, abri meu blog e deixei o primeiro post.

Todo ano, desde 2005, comemoro o aniversário do meu blog aqui.

O título, “Liberal Space”, decorreu do fato de que o site da Microsoft se chamava Microsoft Spaces. Cada blog era, portanto, um “space” — e o meu era o “Liberal Space”.

Desde então o blog foi migrado (por decisão da Microsoft, não minha) para WordPress.com, mas mantive o título do blog e adquiri o domínio liberalspace.net, debaixo do qual o blog é publicado até hoje, oito anos depois.

Era o dia 2 de Dezembro de 2004.

Microsoft Spaces, antes de migrar para WordPress.Com, virou Windows Live Spaces. Se digitarmos http://spaces.live.com, ainda hoje, não recebemos mensagem de erro — mas somos redirecionados para o site do Hotmail, que também está tendo sua bem sucedida identidade abandonada pela Microsoft em favor de OutLook Mail.  (Vide a notícia em:
http://money.cnn.com/2012/07/31/technology/hotmail-outlook-overhaul/index.htm).

É isso. O blog começou quando eu estava entre amigos, de forma despretensiosa. Hoje, este é o artigo de número 770. Ele continua a existir em decorrência do interesse de pessoas que também não posso deixar de considerar amigos, mesmo que não os conheça pessoalmente.

Até o nono aniversário. Espero.

Em São Paulo, 2 de Dezembro de 2012.

Ainda Windows 8

Depois da postagem anterior houve uma evolução… Recebi um e-mail da Microsoft me dizendo do erro no preço que foi amplamente anunciado na imprensa: era pra ser R$ 69,98 e não R$ 84,98 – R$ 15,00 de diferença.

Por causa do erro, e para se penitenciar, a Microsoft me informou que estava creditando em meu cartão de crédito a importância total que eu havia pago, e que, portanto, a minha cópia do Windows 8 Pro ficava como presente da empresa, com um pedido de desculpas e com o desejo que eu desfrutasse plenamente o produto – algo que estou fazendo.

Coisa rara hoje em dia essa atitude. Minha admiração pela empresa e por seu fundador aumentam com um gesto desses.

Em São Paulo, 18 de Novembro de 2012.

Windows 8

Hoje instalei Windows 8 na minha (potente) máquina Dell, que estava meio abandonada. Baixei do site da Microsoft, à meia-noite de hoje, por R$ 83,98, a versão Pro. Instalei, mantendo todos os dados, configurações e software, e está funcionando perfeito.

A interface é diferente e, por isso, vou levar algum tempo até me adaptar. Mas é possível acessar uma tela parecida com o Desktop do Windows 7 e das versões anteriores.

Continuarei a dar algum feedback aqui.

Não tenho escrito aqui com tanta frequência porque adotei o Facebook como minha principal plataforma de interação com o mundo virtual.

Quem preferir interagir comigo lá, por favor acesse:

http://www.facebook.com/eduardo.chaves

(Minha conta antiga do Facebook ainda existe, mas está lotada, por isso não posso aceitar mais amigos lá. Mas há muito material interessante lá:

http://www.facebook.com/chaves

Obrigado.

Eduardo Chaves (Em 26 de Outubro de 2012)

Steve Jobs (1955-2011)

Post que publiquei no Blog das Editoras Ática e Scipione em 10 de Outubro de 2011, no URL http://blog.aticascipione.com.br/eu-amo-educar/steve-jobs.

———-

Talvez nem seja necessária uma justificativa para escrever sobre Steve Jobs, neste momento em que ele acaba de partir, num blog em que trato essencialmente de educação e tecnologia. Ainda assim, esboço uma justificativa: em seu ciclo inicial, a empresa que Jobs fundou considerou a educação o seu principal mercado – entre 1977 e 1984, por exemplo, o Apple II (principal produto da casa) provocou o surgimento de uma quantidade enorme de softwares educacionais. Ao longo de sua trajetória, a Apple fez parcerias com um grande número de Distritos Educacionais na Califórnia (onde estava sua sede) e em outros estados; implantou, ainda, descontos substantivos para professores e alunos (como, de resto, faz até hoje).

Apple Jobs Silhouette

Apple Crying

Fotos: Divulgação/Apple

Meu primeiro contato com um microcomputador remonta a estes tempos: conheci um Apple II por volta de 1979, através de um colega da Unicamp, especialista em Linguística Computacional (algo que eu nem sabia que existia). O equipamento em si me chamou a atenção, mas quando ele me demonstrou as aplicações da linguagem de programação ProLog (Programming in Language) para o aprendizado de Lógica, eu me encantei. Ali na hora tomei a decisão de comprar um equipamento daqueles quando pudesse… Até hoje, cerca de 30 anos depois, ainda guardo o meu clone brasileiro do aparelho, fabricado pela Unitron.

Depois travei contato com a linguagem de programação Logo, desenvolvida no MIT – Massachusetts Institute of Technology, por Seymour Papert, para uso na educação, em especial pelas crianças. Havia, para o Apple II, pelo menos duas implementações de Logo: a da LCSI – Logo Computer Systems International, chamada Apple Logo, de Toronto, e a da Terrapin Logo, de Cambridge (MA), que era, segundo constava, a implementação mais próxima das diretrizes de Papert.

Enfim, apenas estas breves linhas justificam minha decisão de escrever sobre Steve aqui. Mas há mais. Muito mais. Em seu discurso de paraninfo na Universidade de Stanford, em 12 de junho de 2005, Steve diz uma série de coisas importantes em que eu venho insistindo neste blog. Vou especificar algumas.

A primeira é que a escola às vezes atrapalha – e quando ajuda, frequentemente o faz sem querer. No discurso, Jobs diz que aos 17 anos foi enviado para a universidade (Reed College, uma instituição realmente cara), conforme promessa solene que seus pais adotivos fizeram à sua mãe biológica. O rapaz cursou apenas um semestre e desistiu. Ele explica:

“Depois de seis meses, eu não conseguia ver nenhum valor no que eu estava fazendo. Eu não tinha a menor ideia do que eu queria fazer com a minha vida nem de como a universidade poderia me ajudar a descobrir. E eu estava lá gastando toda a poupança que meus pais haviam feito durante sua vida inteira. Assim, decidi abandonar o curso na confiança de que as coisas de alguma forma iriam dar certo. Foi bastante assustador, na época, mas, olhando no retrovisor, aquela foi uma das melhores decisões que tomei em toda minha vida.”

Steve desistiu do curso, mas ficou durante um ano e meio rodando pelo campus universitário. Sem dinheiro, dormia em colchões no chão do quarto de seus amigos. Recolhia e devolvia garrafas para receber cinco centavos por cada uma, assim ganhando o dinheiro com o qual se alimentava (em geral, mal). No fim de semana andava mais de dez quilômetros para ir a um templo Hare Krishna para ganhar sua única refeição decente da semana.

O que fazia ele perambulando pelo campus?

“Tendo desistido da Universidade, eu não tinha a obrigação de frequentar as aulas de nenhum curso que não me interessava, e podia aparecer em aulas de cursos que pareciam interessantes. (…) Isso eu amava fazer. E muito daquilo em que tropecei enquanto seguia minha curiosidade e intuição, acabou por se tornar inestimável mais tarde em minha vida.”

Uma universidade sem dúvida é um lugar onde existem coisas interessantes. Às vezes é preciso procurar bastante, mas no final a gente geralmente acha. Steve achou. O quê? Um curso de caligrafia!

“O Reed College naquela época oferecia o que possivelmente era o melhor curso de caligrafia do país. Todos os posters existentes no campus, toda etiqueta de gaveta, tudo era maravilhosamente caligrafado à mão. Porque eu havia desistido do meu curso e não tinha de frequentar as aulas regulares, decidi fazer o curso de caligrafia para aprender a escrever de maneira assim tão linda. Aprendi sobre fontes com serifa e sem serifa, sobre a variação no espaço entre diferentes combinações de letras – tudo aquilo que torna a melhor tipografia um lugar fantástico. Era lindo, histórico, artisticamente sutil de uma forma que a ciência não tem jeito de capturar. E eu achei tudo fascinante. Mas nada daquilo parecia, nem mesmo de longe, ter qualquer utilidade para minha vida.”

O belo e o útil… A caixa de brinquedos e a caixa de ferramentas de Rubem Alves. Aqui está a diferença que Edgar Morin apontou, entre a prosa, que nos permite dizer o que precisamos ou queremos dizer, e a poesia, que nos dá l

Só muito mais tarde Steve descobriu quão útil aquele curso de caligrafia lhe foi, quando descobriu a importância do design nos produtos da Apple: o design limpo (clean), simples, atraente, lindo mesmo, em que forma e função se integram. Foi por isso que decidiu dar uma interface gráfica ao Macintosh, com tipos gráficos na tela que faziam lembrar o seu curso de caligrafia, deixando para trás, definitivamente, aquelas letras feias com espaço fixo entre elas que apareciam na tela dos outros computadores. Assim, Reed College acabou sendo útil para Steve – embora sem querer…

Agora, a explicitação da segunda grande lição que Steve nos dá no seu discurso de paraninfo. Ele já havia mencionado que, no seu único semestre como aluno regular da Universidade, “não tinha a menor ideia do que eu queria fazer com a minha vida nem de como a universidade poderia me ajudar a descobrir”, mas adiante diz: “Eu tive sorte: descobri o que eu amava fazer cedo na vida. Woz [Steve Wozniak] e eu fundamos a Apple na garagem da casa dos meus pais quando eu tinha 20 anos”.

Três anos depois de perceber que não tinha a menor ideia do que queria fazer da vida, Steve descobriu que queria projetar computadores. E projetou. O primeiro (o Apple I) e o segundo (o Apple II) não foram lá uma beleza em termos de design, mas este último se tornou um sucesso, mesmo assim. Foi ele que me atraiu (também) para a área de informática.

A lição de Steve é que o sucesso eventualmente chega para quem ama o que faz. E que quanto mais cedo a gente descobre o que é que a gente ama fazer, maiores são as chances de sucesso. Como é que Steve descobriu o que é que ele amava fazer? Ele não nos diz.

Ele reconhece que, quando desistiu da universidade, o fez por si mesmo e por consideração aos pais: estava perdendo seu tempo ali e desperdiçando o dinheiro deles. Sentiu-se perdido. No entanto, não perdeu a confiança de que “as coisas de alguma forma iriam dar certo”. Sabia que em algum momento descobriria o que queria fazer da vida. “A fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de coisas que se não veem”, já dissera São Paulo.

Foi só em retrospectiva que Steve conseguiu “unir os pontos” e enxergar com clareza como sua vida posterior se ligou com aqueles acontecimentos dos seus 17, 18 anos.

“Ninguém é capaz de conectar os pontos do passado para o futuro. Mas é possível conectá-los do presente para o passado, olhando no retrovisor. Assim, lá atrás, você tem de confiar que os pontos vão de alguma forma se conectar no futuro. Você precisa confiar em algo – seu instinto, seu destino, seu carma, seja o que for. Esta maneira de ver as coisas nunca me deixou na mão, e fez toda a diferença em minha vida.”

Steve não nos conta como descobriu o que amava fazer na vida, mas nos revela onde está a chave do segredo.

Às vezes pode parecer que as coisas não vão dar certo. Em 1985, Steve foi mandado embora da companhia que ele mesmo havia criado. Parecia que um desastre havia acontecido no caminho de seu encontro com o seu destino.

“Eu não conseguia ver, então. Mas as coisas acabaram acontecendo de tal maneira que ter sido mandado embora da Apple foi a melhor coisa que jamais podia ter acontecido comigo. O peso de ser bem sucedido foi substituído pela leveza de ser novamente um iniciante, agora menos certo acerca de tudo. Esse fato me libertou e me permitiu entrar num dos períodos mais criativos de minha vida.”

A insustentável leveza de ser capaz de começar de novo, sem o peso do passado. Mas, diz ele, não foi fácil:

“O remédio foi terrível, mas creio que o paciente precisava dele. Às vezes a vida acerta uma tijolada na cabeça da gente. Nunca perca a fé. Estou convencido de que a única coisa que me manteve em pé, disposto a continuar, foi o fato de que eu amava o que eu fazia. Você tem de encontrar o que você ama. Isso é verdade em relação ao seu trabalho, mas é verdade também em relação aos seus amores. Seu trabalho vai preencher um espaço grande de sua vida, e o único jeito de ficar satisfeito com o seu trabalho é fazendo aquilo que você considera um trabalho excelente. E o único jeito de fazer um trabalho excelente é amando o que você faz. Se você ainda não descobriu o que você ama fazer, continue procurando. Não se acomode. Como tudo o que diz respeito ao coração, você vai saber quando você encontrar aquilo que você ama fazer. E, como em qualquer relacionamento amoroso genuíno, as coisas só ficam melhores, a partir daí, com o passar do tempo. Assim sendo, continue a procurar, até que você ache. Não se acomode.”

É porque ele fazia o que amava fazer que Steve foi capaz de construir tantos produtos tão desejados por nós hoje. No entanto, em outro lugar, não no discurso de paraninfo, ele demonstra que o que o movia a fazer esses produtos não era um desejo altruísta de agradar o consumidor, nem mesmo o desejo egoísta de ganhar dinheiro: era a satisfação, talvez mais egoísta ainda, de saber que ele fez simplesmente o melhor que podia — e que podia fazer coisas da mais alta qualidade e beleza.

Eis o que disse, logo depois de lançar o Macintosh:

“Sabemos que o Mac vai vender zilhões, mas nós não o construímos para ninguém mais: nós o construímos para nós mesmos. Nós, que o construímos, seríamos o grupo que iria julgar e decidir se o Mac era fantástico ou não. Nós não iríamos sair de onde estávamos para fazer pesquisa de mercado. Nós simplesmente queríamos construir a melhor coisa que fôssemos capazes de construir.”

Em outras palavras, o Mac poderia ser um fracasso de mercado (como o Lisa, antes dele, o foi) – mas esse fato não os levaria a considerá-lo menos fantástico. Eis outra citação magnífica:

“Quando você é um carpinteiro fazendo uma linda cômoda, você não usa aglomerado na parte de trás, mesmo que aquela parte vá ficar grudada na parede e ninguém jamais a veja. Você sabe que a parte de trás da cômoda estará lá, em aglomerado. Para que você possa dormir bem à noite, a estética, a beleza, a qualidade têm de ser levadas ao extremo, em todos os aspectos”.

Termino com duas citações que me parecem ser as melhores de Steve, estas novamente retiradas do discurso de paraninfo:

“O tempo de sua vida é limitado. Por isso, não o desperdice vivendo uma vida ditada por terceiros. Não se deixe pegar na armadilha do dogma que lhe diz para viver com o resultado dos pensamentos de outrem. Não deixe que o barulho das opiniões dos outros abafe o som de sua própria voz interior. E, mais importante de tudo, tenha coragem para seguir a sua intuição, o seu coração. Eles de alguma forma já sabem o que você realmente quer se tornar. Tudo o mais é secundário.”

A segunda citação nos dá uma pista acerca do que pode ter levado Steve a encarar a vida tão a sério e a descobrir, depois de sair da Universidade, aos 17 anos, mas antes dos 20 anos, o que queria fazer de sua vida.

“Quando eu tinha 17 anos, li uma citação que dizia algo assim: ‘Se você viver cada dia como se fosse o último dia de sua vida, um dia qualquer você certamente estará certo’. Essa citação causou profundo impacto sobre mim. Desde então, nos 33 anos que decorreram de lá para cá, eu me olho no espelho toda manhã e me pergunto: ‘Se hoje fosse o último dia da minha vida, eu iria querer fazer o que estou prestes a fazer hoje?’ E sempre que a resposta foi ‘não’ por um número demasiadamente grande de dias seguidos, eu soube que precisava mudar alguma coisa”.

Que bela lição de educação. Que bela lição de vida. Estou convicto de que Steve só conseguiu nos legar essas lições porque abandonou a universidade.

Em São Paulo, 10 de Outubro de 2011, transcrito aqui em 11 de Outubro de 2011